Título: Argentina amplia acesso a mercado da Venezuela
Autor: Uchoa, Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 12/08/2009, Internancional, p. A11

A presidente argentina, Cristina Kirchner, saiu na frente na disputa pelo mercado venezuelano aberta depois de o presidente Hugo Chávez ter anunciado que quer substituir as importações da Colômbia. Junto com 70 empresários de seu país, Cristina foi ontem a Caracas para assinar acordos comerciais de US$ 1,1 bilhão com Chávez. Se os negócios derem certo, a Argentina pode praticamente duplicar suas exportações para a Venezuela.

Essa janela de oportunidade apareceu duas semanas atrás, quando Chávez anunciou que "congelaria" as importações colombianas, como retaliação ao acordo militar entre Bogotá e Washington, que permite o uso pelos americanos de bases militares na Colômbia. Para o venezuelano, isso cria uma ameaça regional.

Chávez e Cristina trocaram elogios. "Caracas se veste de gala para dar boas-vindas a essa grande patriota da grande nação sul-americana", começou Chávez. Para analistas do país, a retórica mostra que Chávez dará preferência a uma "patriota", em vez de comprar de um "entreguista", o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe.

A presidente argentina afagou o companheiro e bateu na oposição dos dois países: "Há setores minoritários com forte poder que creem ser possível dar meia-volta numa história que já está decidida a avançar no sentido de melhorar a qualidade de vida de nossos homens e mulheres". "Hoje estamos assinando acordos de US$ 1,1 bilhão. Vamos continuar essa integração", disse Cristina.

Os governos não deram detalhes sobre os acordos, mas Cristina afirmou que seu país fará para a Venezuela a "maior exportação de arroz da história".

O comércio bilateral entre Venezuela e Argentina chegou a US$ 1,24 bilhão no ano passado.

A disparidade é gritante. Os argentinos venderam US$ 1,22 bilhão em carne, leite, caminhões e equipamentos mecânicos, principalmente. A Venezuela vendeu apenas US$ 22,7 milhões aos argentinos no mesmo período.

Desde que Chávez anunciou que "congelaria" as importações da Colômbia, a fronteira entre os dois países não foi fechada, mas algumas medidas foram adotadas. A Venezuela anunciou o cancelamento da compra de 10 mil veículos fabricados na Colômbia e proibiu a petroleira estatal colombiana de participar de uma licitação para explorar petróleo venezuelano. Além disso, eliminou um programa de combustível subsidiado na fronteira e ordenou vagamente que as importações da Venezuela provenham de governos amigos.

Na segunda-feira, o ministro do Comércio da Venezuela, Eduardo Samán, disse que iria comprar 10 mil carros da Argentina, após cancelar a importação de veículos da Colômbia: "Vamos comprar da indústria automotiva da Argentina, que é de muito boa qualidade. Esses 10 mil carros, que iríamos comprar da Colômbia, que os compre [o presidente dos EUA, Barack] Obama". "A Argentina tem capacidade de substituir tudo o que a Colômbia produz, já que sua indústria está muito avançada, por sua grande experiência", disse Samán.

As autoridades argentinas se mostram quase eufóricas. "Temos oportunidades muito boas para continuar aumentando a balança comercial para que nossos povos estejam satisfeitos com a qualidade e os preços", disse a ministra da Produção da Argentina, Déborah Georgi.

Pedro Bergaglio, presidente da Protejer, grupo que representa a indústria têxtil argentina, disse que as exportações desse setor para a Venezuela poderão saltar para US$ 1 bilhão, depois que os novos acordos com Chávez entrarem em vigor. "Estamos prontos para nos mover rapidamente e aproveitar a oportunidade."

Os principais produtos da Colômbia na pauta de exportações para a Venezuela são alimentos, têxteis e máquinas. No ano passado, a Colômbia foi o segundo maior parceiro comercial do país, atrás apenas dos EUA - maiores compradores do petróleo venezuelano. O comércio bilateral chegou a US$ 7 bilhões, com ampla vantagem para os colombianos. Empresários colombianos dizem ser muito difícil que os venezuelanos substituam o grosso das compras, por causa das vantagens de logística e custos.

Para Asdrúbal Oliveros, diretor da consultoria Ecoanalítica, de Caracas, o eventual encarecimento das importações pode elevar a inflação venezuelana para perto de 30%, o que a faria ser a maior da região pelo terceiro ano consecutivo. (Com agências internacionais)