Título: Governo e oposição comemoram depoimento de Lina Vieira na CCJ
Autor: Tarso Lyra , Paulo
Fonte: Valor Econômico, 19/08/2009, Política, p. A8

A ex-secretária da Receita Federal Lina Maria Vieira confirmou ontem à Comissão de Constituição e Justiça do Senado que, de fato, declarara que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, lhe pedira para "agilizar a fiscalização do filho do senador Sarney", mas que em nenhum momento se sentira pressionada a finalizar o processo.

"Ela não me pediu para encerrar sem resultados, para mais ou para menos. Interpretei que seria para dar um andamento mais célere às investigações", disse a ex-secretária. Lina, no entanto, considerou inconcebível o pedido da ministra. "Também não entendo porque ela está negando que o encontro tenha ocorrido", afirmou.

Governo e oposição deixaram a sala da CCJ comemorando o resultado do depoimento. A oposição avaliou como uma vitória o simples fato de Lina confirmar - embora não tenha apresentado provas - a realização do encontro com Dilma e o pedido da ministra. A situação, por seu turno, contabilizou o depoimento como favorável ao governo.

Em primeiro lugar, porque a ex-secretária não teve como comprovar a realização da conversa e o pedido que teria sido feito por Dilma, embora algumas informações prestadas por ela possam corroborar sua versão - a identificação, feita na portaria, para ingressar no Palácio do Planalto, por exemplo.

A base governista mostrou disposição para enfrentar a disputa e evitar eventual convocação ou convite para Dilma ir se explicar ao Congresso. O líder do PT, Aloizio Mercadante (SP), foi o ponta de lança da estratégia mais agressiva: o senador disse que, se de fato o encontro tivesse ocorrido e o pedido de Dilma realmente tivesse sido feito, Lina, ao considerá-lo "inconcebível", deveria comunicá-lo a um superior ou fazer uma denúncia pública contra a chefe da Casa Civil. Omitindo-se, teria cometido crime de prevaricação.

Em seu depoimento, Lina disse que, ao voltar à Receita, pediu a um dos subsecretários um levantamento de todos os processos em andamento. "Descobri que tudo estava em ordem e coloquei uma pedra em cima deste assunto. Não dei mais retorno para a ministra e ela também não me cobrou mais sobre o assunto". Questionada sobre o suposto pedido de Dilma, Lina afirmou que "não havia necessidade nenhuma para ela pedir isto".

A ex-secretária não apresentou prova material de que a reunião tenha ocorrido e repetiu o argumento de que, por ter sido uma audiência privada, não foi registrada na agenda oficial da Receita Federal. Mas deu uma resposta, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que na segunda-feira, durante recepção ao presidente do México, Felipe Calderón, cobrou a apresentação da agenda apontando a data da reunião."Eu não preciso de uma agenda para falar a verdade", disse.

Lina admitiu que, antes do suposto encontro com Dilma, a Receita Federal também recebeu um pedido da Justiça para que acelerasse as investigações envolvendo as empresas de Fernando Sarney, por considerar que elas estavam muito morosas. Ela lembrou ainda que a Receita não pode trabalhar para o governo A, B ou C, no que foi considerado uma crítica a Dilma. "Os governos passam e os funcionários da Receita permanecem lá, por 30, 35 anos", afirmou.

A base aliada do governo compareceu em peso à CCJ. Às 9 horas - horário previsto para o início do depoimento - já estavam sentados na primeira fila o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), o vice-líder Gim Argelo (PTB-DF) e o líder do PMDB na Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL). Na segunda fileira, o líder do PT, Aloizio Mercadante (SP) e a líder do governo no Congresso, Ideli Salvatti (PT-SC).

Antes mesmo do início do depoimento veio a primeira manobra regimental: Jucá apresentou três requerimentos afirmando que o depoimento de Lina não poderia ser realizado na CCJ. "Se o tema for atinente à questões tributárias e econômicas, o depoimento deve ocorrer na Comissão de Assuntos Econômicos; se tiver ligação com a Fundação Sarney e seus familiares, o local é o Conselho de Ética; se for sobre a Receita Federal, o foro é a Comissão de Fiscalização e Controle", afirmou o senador.

Jucá seguiu uma linha mais amena que a de Mercadante. Afirmou que não queria "obstacular" o depoimento e pediu que seus requerimentos fossem votados. O presidente da Comissão, Demóstenes Torres (DEM-GO), negou o pedido e também rejeitou a sugestão para que o plenário avaliasse a questão.

Autor do requerimento para a convocação de Lina, o senador Antônio Carlos Magalhães Júnior (DEM-BA) acredita que a estratégia de Jucá, ao apresentar o requerimento, era impedir que a oposição convoque outras autoridades para depor na CCJ. O depoimento de Lina aconteceu após a maioria governista ter conseguido vetar a convocação dela para a CPI da Petrobras. "Nós sabemos que a manobra era para evitar que convocássemos, por exemplo, Dilma Rousseff para depor na CCJ", completou o senador baiano.

A oposição agora ameaça requerer uma acareação entre Lina e a ministra Dilma Rousseff. Segundo os senadores, a riqueza de detalhes apresentados provariam a versão de Lina de que, de fato, encontrou-se com Dilma. "Se a Receita e a Polícia Federal estiverem sendo usadas para proteger ou perseguir alguém, a democracia está sendo definitivamente enterrada", disse Tasso Jereissati (PSDB-CE). O tucano lembrou aos senadores que a ministra já teve que se explicar em outros episódios, como a compra da Varig, a elaboração de um dossiê sobre os gastos do governo FHC com cartões corporativos e as informações erradas de seu currículo publicado no site da Casa Civil.