Título: Governo federal ainda vê muita resistência ao modelo de parceria
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 18/08/2009, Brasil, p. A5

Quatro anos após regulamentar a lei que autoriza a realização de parcerias público-privadas (PPPs), o governo federal não tirou, até agora, nenhum projeto do papel. Está analisando seis propostas, mas ainda não fez nenhuma contratação por este sistema. O processo mais adiantado de análise é o da construção do centro de processamento de dados que vai prestar serviços ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal. O edital para a licitação que envolve a construção, a manutenção e a operação desse complexo no Distrito Federal, um contrato de R$ 1,012 bilhão por 15 anos, já foi publicado.

As informações são do diretor do programa de PPPs do Ministério do Planejamento, Isaac Averbuch. Na avaliação dele, esse modelo de contratação enfrenta natural resistência em todos os países. A oposição, segundo ele, é comum entre administradores públicos, mas também entre empresários. Como exemplo, cita que, no Reino Unido, o início da utilização das PPPs ocorreu nos anos 80, no governo de Margareth Thatcher, mas as licitações só deslancharam nos anos 90, na gestão do primeiro-ministro Tony Blair.

No Brasil, Averbuch reconhece que há várias razões para essa resistência. Em primeiro lugar, diz que ainda há quem pense que o Estado faz melhor do que a iniciativa privada. Além disso, há quem que não queira ver empresas particulares operando em algumas áreas "típicas de Estado" como, defesa, segurança, presídios etc.

Averbuch diz que ainda há desinformação no Brasil sobre as PPPs, o que leva algumas pessoas a afirmarem que esse tipo de contratação demora muito. "O que se gasta de tempo na preparação do processo, que realmente é muito rigoroso e detalhado, poupa-se na execução do contrato, desde a construção até a gestão", pondera.

De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU) e com a Comissão Mista de Orçamento no Congresso, há 48 obras públicas federais com recomendação de paralisação e 12 com bloqueio de parte do pagamento porque, nesses casos, há suspeita de superfaturamento. Por recomendação do Ministério do Planejamento, apesar de a lei não exigir, os contratos que envolvem PPPs têm de ser previamente aprovados pelo TCU. Quanto ao setor privado, o diretor lamenta que os empreiteiros prefiram os contratos de obra pública, porque na PPP há muito menos espaço para renegociações e revisões das condições dos contratos.

Embora as PPPs tenham sido regulamentadas por iniciativa do governo federal, os governos estaduais têm se interessado mais por essa forma de contratação. O Ministério do Planejamento tem acordos de cooperação técnica para a preparação de projetos de PPP com os Estados da Bahia, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. O município de Manaus também está sendo auxiliado.

Na Bahia, o primeiro projeto de PPP estudado é o da construção do Emissário Submarino de Salvador, que já tem contrato. Outra iniciativa é a da Plataforma Logística de Juazeiro, no sertão baiano, que está na fase de contratação de consultorias para a modelagem. No Piauí, estuda-se a PPP para a pavimentação da rodovia Transcerrados. O processo está na fase de contratação de consultorias para a modelagem. Os Estados do Rio Grande do Norte e do Ceará, segundo Averbuch, ainda não definiram seus projetos.

O Ministério do Planejamento é o coordenador do Comitê Gestor das PPPs federais. O tempo de preparação de uma parceria público-privada depende da complexidade do projeto, mas Averbuch afirma que, na média, o processo leva de um a três anos. "A dinâmica das PPPs é completamente diferente das obras públicas, porque estimula ou pressiona o empreendedor privado a concluir a obra para começar a receber do Estado."

No Reino Unido, país que é referência para esse modelo de contratação, 80% das PPPs têm suas obras entregues no prazo previsto, conta Averbuch. No caso das obras públicas, o percentual cai para 30%. Essas participações repetem-se para o cumprimento do orçamento programado. O empresário só recebe os recursos se cumprir prazos.

Averbuch também usou como exemplo a comparação entre dois hospitais no México. O primeiro deles, em Merida, foi construído por meio de contrato de obra pública, o que obrigou o Estado a administrar 117 contratos decorrentes da atividade. Apesar disso, ele tem menor capacidade de atendimento, é maior e demorou mais tempo para ser inaugurado que outro na cidade de Bajio, contratado no regime e parceria público-privada, com o Estado cuidando de apenas um contrato.

O marco legal das PPPs é a lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004, que disciplina esse tipo de concessão patrocinada pelo Estado. O diretor afirma que, antes disso, havia uma zona cinzenta entre os conceitos de obra pública (lei 8.666 de 1993) e concessão de serviço público (lei 8.987 de 1995). Nas PPPs, há convergência entre interesses público e privado. Por exemplo, a PPP serve para o projeto de construção uma rodovia que não tem retorno comercial viável para pagar o investimento. Nesse caso, o Estado pode complementar a renda dos pedágios. Outro exemplo típico de PPP é o de projetos de construção, manutenção e gestão de presídios.

A lei determinou um limite mínimo de R$ 20 milhões para a realização de contratos de PPP, valor que inviabiliza a aplicação da parceria na maioria dos municípios brasileiros. Averbuch explica que não faz sentido ter PPP em projetos autossustentáveis. Na Ferrovia Norte-Sul, chegou-se a analisar se o empreeendimento poderia ser uma PPP, mas decidiu-se pela concessão. O mesmo destino tiveram as análises técnicas das rodovias BR 116/324, BR 116/381 e BR 040. Será concedido o trecho da rodovia BR 116/381, com 1.100 quilômetros em Minas Gerais. O mesmo vai acontecer com a rodovia BR 040, em 960 quilômetros, situada entre Juiz de Fora (MG) e Brasília (DF).