Título: Queda das remessas dificulta vida no México
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Fonte: Valor Econômico, 20/08/2009, Especial, p. A16
Em todos os seus 57 anos de vida, Juan Espinosa Téllez nunca foi longe de Tarejero, uma área semi-indígena da região vulcânica central mexicana. Mas, nos últimos meses, ele sentiu a recessão americana tão de perto quanto se fora uma residente em dificuldades num subúrbio empobrecido de Los Angeles.
Em outubro do ano passado, os US$ 200 por mês, que ele tanto se acostumara a receber dos EUA, secaram de uma hora para outra. Seus dois filhos não conseguiram mais encontrar trabalho regular no setor de construção civil na Califórnia e tiveram de parar de mandar dinheiro. Desde então, Espinosa praticamente não recebeu mais um centavo.
"Aquele dinheirinho era a única coisa que me mantinha", diz o agricultor desempregado. "A única coisa que podia nos sustentar", acrescenta ele, apontando o vilarejo às suas costas.
Pelo menos durante uma geração, milhões de famílias no México sobreviveram - por vezes até prosperaram - com o dinheiro de filhos, irmãos e irmãs enviado dos EUA. Em 2007, esses fluxos, ou remessas, como são frequentemente denominados, tinham crescido para mais de US$ 26 bilhões - aproximadamente o dobro do montante gerado anualmente pelo maduro setor turístico mexicano. Hoje, porém, as remessas estão caindo mais rápido do que teria sido possível prever. Os estimados 12 milhões de mexicanos que vivem nos EUA estão passando um aperto para encontrar empregos, antes abundantes e relativamente bem pagos.
O Banco Central do México diz que as remessas caíram 18,7% em abril, em comparação com o mesmo mês do ano passado. Autoridades dizem não haver perspectivas de uma rápida reversão. "Neste estágio, parece razoável acreditar que esse será um ano fraco em termos de remessas", disse Salvador Bonilla do banco central mexicano e especialista nessa área.
Não há outro local onde os efeitos devastadores da queda nas remessas sejam tão visíveis como em Michoacán, um Estado grande e predominantemente rural a oeste da Cidade do México, que tradicionalmente foi o maior beneficiário de remessas dos EUA.
Em Comanja, uma cidade de Michoacán não distante de Tarejero, o padre Guillermo Juárez Vega diz que as contribuições durante as missas caíram cerca de 25% desde o colapso do Lehman Brothers, no segundo semestre do ano passada.
Em Tlalpujahua de Rayón, uma cidadezinha no extremo leste de Michoacán, Edgardo Arqueta diz que as vendas de medicamentos e artigos de higiene pessoal em sua farmácia despencaram. "Antes, as pessoas compravam toalhinhas umedicidas, mas agora improvisam com um pano molhado. Antes compravam antibióticos, agora usam plantas medicionais", diz ele.
Alguns problemas nas regiões central e meridional mexicanas - as mais dependentes de remessas - foram contrabalançados por uma desvalorização de 30% do peso mexicano frente ao dólar.
Menos empregos nos EUA significa também que menos pessoas têm deixado seus vilarejos, o que pressiona o mercado de trabalho local e deixa mais bocas para serem alimentadas.
Rodolfo Cruz, especialista em migração no Colégio da Fronteira Setentrional (Colef), nas proximidades de Tijuana, no México, admite serem escassos dados precisos. Ele e seus colegas estimam que a migração líquida para os EUA pode ter caído 15%, de cerca de um milhão de pessoas por ano apenas alguns anos atrás. "As pessoas ainda estão partindo, mas a queda nos números é bastante real. Quando não há trabalho nos EUA, num instante as pessoas ficam sabendo aqui no México."
Mas há poucos sinais de que os mexicano estejam retornando em massa. Em Tarejero, Eunice Guzmán, 23 anos, espera a volta de seu marido após sua permanência de quase seis anos na Flórida.
As coisas estão difíceis na agricultura, setor no qual ele trabalha. Mas ela não alimenta falsas expectativas. Como diz Cruz: "O mercado de trabalho pode estar ruim nos EUA - mas os migrantes sabem que voltar para o México é retornar para algo muito, muito pior".