Título: Unasul terá reunião sem temas vetados e presença de Uribe
Autor: Bouças, Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 25/08/2009, Brasil, p. A2

A reunião de presidentes da União das Nações da América do Sul (Unasul) deverá ter a presença do presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, e, por "sugestão" dele, discutirá, além dos convênios militares dos governos da região com potências estrangeiras, o tráfico de armas e drogas na região, confirmaram os ministros de Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e do Equador, Fander Falconí. "Temos de tratar de tudo, não há tema vetado na reunião", garantiu o ministro do Equador, que responde pela presidência rotativa da Unasul.

"Todos os aspectos ligados à segurança têm de ser trabalhados, de forma aberta e transparente pelos presidentes ", disse o equatoriano. Amorim anunciou que, durante a reunião, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convidará Uribe para uma visita ao Brasil, ainda sem data marcada. Ele pretende, ainda, conversar com a secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, e reforçar o convite ao presidente Barack Obama para que participe da reunião. "Sempre é bom conversar sobre a importância que isso tem para o relacionamento dos EUA com a América do Sul", justificou.

Amorim disse ver, porém, diferenças entre o acordo firmado pelos colombianos com os EUA, que implica manutenção de militares americanos no território do país, e outros acordos firmados na região, como o negociado entre Brasil e França. "Há uma diferença entre fazer um acordo de compra de equipamentos, até de treinamento se for o caso, e a presença militar estrangeira no seu território, ainda que o objetivo declarado seja o combate ao narcotráfico e terrorismo."

"A presença de uma força de fora da região sempre pode trazer para dentro da região problemas que não são dela", argumentou o ministro. Repetindo uma expressão usada pelo governo brasileiro, o ministro do Equador garantiu, porém, que a reunião da Unasul "não será para colocar ninguém no banco dos réus".

O Brasil tem pedido à Colômbia e aos EUA garantias de que as tropas americanas em território colombiano não vão operar fora das fronteiras do país. Amorim indicou ontem que aceita uma fórmula branda para a confirmação desse compromisso. "Se pegarmos tudo ou pelo menos grande parte que tem sido dito pelas autoridades colombianas sobre o tema, e colocarmos em uma nota diplomática, para mim é quase uma garantia", disse.

A inclusão do debate sobre combate ao narcotráfico e tráfico de armas foi condição imposta, para participar do encontro, por Uribe, que acusa os governos do Equador e da Venezuela de terem ligações com a guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Por essas acusações o Equador rompeu relações diplomáticas com o governo colombiano e a reunião da Unasul teve de ser marcada para a cidade argentina de Bariloche.

"Queremos uma decisão construtiva, que permita dar seguimento às discussões através do Conselho de Defesa, órgão da Unasul para tratar temas de segurança e cooperação nesse campo", declarou o ministro Falconí. "Temos um problema, não pode ser posto para debaixo do tapete, não há inconveniente de discutir outras questões, de nossa parte, pelo menos", disse Amorim. "É um processo, não podemos querer que seja resolvido todo de uma vez."

Os ministros discutiram assuntos bilaterais, como a cooperação em assuntos de ciência e tecnologia e educação. Falconí não conseguiu de Amorim um compromisso para retomar as análises de empréstimos do Brasil para construção de estradas em território equatoriano, destinadas a fazer do país um elo de ligação rodoviária entre o Atlântico e o Pacífico.

As análises sobre o financiamento foram paralisadas no ano passado, após o Equador ameaçar de não-pagamento um empréstimo do BNDES. A ameaça do Equador havia sido uma reação a problemas de engenharia em uma hidrelétrica local, responsabilidade da firma brasileira Odebrecht. O Brasil, na época, chegou a chamar a Brasília, para consultas, o embaixador brasileiro em Quito, um gesto de séria repreensão, na diplomacia. A regularização dos pagamentos, pelo Equador, levou o embaixador a voltar ao país, neste ano.

Amorim, ontem, afirmou não ter conhecimento de nenhum financiamento em estudo no Brasil, e comentou que a maior preocupação do Brasil, quando houve as ameaças do Equador, foi com a desmoralização do mecanismo que servia de garantia aos financiamentos, o Convênio de Crédito Recíproco (CCR), usado pelos países da Associação Latino-Americana de Desenvolvimento (Aladi).

Os dois ministros confirmaram a intenção de convidar o presidente eleito do irã, Mahmoud Ahmadinejad, mas evitaram falar qual será a reação caso o iraniano resolva trazer, na comitiva, o auxiliar indicado para o Ministério da Defesa, Ahmad Vahidi, procurado pela Interpol por envolvimento, em 1994, no atentado contra uma associação israelense, a Amia, na Argentina.