Título: Capitalização vai valer 5 bilhões de barris
Autor: Fariello , Danilo
Fonte: Valor Econômico, 01/09/2009, Brasil, p. A4

O governo federal deverá aumentar o capital da Petrobras o mais rápido possível. Segundo projeto de lei encaminhado ao Congresso ontem, onde deverá tramitar por 90 dias, o prazo para ocorrer a capitalização é de até um ano após sua aprovação, se integral. Em uma ligeira adaptação da previsão inicial de investir as próprias reservas do pré-sal na companhia, foi apresentado ontem o projeto de uma operação financeira que combina dois processos diferentes, mas que mantém a ideia original de a União investir na estatal sem reduzir caixa ou elevar dívida.

O primeiro processo necessário à capitalização é a cessão onerosa de direitos, em que a determinado valor a União venderá até 5 bilhões de barris das reservas do pré-sal à Petrobras - equivalente ao que se prevê em produção no campo de Tupi. O outro processo é a capitalização em si, com títulos emitidos pelo Tesouro em volume equivalente ou superior a esses barris.

A meta do governo é fazer esses processos no mesmo dia para que a emissão de títulos iguale a cessão de direitos e não ocorra impacto sobre a dívida pública. Se sobrarem recursos investidos pelo governo e minoritários na companhia além dos 5 bilhões de barris pagos, estes ficariam no caixa da empresa.

O valor total do aumento de capital ainda não está fechado. Como ele estaria condicionado a uma contrapartida de cessão de direitos equivalentes a barris, seria o preço dessas reservas a ditar o volume da capitalização. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) deverá contratar uma entidade certificadora independente para definir esse preço. Também a própria Petrobras ou acionistas minoritários poderão contratar certificadoras diferentes, para se certificar do indicado pelo regulador. O diretor financeiro da estatal, Almir Barbassa, disse ontem que vai contratar uma empresa especializada para esse cálculo. O valor dessas reservas pode ter uma variação muito grande. Já houve venda de reservas no mundo envolvendo preços de US$ 2 a US$ 30 cada barril. Atualmente, o preço do barril negociado se encontra na casa dos US$ 70, mas há muito desconto envolvendo os riscos até a comercialização, por isso o preço da reserva é tão menor. A US$ 10 o barril, no limite de 5 bilhões deles em reserva, o governo poderia entregar direitos de exploração à Petrobras por até US$ 50 bilhões.

Segundo o projeto de lei, o valor por barril envolvido na cessão de direitos será atualizado em até 24 meses após a primeira certificação. Se houver variação em relação ao preço inicialmente acordado entre União e Petrobras, será feita a compensação. Se o preço da reserva em segunda análise subir, a Petrobras pagará a diferença aos cofres públicos. Se cair, o governo compensará o que a Petrobras pagou a mais antes, explica a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

A precificação das reservas é tema controverso, porque para se chegar a um preço final as variáveis são muitas, como o custo para se explorar a reserva e o grau de aproveitamento do óleo, diz Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e idealizador do modelo. "Tudo isso ainda será calculado", explicou Barbassa, da Petrobras, sem dar pistas de qualquer cálculo prévio que a Petrobras tenha feito. Hoje, 90% das reservas da Petrobras no pós-sal já são certificadas.

O volume de recursos aportado pelo governo na empresa equivalerá à sua participação societária, atualmente em 32,2% do total de ações emitidas pela companhia. Os acionistas minoritários, segundo a Lei das Sociedades por Ações (S.As.) poderão acompanhar a chamada de capital, mantendo a participação na atual proporção de distribuição de ações. Mas a expectativa do governo é que nem todos os acionistas tomem essa iniciativa e, por consequência, a União aumente sua participação na companhia. "Esse aumento de participação é possível", reconhece Dilma. Mas, se os minoritários acompanharem o governo federal, certamente se tratará do maior aumento de capital já realizado no mundo, diz um executivo da Petrobras.

Segundo a ministra, mesmo os investidores menores, que investiram recursos do FGTS na empresa em 2000, por meio dos Fundos Mútuos de Privatização (FMP), poderão acompanhar o governo no aumento de capital, embora não esteja previsto que possam aplicar parte maior do fundo. Nesta ocasião, eles colocariam recursos próprios. Os cotistas com FMPs representam 2,7% do capital social da estatal.

No processo previsto para aumento de capital, os minoritários não poderão ceder, de modo formal, seus direitos de compra da nova emissão de ações a terceiros. Prevê-se que os atuais acionistas informarão, na ocasião do aumento de capital, se desejam adquirir quantia maior do que aquela a que têm direito. Dessa forma, os minoritários que abdicarem do direito de compra poderão abrir espaço para que os demais acionistas aumentem sua base de ações. "Se os minoritários não exercerem seus direitos, o aumento de participação na Petrobras será do povo brasileiro", disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no lançamento do novo marco regulatório do pré-sal ontem. O presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, participou da cerimônia em Brasília.

Como a empresa deverá ter um ativo maior com o aumento de capital, seu balanço deverá sofrer alterações, disse um executivo da Petrobras. Os direitos sobre os barris cedidos de forma onerosa à companhia poderão ser incorporados ao ativo, aumentando o patrimônio da empresa e, por consequência, elevando sua capacidade de endividamento e investimento.

Como os barris que vão servir de moeda para a capitalização ainda não foram sequer descobertos - estão nas áreas que ainda pertencem à União por onde se estendem jazidas já descobertas no regime de concessão - a União terá que concluir um processo de unitização da produção nessas áreas, ou seja, definir as condições de separação entre campos de velhas e novas descobertas, já que o petróleo de um campo pode migrar para o vizinho. Esse acordo é necessário quando se descobre que um determinado reservatório se estende por áreas concedidas a uma ou mais empresas ou consórcios. O acordo tem que ser feito entre as empresas que depois o sujeitam à aprovação da ANP.