Título: Oposição acusa governo de usar rolo compressor
Autor: Galvão , Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 01/09/2009, Brasil, p. A5

A pressa do governo com a tramitação dos projetos de lei relativos ao marco regulatório da exploração do petróleo na camada pré-sal, associada à disposição dos partidos governistas de controlar as relatorias, vão esbarrar na resistência da oposição. PSDB e DEM acusam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de pretender acionar o "rolo compressor" no Congresso, em busca de ganhos eleitorais com o assunto.

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), criticou o encaminhamento dos projetos ao Congresso com urgência constitucional. Partiu dele a sugestão, feita na véspera a Lula, em jantar com governadores, para que a urgência fosse retirada. "O governo teve 22 meses (desde o anúncio das descobertas do pré-sal) para fazer um projeto de lei. É razoável que o Congresso e a sociedade tenham tempo para discutir", disse, ao final da cerimônia.

Para Serra, 90 dias (45 em cada Casa) não é tempo "hábil ou razoável" para discutir um marco regulatório que terá implicações para as próximas décadas. "O que está se discutindo agora só terá efeito em dez, 15 anos em diante. Se a discussão for em seis meses, em vez de três, o país não perde, só ganha."

Segundo ele, o primeiro debate a ser feito é sobre a razão da mudança do modelo de exploração. "O aumento do capital da Petrobras, o aumento da participação do governo na Petrobras - medida defendida por ele - , o fundo social e passar a concessão para partilha são temas muito complexos, que devem merecer prazo maior para discussão. Isso não pode ser feito atropeladamente em três meses", disse.

Os líderes do DEM e do PSDB na Câmara, Ronaldo Caiado (GO) e José Aníbal (SP), afirmam que a oposição não vai aceitar a tramitação em urgência. Querem realizar comissão geral (reunião com representantes da sociedade realizada no plenário da Casa) e audiências públicas com especialistas. E vão disputar uma relatoria.

"Como é matéria tratada eleitoralmente, tentarão excluir a oposição das relatorias. Não vamos aceitar", disse Caiado. Segundo ele, Lula busca na discussão do pré-sal uma maneira de "encobrir as mazelas do seu governo". Para Aníbal, o presidente quer "usar o rolo compressor e transformar a discussão do pré-sal em lance político". PSDB e DEM começam a discutir hoje a estratégia de atuação na Câmara. Pretendem buscar aliados para aprofundar o debate em dissidentes da base aliada e na sociedade civil.

De acordo com Aníbal, o marco regulatório aprovado em 97 (a chamada Lei do Petróleo) deu bons resultados, permitiu duplicação da produção e elevação da participação do setor de 2% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB). "Diante de uma nova realidade (o pré-sal), o governo tinha que agir com muita austeridade e ouvir todo mundo. Essa urgência é uma piada", disse.

A questão da distribuição dos royalties não consta dos projetos enviados ao Congresso. Por sugestão feita pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, na reunião do conselho político, o assunto será tratado em outra fase, para facilitar a tramitação do pacote. "Mexer com isso agora iria contaminar o marco regulatório", disse o líder do PSB, Rodrigo Rollemberg (DF).

Com a garantia da manutenção do atual sistema de distribuição de royalties e participação especial enquanto a nova regulamentação não for aprovada, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), trocou o discurso crítico ao governo federal por elogios ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O pemedebista disse que "o Rio está muito satisfeito".

Satisfeito com a decisão do governo de não alterar o sistema de distribuição de royalties e participação especial, Cabral não reclamou nem da alteração do regime de tramitação dos quatro projetos no Congresso. "O regime de urgência nós sabíamos que a qualquer momento iria acontecer, poderia ser agora no início ou durante o processo", disse.

Segundo o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), "esse debate federativo será feito em hora oportuna" e a partir de propostas já tramitando, que tratam do assunto.

O governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), também defendeu a manutenção das atuais regras para distribuição de royalties e participação especial. "A lei como é hoje é justa", comentou.

As bancadas de Estados produtores de petróleo pressionam pelo aumento no repasse de recursos. Essa disputa envolve a base governista e há embate entre parlamentares do Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo, que recebem a maior parte dos royalties e participações especiais distribuídos pela União e os demais Estados produtores.

Eleita por Santa Catarina, Estado onde foi descoberto petróleo na camada de pré-sal, a líder do governo no Congresso , a senadora Ideli Salvatti (PT-SC), defendeu mudanças. "Não tenho a menor dúvida de que a partilha de royalties e participação especial será alterada no Congresso", afirmou ontem. "Nós consideramos muito injusto que apenas três ou quatro Estados se beneficiem. São Paulo se beneficia mais dos recursos do petróleo extraído em Santa Catarina do que nós", disse a senadora.

O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, disse que os Estados produtores de petróleo devem receber tratamento diferenciado na divisão dos recursos resultantes da produção de petróleo na camada do pré-sal. O governador afirmou que esse foi um dos resultados da reunião que ele e os governadores do Rio, Sérgio Cabral, e de São Paulo, José Serra, tiveram com o presidente Lula , no domingo à noite, em Brasília. Segundo Hartung, o tratamento diferenciado para os estados produtores está previsto na Constituição. (Colaborou Francisco Góes, de Vitória)