Título: EUA dobram orçamento para ajuda a produtor de algodão
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 01/09/2009, Brasil, p. A9
Os Estados Unidos resolveram dobrar neste ano o orçamento dos programas de assistência que beneficiam os produtores americanos de algodão, indiferentes às pressões que a Organização Mundial do Comércio (OMC) tem feito para que o país reforme sua política agrícola.
As projeções mais recentes do Departamento de Agricultura dos EUA indicam que o governo distribuirá neste ano US$ 13,5 bilhões em subsídios aos fazendeiros americanos. Os produtores de algodão ficarão com US$ 3,2 bilhões, o equivalente a um quarto do total.
As repetidas condenações sofridas pelos subsídios do algodão na OMC e as ameaças de retaliação do Brasil deixaram os Estados Unidos numa posição constrangedora, mas é improvável que as pressões sofridas pelo país resultem em mudanças significativas no curto prazo.
Quem tem a palavra final sobre esse assunto nos Estados Unidos é o Congresso, onde a bancada que defende os interesses dos fazendeiros americanos tem muita influência. No ano passado, quando a política agrícola do país foi revista pela última vez, ela manteve praticamente intactos os benefícios dos produtores de algodão.
O presidente Barack Obama aprendeu cedo que é fútil contrariar essa gente. Poucas semanas depois de sua posse em janeiro, ele sugeriu que o Congresso proibisse a concessão de subsídios aos proprietários mais ricos. A proposta foi para o cesto de lixo sem jamais ter sido discutida a sério.
O Congresso costuma se debruçar sobre o assunto a cada cinco anos e dificilmente voltará a debatê-lo antes de 2012. "Duvido que alguém concorde em reabrir essa discussão agora", disse a economista Kimberly Elliott, do Centro para o Desenvolvimento Global, um grupo de pesquisas sediado em Washington.
É improvável também que Obama tome a iniciativa de fazer qualquer coisa. Seu projeto de reforma do sistema de saúde e outras prioridades da sua agenda doméstica enfrentam enormes dificuldades no Congresso e a Casa Branca precisa da ajuda da bancada ruralista para vencê-las.
A força do grupo ficou evidente em junho, quando ele assegurou diversas vantagens ao negociar seu apoio ao programa de combate às mudanças climáticas que Obama propôs ao Congresso. O projeto incorporou novos subsídios para os fazendeiros depois que a bancada ruralista ameaçou bloquear a iniciativa.
Em nota divulgada ontem, o escritório do representante comercial da Casa Branca, Ron Kirk, evitou antecipar os próximos passos que o governo dará na disputa travada com o Brasil e limitou-se a informar que promoverá "consultas" sobre a decisão dos árbitros da OMC no governo e com o setor privado.
Outro problema é que a situação atual dos produtores de algodão americanos é bem diferente da que eles viviam quando a briga na OMC começou.
A produção de algodão dos Estados Unidos entrou em declínio há alguns anos, porque os fazendeiros americanos optaram por culturas mais lucrativas e países como a China aumentaram sua produção.
Gary Hufbauer, um especialista do Instituto Peterson para a Economia Internacional, acha que a autorização para que o Brasil quebre patentes de medicamentos e outros produtos como retaliação poderá ajudar a engrossar no futuro as fileiras dos críticos da política agrícola americana.
"Os laboratórios farmacêuticos e empresas poderosas como a Microsoft verão esse risco com grande preocupação e não vão aceitar ser sacrificadas em benefício dos produtores de algodão", disse Hufbauer. "Isso poderá levá-las a pressionar o Congresso a reformar os subsídios."
Tudo vai depender, porém, de como o Brasil usará seu poder de retaliação. A legislação brasileira impede o país de quebrar uma patente sem negociar um acordo de licenciamento com seu proprietário. E os limites estabelecidos pela decisão da Organização Mundial do Comércio restringem a capacidade que o Brasil terá de sacar essa arma.