Título: Renda em construção
Autor: Bellotto , Alessandra
Fonte: Valor Econômico, 17/08/2009, EU & Investimentos, p. D1

O segmento de fundos imobiliários está em um de seus melhores momentos. O juro baixo aguçou não só o apetite do investidor como o de grandes bancos do varejo que não costumam frequentar esse ambiente. Na lista, estão Bradesco e Caixa Econômica Federal, que voltam ao mercado depois de anos, e Citibank, que dá as caras pela primeira vez. Vale lembrar que a flexibilização recente das normas, que abriu a possibilidade de criação de fundos de fundos imobiliários e carteiras para investir em ativos de base imobiliária como certificados de recebíveis imobiliários (CRIs), também tem sua parcela de responsabilidade no reaquecimento do setor.

O desempenho dos fundos negociados em bolsa faz jus ao cenário de otimismo. Entre janeiro e julho, a rentabilidade média (calculada pela taxa interna de retorno, que considera a variação de preços das cotas e a renda distribuída), foi de 22,5%, aponta levantamento da Rio Bravo Investimentos. Entre as alternativas mais acessíveis ao investidor médio, a aplicação só perde para a bolsa - mais arriscada, com alta de 45,85% no período. "Houve um aumento da demanda por ativos reais que geram renda, principalmente com a queda de juro", diz Martim Fass, diretor da Rio Bravo. No mesmo período de 2008, o retorno total foi de 9,12%.

De olho no potencial de distribuição de renda das carteiras, os investidores acabaram sancionando valores mais altos às cotas neste ano. "Quanto menor a taxa de juros (a Selic está em 8,75% ao ano), maior a valorização, uma vez que o investidor aceita pagar mais para garantir um fluxo que tende a superar os juros dos títulos públicos", explica o diretor da Brazilian Mortgages, Rodrigo Machado. Mesmo que isso signifique rendimento menor em relação ao que vinha sendo pago. A comparação é feita com o custo de oportunidade, que é o juro básico, diz Sérgio Belleza Filho, sócio da consultoria Fundo Imobiliário.

Belleza conta que o investidor correu para fundos com grandes inquilinos, como as carteiras Almirante Barroso, Torre Almirante e BB Progressivo. A primeira, dona de imóvel alugado para a Caixa, teve ganho superior a 41% em sete meses, fora a distribuição de renda. Torre Almirante, que tem a Petrobras como inquilina, subiu cerca de 40% e o BB Progressivo mais de 37%. "O mercado tradicional de renda fixa já não sustenta mais ninguém", diz. Vale lembrar que o ganho de capital proveniente da variação das cotas - que superou os 15% neste ano - só se realiza se o investidor sair da aplicação. Daí, há retenção de 20% de imposto.

O levantamento da Rio Bravo, que incluiu as 18 carteiras mais líquidas da bolsa em operação há pelo menos um ano, mostra que o volume de renda distribuído nos primeiros sete meses cresceu 19,63% em relação ao mesmo período de 2008, de R$ 122,3 milhões para R$ 146,3 milhões. Na média, isso equivale a 6,51% do valor de mercado dos fundos registrado no início do ano. Se descontados 20% de imposto de renda (alíquota para aplicações de renda fixa de 6 a 12 meses), a variação líquida do CDI cai para 4,80%, tornando o ganho da distribuição de renda mais atrativo (135,6% do indicador) - afinal, o rendimento dos fundos imobiliários é isento de IR para pessoas físicas.

Entre janeiro e julho do ano passado, os rendimentos distribuídos pelos mesmos 18 fundos imobíliários foi de 5,42%, acima do CDI bruto de 6,34% verificado no mesmo período e equivalente a 106,86% do CDI, líquido de IR de 20%. O grande atrativo do fundo que investe em imóveis de renda, na visão de Fass, é a sua característica de preservação do capital. Embora haja variação das cotas, o fluxo de distribuição de renda é bastante previsível, dada a origem da receita com aluguéis de imóveis que são reajustados anualmente pela inflação. "Essa é uma aplicação adequada para o investidor pessoa física que busca um instrumento de previdência privada ou mesmo para as fundações."

O aquecimento da demanda no setor pode ser observado pelo aumento dos negócios no secundário, até pela falta de produtos novos, ressalta Machado, da Brazilian. No ano passado, os fundos imobiliários com cota em bolsa negociaram, em média, 12% do patrimônio. Neste ano, com base no desempenho até aqui, projeta-se uma taxa anualizada de 25%. Levantamento da Rio Bravo confirma o crescimento. O volume de transações entre janeiro e julho aumentou 14,2%, a R$ 67,1 milhões.

"No primeiro trimestre, ninguém sabia se o mundo ia acabar", lembra Fass. Segundo ele, quem tinha dinheiro ficou na expectativa de que iria conseguir comprar ativos imobiliários baratos e quem tinha o ativo não quis vendê-lo a preços baixos, porque não precisava. Isso acabou limitando o número de negócios no começo do ano. A diferença de preços entre oferta e demanda era grande, conta, graças ao ambiente de incertezas. Com a recuperação da confiança na economia e perspectivas mais claras para o setor imobiliário, os preços voltaram a se equilibrar, o que contribuiu para a retomada dos negócios.

Só que a restrição de liquidez sempre foi um problema para os fundos imobiliários. "Mas muito mais por falta de vendedor do que por escassez de demanda", diz Belleza. Ele cita o exemplo do lançamento em julho da terceira emissão de cotas do fundo imobiliário CSHG Brasil Shopping, da Credit Suisse Hedging-Griffo. "Foi a maior captação do mercado." Segundo o consultor, foram necessários 20 dias para a colocação de R$ 130 milhões em cotas, com valor unitário de R$ 1.313,40 - para entrar, o investidor tinha que comprar pelo menos cem cotas.

Com a entrada de grandes bancos, a liquidez tende a aumentar substancialmente, juntamente com a base de potenciais investidores. "Essa é uma notícia muito importante para o desenvolvimento do mercado, uma vez que abre a possibilidade para a entrada de investidores pessoas físicas de menor porte", acredita Fass, da Rio Bravo. Na visão dele, o tíquete médio de aplicação de um fundo imobiliário, que gira em torno de R$ 400 mil, pode cair para R$ 50 mil, até R$ 30 mil.

Para Belleza, um dos sinais de que o segmento de fundos imobiliários ganhou importância para os bancos é a participação que eles vêm tendo na subcomissão do setor na Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). "A subcomissão não é nova, mas ganhou novos ares com a presença de mais de 15 bancos."

O Bradesco chegou a participar da colocação do fundo Panamby, constituído em 1995, mas era uma operação voltada para fundos de pensão. Na reestreia, o banco lidera uma oferta, ainda em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), de R$ 115 milhões do fundo RB Capital Renda I. Segundo fontes do mercado, há mais operações no forno com o banco. "Há muito tempo queria ver os bancos envolvidos com fundos imobiliários, pois só assim é possível pulverizar o mercado e ampliar a liquidez", afirma Belleza.

A Caixa também marca sua volta ao mercado depois de mais de quatro anos como líder do fundo Caixa Cedae de R$ 68,5 milhões - em 2004, o banco coordenou a distribuição do Torre Almirante. Outro que dá as caras pela primeira vez é o Citi, que será o distribuidor exclusivo do Floripa Shopping, em análise na CVM. O fundo, com patrimônio de R$ 48 milhões, foi estruturado pela Brazilian Mortgages e terá o Banco Ourinvest como administrador e coordenador líder. A cota tem valor de R$ 1 mil, mas a aplicação mínima exigida é de R$ 50 mil. A carteira deverá ter uma participação de 38% do empreendimento imobiliário Florianópolis Shopping Center. O setor de fundos imobiliários reúne 73 carteiras, com patrimônio de apenas R$ 4,3 bilhões, apesar da regulamentação ser de 1994.