Título: Brasil aplica sobretaxa a calçado chinês
Autor: Bueno , Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 10/09/2009, Brasil, p. A3

O governo brasileiro adotou, ontem, medida antidumping que atinge cerca de 90% do total dos calçados importados da China. A resolução da Câmara de Comércio Exterior (Camex) é válida por até seis meses e estabelece uma cobrança provisória de US$ 12,47 por par de calçado.

A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), que em outubro de 2008 protocolou no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) o pedido de investigação de dumping nas importações de calçados da China, considerou a decisão da Camex como um "alívio" e uma "sinalização importante" ao setor. Mesmo assim, a entidade espera que no fim da investigação, previsto para dezembro, a alíquota definitiva válida pelos próximos cinco anos seja elevada para US$ 18,44 por par, conforme a sugestão apresentada pelo Departamento de Comércio Exterior (Decon) do MDIC após o exame do processo de 35 mil páginas.

A alíquota provisória de US$ 12,47 por par deverá ser recolhida pelo importador além dos 35% de Imposto de Importação já incidente sobre os produtos originários de fora do Mercosul, explicou o presidente da Abicalçados, Milton Cardoso. A China responde por 83% de todo os calçados importados pelo Brasil e a medida, que inclui tênis esportivos, sapatos masculinos, calçados femininos e infantis, botas femininas e sapatênis, terá impacto positivo imediato sobre a geração de empregos no setor, afirmou o empresário, que preside a Vulcabrás.

Apenas produtos muito específicos ficam livres da tarifa adicional, como sandálias de praia, calçados para esqui e surfe de neve, calçados esportivos preparados para receberem tachas, grampos, presilhas, inclusive os específicos para patinagem, luta, boxe e ciclismo, pantufas, entre outros.

A aplicação de sobretaxa contra a importação de calçados chineses divide a indústria nacional porque fabricantes de produtos esportivos afirmam que será inviabilizada a entrada de tênis de alta performance ou alta tecnologia. Esses itens já enfrentam a mais alta alíquota do Imposto de Importação (35%). A Associação Brasileira de Mercado Esportivo (Abramesp), representante das marcas Nike, Adidas, Puma, Asics e outras, alega que o objetivo da Abicalçados é inviabilizar a importação dos tênis de alta tecnologia. Segundo a entidade, seus associados fabricam, no Brasil, 60% dos tênis daquelas marcas. A medida antidumping atingiria, portanto, os 40% importados, cerca de 5 milhões de pares.

A Abicalçados, contudo, defende a medida. Cardoso não arriscou uma previsão sobre o tamanho do impacto da decisão da Camex sobre a entrada de calçados chineses no país, mas afirmou que o volume deverá cair "drasticamente". Ele não acredita que a medida vai provocar aumentos de preços dos produtos brasileiros porque as empresas estão com ociosidade elevada em suas linhas de montagem, em torno de 30%.

A alíquota provisória determinada pela Camex supera em 77,40% o preço médio de US$ 7,03 por par de calçado importado da China no acumulado dos primeiros sete meses do ano, conforme os dados da Abicalçados. De janeiro a julho o país comprou dos chineses 17,6 milhões de pares por US$ 123,5 milhões, com quedas de 15,9% e 3%, respectivamente, sobre o mesmo intervalo de 2008. Em todo o ano passado, porém, as importações originárias daquele país cresceram 37% em volume, para 33,6 milhões de pares, e 46,9% em valor, para US$ 218,7 milhões.

Devido à "dispersão" do setor calçadista, o Decon analisou os danos provocados pelos calçados chineses à indústria nacional em estudo elaborado pelo Instituto de Estudos e Marketing Industrial (Iemi) e apresentado pela Abicalçados. O período analisado vai de 2003 a 2007, durante o qual os volumes importados da China pularam de 3,9 milhões de pares para 24,5 milhões de pares e aumentaram a participação sobre o consumo aparente local de 0,9% para 7,2%. Ao mesmo tempo, a produção brasileira caiu 28%, para 808 milhões de pares, e o número de empregados, 25,3%. Já as vendas de calçados brasileiros e o faturamento das indústrias nacionais no mercado doméstico recuaram 28,5% e 33,7%, respectivamente.

A Camex também aprovou uma medida antidumping para pneus com base em processo de investigação aberto a pedido da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (Anip). A resolução manda cobrar US$ 0,75 por quilo na importação de pneus novos de borracha, fabricados na China, para automóveis de passageiros. Estão enquadrados nessa norma os produtos de construção radial, das séries 65 e 70, com aros 13 e 14, nas bandas 165, 175 e 185. Nesse caso, a aplicação do direito antidumping em favor dos fabricantes nacionais de pneus é definitiva, com prazo de até cinco anos.

Para os pneus, a resolução também tem exceções. Como o governo adotou, em dezembro de 2008, medidas de estímulo à produção de automóveis, decidiu suspender, por seis meses, a aplicação da alíquota de US$ 0,75/Kg na importação dos pneus de aro 13 se a operação for realizada por fabricante nacional de veículos.