Título: Desinteresse compromete eleição para Parlamento do Mercosul
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2009, Politica, p. A10

A eleição direta dos representantes brasileiros para o Parlamento do Mercosul dificilmente será feita em 2010. A tramitação no Congresso do projeto de lei que determina as regras para a escolha dos parlamentares está emperrada e a regulação não deve ser aprovada em tempo hábil para vigorar nas próximas eleições.

A escolha dos representantes estava prevista para o próximo ano, junto com as eleições nacionais. Deputados e senadores, no entanto, analisam que não há tempo suficiente para debater e votar as regras que tramitam na Câmara. Para uma alteração na Lei Eleitoral valer para 2010, ela tem de ser aprovada até 03 de outubro.

"Não é que desistimos do projeto, mas não vamos mais focar a discussão só na eleição dos representantes", disse o deputado José Paulo Tóffano (PV-SP), presidente da Representação da Brasileira no Mercosul: "Vamos discutir outros assuntos. Se não aprovarmos as regras para 2010, aprovaremos para 2012."

O projeto, de autoria do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), propõe que a eleição dos representantes para o Parlamento do Mercosul seja uma espécie de teste da reforma política, com voto em lista fechada, ordenada pelos partidos políticos. A população votaria no partido, não no candidato. A proposta prevê a eleição de 37 parlamentares, com dedicação exclusiva a esse parlamento, sediado em Montevidéu.

O parlamento tem caráter consultivo e faz recomendações ao conselho de mercado comum do bloco. "É uma instância para debater a legislação comum para os países do bloco, acordos econômicos. Todos os problemas relacionados ao Mercosul podem ser resolvidos lá. O que demoraria anos para debater em cada país seria agilizado", disse Zarattini.

Há pouco envolvimento dos partidos na discussão sobre o Parlamento do Mercosul e até mesmo o autor do projeto está pessimista com a votação do texto até o fim deste mês pela Câmara e pelo Senado. Segundo Zarattini, há obstáculos, como o desinteresse de parlamentares e divergências externas ao Congresso, no âmbito do Mercosul. "Muitos parlamentares não querem a eleição direta pela população, por preferir a indicação, como é hoje, que dá mais poder a poucos. Outro problema é a falta de acordo com o Paraguai. Isso desanimou o Congresso", disse.

Para o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), vice-presidente da Representação da Brasileira no Mercosul, a paralisação da negociação sobre as regras dessa eleição se deu por conta de outro projeto que altera a Lei Eleitoral: a minirreforma eleitoral, ainda em tramitação no Congresso. "As normas para as eleições gerais são prioridade. O interesse dos parlamentares é muito maior do que sobre o Parlamento do Mercosul", explicou. Arruda não descarta a possibilidade de aprovação do projeto de lei para 2010, mas diz que é preciso acordo entre Câmara e Senado.

Dos maiores partidos, o PSDB é o que explicita mais as divergências sobre o tema. Para o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), presidente da Comissão de Assuntos Exteriores, o Parlamento do Mercosul não é tema para ser debatido atualmente. "O Congresso ainda não está maduro para essa questão."

Atualmente, o país tem 18 representantes: nove deputados e nove senadores, que dividem a atuação no Congresso e no Parlamento do Mercosul. Argentina, Paraguai e Uruguai também têm 18 representantes cada. O acordo político negociado em 2006 pelos integrantes do Mercosul previa que em 2011 todos os países teriam seus representantes eleitos por voto direto. O Brasil elegerá 37 parlamentares em 2010. Em 2011 a Argentina elegerá 26 parlamentares e o Uruguai, 18 parlamentares em 2011. O Paraguai foi o único que já elegeu 18 representantes. Segundo o Itamaraty, foi uma decisão unilateral daquele país, pois ainda há divergências sobre o número de representantes que cada país terá.

Se o projeto de lei não for aprovado, deverá continuar o modelo atual: os partidos indicarão um parlamentar para integrar o Parlamento, sem dedicação exclusiva à função. O Itamaraty não vê problemas no caso de as regras não serem votadas a tempo de valer para 2010. O Ministério de Relações Exteriores destaca outro problema: a falta de entendimento dentro do bloco do Mercosul sobre o critério de representação no Parlamento. O Paraguai considera estar sub-representado e exigiu a criação de um Tribunal de Justiça Supranacional, para mediar controvérsias de decisões tomadas dentro do Parlamento - medida contestada pelo Brasil.

Na última reunião da cúpula do Mercosul, em julho, com a resistência do Paraguai, foi adiada a decisão sobre o critério de representatividade a ser adotado pelo Parlamento do Mercosul. Ou seja, não ficou definido se o Brasil terá mesmo 37 representantes. Segundo o Itamaraty, o Paraguai acena com a possibilidade de resolver o impasse e o bloco deve definir o número de representantes ainda este ano.