Título: Economistas veem expansão fiscal insustentável
Autor: Máximo , Luciano
Fonte: Valor Econômico, 18/09/2009, Brasil, p. A4

O governo federal agiu corretamente ao adotar vigorosa elevação de gastos públicos após o recrudescimento da crise mundial, mas exagera na expansão fiscal e com isso compromete o crescimento no médio prazo. Este foi o ponto de consenso entre os economistas Yoshiaki Nakano, da FGV-SP, e Gustavo Franco, da PUC-RJ, durante o 18º Congresso Brasileiro de Economia, realizado ontem em São Paulo. Para os economistas, é preciso uma atuação mais firme do Estado no controle do gasto público para evitar constrangimentos futuros.

"As medidas contracíclicas de hoje são insustentáveis no médio prazo. Tenho medo que se perca essa noção de excepcionalidade na política econômica atual. Medidas excepcionais são para tempos excepcionais", afirmou Franco. Nakano, por sua vez, pediu reparos para a decisão do governo de reduzir o imposto sobre produtos industrializados (IPI) que, na ponta, acarreta em elevação da dívida pública, uma vez que as despesas não diminuíram na mesma proporção que as receitas. "A dívida aumenta sob uma política fiscal já muito frouxa. Se não houver controle de gastos agora, teremos problemas no médio prazo".

Os economistas, no entanto, divergem quanto às consequências da expansão dos gastos públicos. Na análise de Gustavo Franco, que foi presidente do Banco Central (BC) entre 1997 e 1999, a trajetória ascendente do déficit fiscal forçará o BC a elevar as taxas de juros. Para ele, o BC ficará sem alternativas: a política monetária será decidida pelos rumos da política fiscal.

Segundo Nakano, no entanto, é preciso ter em mente os erros cometidos pelo BC durante a reação à crise. "O Banco Central foi lento em cortar as taxas de juros. As medidas corretas, como a redução do compulsório bancário, não surtiram o efeito desejado justamente porque os juros demoraram a cair".

Com juros elevados, câmbio apreciado e queda nas exportações pressionando a indústria, restou ao comércio varejista segurar o tranco da crise. "O varejo praticamente ignorou os efeitos negativos do rebuliço internacional".

Para o economista da FGV, a crise fez ressurgir o papel dos bancos públicos como braço de atuação do governo para reativação do crédito. Mas sua atuação deve ser mais restrita conforme as turbulências diminuírem. "A tendência mundial é de intervenção do Estado na economia, estabilizando mercados e normalizando o sistema. No médio prazo, o correto seria a privatização dos bancos públicos, embora isso seja muito difícil politicamente", afirmou Nakano.

Consultado sobre a participação dos bancos pertencentes ao governo na política contracíclica adotada, Gustavo Franco chamou a atenção para o fato de que a "agressiva" expansão de ativos que os bancos públicos fizeram durante a crise se deu sob ativos de maior risco. "No sistema bancário, risco maior significa cobrança de juros mais elevados. Se [os bancos] não cobraram taxa mais alta, tem alguma coisa errada". "O acionista minoritário do Banco do Brasil não quer ver o BB tomando risco excessivo", concluiu.

Segundo ele, uma das principais causas da crise originada nos Estados Unidos foi a garantia que o governo americano dava a instituições bancárias privadas como Fannie Mae e Freddie Mac.

Para os economistas, o momento atual é de reequilíbrio mundial. Enquanto os Estados Unidos se esforçam para conter os efeitos da crise e, ao mesmo tempo, lidam com o aumento do déficit público - decorrente dos investimentos e incentivos fiscais concedidos pelo Estado para combater a crise -, os países emergentes, especialmente os asiáticos, tendo a China à frente, terão de se conformar com um superávit corrente menor. "Há um consenso hoje de que as reservas internacionais foram cruciais para amortecer o choque promovido pela crise. Ao mesmo tempo, critica-se os Estados Unidos pelos enormes déficits públicos. É preciso reflexão aí. Não dá para achar positivo ter reservas e achar ruim os americanos terem déficit em conta corrente", analisou Franco.