Título: Fidelidade premiada
Autor: Cotias , Adriana
Fonte: Valor Econômico, 18/09/2009, EU & Investimentos, p. D1

No feriado da Independência, você usou algum programa de recompensa para pagar a sua passagem aérea ou o seguro viagem? E nas últimas férias? Não? Então você está perdendo dinheiro. Embora tal constatação possa ser um tanto incômoda, ainda dá tempo de programar as folgas de fim de ano ou, quem sabe, o seu próximo período de descanso. Gerenciar milhas aéreas e a pontuação do cartão de crédito como ativos não monetários é uma forma indireta de poupança que pode virar moeda de troca na hora de ficar, literalmente, de pernas para o ar.

Num roteiro internacional de duas semanas, por exemplo, só a passagem aérea consome em média de 50% a 60% dos gastos totais da viagem. Isso quer dizer que reservar algum tempo para estudar o regulamento dos programas de fidelidade e usá-los pode tornar o orçamento de férias substancialmente mais leve. "Muitas pessoas não se mobilizam para entender os sistemas de acumulação e os pontos acabam expirando sem nunca terem sido transferidos para a conta de milhagem de uma companhia aérea", diz Aquiles Mosca, estrategista de investimentos pessoais da Santander Asset Management e autor dos livros "Investimento sob medida" e "Finanças Comportamentais" .

Combinar os chamados "frequent flyers" das companhias aéreas com cartões de crédito que bonificam as despesas da fatura é a forma mais rápida de somar pontos que poderão ser revertidos em passagens aéreas, sugere Boanerges Ramos Freire, sócio da consultoria em varejo financeiro Boanerges & Cia.

Nas despesas com cartões, ele calcula ser necessário acumular ao longo do tempo cerca de R$ 24 mil para ter direito a uma passagem de R$ 1 mil. Na ponta do lápis, isso vai representar um bônus de 4,2%. "Na hora de negociar com qualquer lojista, se não tem desconto para o pagamento à vista, o ideal é concentrar tudo num cartão de crédito que permita ter um retorno na forma de passagem e que pode ter um valor muito maior, que é o da realização de um sonho."

Considerando essas contas do consultor, com gastos mensais de R$ 2 mil no cartão, ao longo de um ano já é possível ser elegível à bonificação. Para otimizar o acúmulo de pontos, Aquiles Mosca sugere que o consumidor, em vez de pagar suas compras com cheque, dinheiro ou cartão de débito, concentre tudo no cartão de crédito, deixando intacto o saldo da conta corrente. No vencimento, é só pagar integralmente os gastos acumulados. É bom lembrar que faturas de cartões de crédito quitadas fora do prazo não pontuam. Esse pequeno planejamento pode se converter em passagens aéreas até para os orçamentos mais apertados.

Foi-se o tempo em que o cartão de crédito era considerado no Brasil um instrumento de desorganização financeira, diz Marcos Almeida, superintendente-executivo de Cartões do HSBC Brasil. "Além de ser a maneira mais natural de inserção no consumo global, o cartão é um importante aliado em viagens", afirma. O círculo virtuoso, acrescenta o executivo, é que os gastos do período de férias, que costumam ser mais pesados do que aqueles da rotina, já somam pontos para o próximo recesso. E sem incidência de juros no pagamento integral da fatura. Nessa história, só não vale cair na armadilha do crédito rotativo.

Não dá para esquecer também que há risco cambial quando se gasta em moeda estrangeira. "Sempre há a chance de o dólar disparar e pegar o câmbio defasado contra você", alerta Hugo Azevedo, sócio da HD educação e autor dos livros "500 perguntas básicas" e "500 perguntas avançadas sobre finanças." Os mais prudentes podem contar com cartões pré-pagos, como o Visa Travel Money, abastecido em dólar ou euros e usado para débitos ou saques nas moedas correntes.

Nos cartões de crédito vendidos ao varejo, em geral, cada US$ 1,00 gasto se transforma em 1 ponto. E 20 mil pontos, quando transferidos para as companhias aéreas, valem uma passagem de ida e volta dentro da América do Sul. Com metade disso, é possível voar apenas um trecho. Nos planos oferecidos aos clientes de alta renda, cada dólar pode virar 1,3 ponto, 1,5 ponto, ou até 2 pontos, caso do Visa Infinite ou do Mastercard Black do Bradesco.

Nesses dois casos, os pontos acumulados têm validade de três anos, enquanto nos produtos massificados eles costumam expirar em um ano ou dois. Nos programas de fidelidade da American Express, que trocam milhas em dez companhias aéreas, os pontos nunca expiram, mas há anuidade de R$ 60 a R$ 90 para fazer parte do Membership Rewards e uma taxa entre R$ 18 e R$ 36 para fazer a transferência dos pontos.

"É preciso ter a visão da gestão de acúmulo de ativo no tempo, como se fosse uma conta corrente, um ativo não monetário que vai se traduzir em vantagem financeira mais à frente", diz o responsável pela área de Produtos de cartões do Bradesco, Márcio Parizzotto. Neste mês, os programas de fidelidade da instituição, que envolvem as bandeiras Visa e Mastercard, estão sendo repaginados e passarão a prever a troca de pontos para a compra de pacotes turísticos completos no portal da Bradesco Cartões, sem a necessidade de transferência para uma companhia aérea.

Concentrar os gastos no cartão que tem milhagem, sem quebrar muito em diferentes unidades, é a forma mais fácil de administrar os programas de recompensa e não desperdiçar pontos, diz Simone Katz, a executiva responsável pelos cartões Premium do Citi, ligados ao American Airlines Advantage, além das bandeiras Credicard e Diners. Ela sugere que o participante fique atento às promoções e à sazonalidade. "Há épocas do ano que, em vez de 40 mil pontos, são necessários 30 mil para voar para os Estados Unidos", revela a executiva.