Título: Cartão exige investimento elevado
Autor: Júnior , Altamiro Silva
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2009, Finanças, p. C1

Aumentar a concorrência no credenciamento de estabelecimentos comerciais, como quer o governo, vai custar caro. Criar uma nova empresa credenciadora, capaz de competir com VisaNet e Redecard, que dominam esse mercado, vai exigir investimentos da ordem de US$ 100 milhões. A estimativa é do consultor da Partner Álvaro Musa, que conhece bem esse mercado. Trabalhou muitos anos na Credicard e foi um dos criadores dos famosos 40 dias sem juros para pagar no cartão.

Musa estima esse valor por conta dos altos investimentos iniciais em tecnologia, equipamentos de segurança e infraestrutura, sem contar a necessidade de ter uma rede nacional. Só faria sentido esse tipo de investimento se essa empresa conseguisse ao menos 20% do mercado, estima o consultor.

A bandeira argentina Cabal, emitida no Brasil pelo Bancoob, tentou criar uma rede própria, mas, por conta dos altos custos, desistiu. Chegou a ter 30 mil pontos cadastrados. Marcos Vinícius Viana Borges, superintendente geral da Cabal Brasil, diz que não faria sentido econômico para a bandeira criar essa rede, por conta dos altos investimentos. Por isso, a empresa resolveu fazer um acordo para usar os terminais da Redecard, presentes em mais de 1,2 milhão de lojas.

Mesmo com os altos custos, Musa acha que há espaço para um terceiro competidor grande, capaz de competir com a VisaNet e a Redecard. A razão é que o mercado de cartões tem potencial grande de crescimento e passa por mudanças. Os próximos dias prometem ser decisivos para as empresas do setor.

Nesta semana, na quarta-feira, deve sair a decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre o fim da exclusividade no relacionamento entre VisaNet e a bandeira Visa para credenciar estabelecimentos comerciais. Na final do mês, sai a conclusão do Banco Central e outros órgãos do governo sobre o que pode ser feito para dar mais eficiência e aumentar a concorrência nesse mercado.

Um dos desejos do governo é reduzir as atividades das empresas credenciadoras. Hoje elas fazem praticamente tudo, desde o credenciamento até a liquidação financeira da transação. Musa acha factível tirar ao menos essa última operação das credenciadoras. Elas cuidam de quantidade enorme de recursos sem ser banco, ou seja, não estão reguladas pelo Banco Central. Este ano, o setor de cartões deve movimentar R$ 350 bilhões.

Os gastos com cartões representam hoje 25% do Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB). Há 15 anos, eram apenas 3%. Musa acha que em mais dez ou 15 anos, esse percentual sobe para 60%, nível semelhante a países desenvolvidos como a França.

O consultor prevê um mercado diferente e mais competitivo. Além do fim da exclusividade no relacionamento das credenciadoras com as bandeiras, o consultor diz que as próprias credenciadoras estão mudando. Antes propriedade exclusiva dos bancos, elas abriram o capital e agora estão na mira de analistas e investidores. Quem comprou as ações das duas empresas, diz Musa, vai cobrar resultados e competição maior. Por isso, ele vê um aumento "feroz" na competição entre as duas companhias. O fato de Gilberto Mifano, que trabalhou por muitos anos na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), ter ido para o conselho da VisaNet também sinaliza que pode haver mudanças na empresa.

Já um um novo adquirente poderia se aproveitar de nichos de mercado para crescer. Se dedicar, por exemplo, a uma determinada região do país, ou buscar estabelecimentos de algum setor específico, avalia Musa.

Operadoras de telefonia podem entrar nesse mercado, diz Musa. Além do celular estar virando meio de pagamento, as telefônicas já têm a tecnologia para a captura de transações e transmissão de dados. Não é à toa que houve uma troca de executivos entre empresas de celular e o setor de cartões nos últimos anos. O presidente da Vivo, Roberto Lima, veio da Credicard. O presidente da Redecard, Roberto Medeiros, veio da Telefónica.

O que pode atrapalhar o desenvolvimento do setor é uma regulamentação pesada. O consultor acredita que isso pode afugentar investimentos, principalmente de estrangeiras, e frear o desenvolvimento do mercado. Ele prevê o país com 1 bilhão de plásticos em 2025, que vão fazer 30 bilhões de transações anuais e movimentar R$ 1,8 trilhão.