Título: Brasil deve crescer menos no pós-crise
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2009, Especial, p. A16

O crescimento econômico do Brasil, a partir da retomada do segundo trimestre, será menor que o padrão anterior à crise global, que hoje completa um ano. Com forte capacidade ociosa e um Produto Interno Bruto (PIB) potencial agora estimado em 5%, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, será um crescimento não inflacionário e, portanto, não demandará medidas de aperto monetário.

O nível de atividade prosseguirá abaixo do que vinha demonstrando no pré-crise - O PIB chegou a crescer 6,8% em setembro de 2008 considerando o resultado do terceiro trimestre (alta de 1,7% sobre o segundo) anualizado. Isso porque, entre outras razões, o comércio internacional ainda está deprimido (25% da produção industrial do país é destinada às exportações) e a demanda do varejo, que antes da crise crescia mais de 14%, agora cresce na casa dos 5,8%.

No cronograma da recuperação, os investimentos serão os últimos a voltar. Mantega informou que prepara um programa para o fim deste ano "de redução dos custos financeiros, tributários e de infraestrutura". Sem querer detalhar o que pretende fazer, ele disse que "será mais do mesmo", aprofundando medidas de desoneração de impostos para investimentos. Citou como exemplo a possibilidade de ampliar o regime de depreciações aceleradas de capitais e a desoneração da folha de salário das empresas. Sobre esta última, deixou claro que não há, por enquanto, qualquer decisão.

O espaço fiscal para grandes voos na área tributaria é, hoje, pequeno e o ministro vê 2010 como um ano de restrições de gastos e renúncias fiscais. Até porque a recuperação da economia será mais branda e não há a pretensão de se repetir, a partir do próximo ano, o vigor arrecadatório que houve em 2008. O ano passado foi atípico, concorda Mantega, porque foi precedido de uma leva importante de emissões primárias de ações (IPOs), os lucros das empresas foram exuberantes e a receita cresceu 20% entre 2007 e 2008. Agora, ele acha que a taxa de crescimento da arrecadação será bem mais modesta. Mas nada disso tira o entusiasmo do ministro.

"A equação para 2010 está perfeita", disse ele ao Valor. "O PIB deve crescer 5% em 2010 e a inflação não passará do centro da meta (de 4,5%)". O déficit nominal das contas consolidadas do setor público encerrará 2009 em 2,3% do PIB. "O menor déficit do grupo de países do G-20", assinalou Mantega. A partir de 2010, ele reassume trajetória de queda, devendo chegar a 2011 a um patamar quase residual, de 0,20% do PIB. A dívida líquida como proporção do produto subirá de 38,8% em 2008 para 42,5% este ano. Já em 2010, o governo estima que a dívida cairá para 36,5% do PIB, consolidando-se como um bom indicador de solvência do país.

O custo fiscal da reação brasileira à crise, segundo cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI), correspondeu a 1,2% do PIB - cerca de R$ 36 bilhões entre desonerações de impostos e aumento de gastos públicos. Na conta do Ministério da Fazenda pode ter sido um pouco maior, cerca de 1,5% ou R$ 45 bilhões. O certo, comentou o ministro, é que apesar de o mundo ter presenciado a crise mais poderosa desde 1929, "nossa recuperação foi mais eficaz e mais rápida". Enquanto no mundo desenvolvido a recuperação se dará no formato de um U, demorando de 2 a 3 anos para voltar à normalidade, no Brasil assume a forma de um V".

Numa série de gráficos e tabelas que ele mostrará hoje na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico, no balanço de um ano da eclosão da crise financeira mundial, Mantega tomou as crises que o Brasil passou desde os anos 70 - que não foram da mesma dimensão desta - para mostrar que nos anos passados o país demorava cerca de três anos para sair do fundo do poço e ainda saia com fortes desequilíbrios, sobretudo inflacionários. Desta vez, por ter adquirido "musculatura" originada por três anos seguidos de crescimento com aumento dos investimentos e, não menos importante, ter fortalecido as contas externas com reservas cambiais superiores a US$ 200 bilhões, "a crise, para nós, termina sem desequilíbrios".

Há problemas e a taxa de câmbio valorizada é um deles, mas isso ele disse que deve ser enfrentado com a redução dos custos de produção, como as propostas que ele pretende deixar prontas no fim do ano para serem implementadas em 2010 - e não com medidas artificiais. Para a redução do custo financeiro, Mantega receita aumento da concorrência entre os bancos. Segundo ele, a política de indução dos bancos públicos a serem pró-ativos no auge da crise foi bem-sucedida. Entre setembro e junho, os bancos estatais aumentaram o crédito em 25,2%, os bancos privados nacionais em 3,9% e os estrangeiros, em 2,6%.

Não fossem as ações do governo, ao invés do PIB crescer 1% este ano, como ele espera, iria cair 1,5%. Testada, a política macroeconômica - baseada no tripé cambio flutuante, superávit fiscal e meta de inflação - se mostrou "vitoriosa" e, para o ministro, qualquer que seja o sucessor de Lula na Presidência da República, deverá mantê-la.