Título: Opção pelo lilás
Autor: Iunes, Ivan
Fonte: Correio Braziliense, 14/06/2010, Política, p. 2

Na oficialização da candidatura de Dilma à Presidência, PT ¿desbota¿ o vermelho das bandeiras e direciona o discurso para o público feminino, ainda resistente ao nome da ex-ministra de Lula

Flávia Foreque e Vinícius Sassine

Com olhos e discursos postados sobre o público feminino, o PT confirmou a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República, no fechamento da convenção nacional do partido, ontem. O evento indicou o que deve ser a tônica da campanha para renovar a estadia no Palácio do Planalto por mais quatro anos. Para tentar avançar sobre o eleitorado feminino, que, segundo as estatísticas, pende para o lado de José Serra (PSDB), o marketing petista investiu em aproximar a candidata à imagem de personalidades que marcaram época, como Anita Garibaldi e Patrícia Galvão, a Pagú. Os discursos proferidos por Dilma e Lula também se concentraram nas mulheres. Maria da Penha, símbolo do combate à violência doméstica, foi a única pessoa de fora do meio político a participar da mesa principal. A convenção reuniu cerca de 2,5 mil pessoas e custou R$ 550 mil aos cofres do partido.

O apetite petista sobre o público feminino provocou até uma mudança sutil na identidade da legenda. Comandada pelo marqueteiro João Santana, a estratégia vem inserindo, aos poucos, a cor lilás em bandeiras, antes norteada pelo vermelho tradicional. As imagens da convenção, gravadas para serem exibidas em propaganda partidárias, incluíram até a presença de diversas meninas, vestidas com réplicas da faixa presidencial. O avanço petista sobre o público feminino é pautado sobre as últimas pesquisas de intenção de voto. Segundo levantamento do instituto Vox Populi, realizado há um mês, a petista está bem colocada no voto masculino, com 41%, mas patina entre as mulheres, grupo em que 33% declararam apoio à candidata.

Por isso, até o discurso proferido por Dilma foi permeado por símbolos femininos. ¿Sei que esta festa não é para homenagear uma candidata. Aqui se celebra, em primeiro lugar, a mulher brasileira!¿, anunciou. Ao citar exemplos dos progressos na distribuição de renda durante a gestão de Lula, em comparação com governos anteriores, a candidata recorreu a linguagens próximas do imaginário feminino. ¿Sempre diziam que tinha de melhorar a casa primeiro para depois melhorar a situação. Falavam, falavam e nunca melhoravam. É impossível arrumar a casa deixando dois terços dos filhos à margem, ao relento¿, apontou. O discurso ficou quatro dias em gestação e teve pinceladas de assessores diretos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como Franklin Martins e Marco Aurélio Garcia, além dos coordenadores de campanha, Antônio Palocci e Fernando Pimentel, e de João Santana.

Garibaldi O diálogo feminino foi reforçado na decoração. Banners colocavam Dilma ao lado de várias mulheres famosas. A lista tinha Mãe Aninha, Pagú, Iara Iavelberg, Princesa Isabel, Chiquinha Gonzaga, Maria Auxiliadora Lara Barcelos, Nísia Floresta, Ana Neri, Anita Garibaldi e Luíza Mahin. Versos do jingle de campanha, repetido à exaustão, também levavam o debate de campanha para o campo do gênero: ¿É a mulher e sua força verdadeira. Eu tô com Dilma, uma grande brasileira¿.

Escoltada por aliados, como o vice de chapa, Michel Temer (PMDB); o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP); o presidente do PT, José Eduardo Dutra; e Lula, Dilma listou em discurso de quase uma hora os principais pontos do programa de governo. A candidata passou por temas como saúde, educação, infraestrutura, democracia, planejamento urbano, segurança pública e inovação tecnológica. Voltou a defender a necessidade das reformas política e tributária, sempre com linguagem panfletária. ¿Lula mudou o Brasil e o Brasil quer seguir mudando. A continuidade é a continuidade da mudança. É seguir mudando, para melhor, o emprego, a saúde, a segurança, a educação¿, discursou.

Durante a semana, a petista inicia um périplo pelo continente europeu. Dilma vai passar por França, Portugal, Espanha e Bélgica e volta ao Brasil apenas no domingo. Na semana que vem, a agenda de campanha terá dois eixos: vai às tradicionais festas de São João no Nordeste e focará visitas no Sudeste e Sul, regiões em que os índices de intenção de voto ainda não favorecem a campanha governista.

Lula mudou o Brasil e o Brasil quer seguir mudando. A continuidade é a continuidade da mudança¿ Dilma Rousseff, candidata do PT à Presidência da República

O número R$ 550 mil Custo da convenção para os cofres do partido

Fim de um preconceito

As mulheres que integram as fileiras do PT chegaram à convenção do partido, ontem, prontas para captar votos para a primeira candidata da sigla à Presidência. Nos dois dias antecedentes à oficialização da candidatura, 300 delas participaram de uma plenária, em Brasília, que discutiu as melhores estratégias para derrubar a resistência do eleitorado feminino. Treze pontos genéricos foram discutidos na plenária, entre eles ampliar a participação das mulheres nos espaços de poder e decisão.

¿Em cada estado, devemos mobilizar as mulheres dentro e fora do partido. O objetivo é fortalecer o nome de Dilma¿, afirma Socorro Pimentel, 55 anos, que veio da Paraíba para participar da plenária de mulheres e para reforçar o time feminino na convenção nacional do PT.

Filiada ao PT do Pará, Adelaide Brasileiro, 61, reclamava do machismo dentro do partido. ¿Muitas mulheres se candidatam apenas para cumprir a cota de 30% instituída no partido. Essas mulheres acabam fazendo campanha para os companheiros homens.¿ A militante acredita que a candidatura de Dilma vai quebrar resistências na legenda. ¿Ela vai inverter essa lógica.¿

O deputado Ricardo Berzoini, presidente do PT até fevereiro, reconhece que a candidatura de Dilma estava pouco cotada até há bem pouco tempo. ¿Muita gente não acreditava que Dilma seria uma boa candidata.¿ Agora, segundo ele, a candidatura ganhou corpo em razão da mobilização da militância e da aliança formada com PMDB, PDT, PR, PSB e PCdoB. (VS)