Título: Aplicação de fundações no exterior será de 10%
Autor: Durão , Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 23/09/2009, Finanças, p. C3

O Conselho Monetário Nacional (CMN) deve apreciar amanhã mudanças na legislação dos investimentos dos fundos de pensão. A expectativa dos gestores é ter limites máximos flexibilizados, conforme as sugestões de mudanças na resolução 3.456, propostas pela Secretaria de Previdência Complementar (SPC) do Ministério de Previdência e encaminhadas há três meses para apreciação do Ministério da Fazenda. A principal novidade do pacote deve ser a ampliação de 3% para 10% para as fundações investirem por meio de fundos multimercados no exterior.

Segundo os bancos, seria uma forma de o governo estimular a saída de recursos do Brasil, em um momento no qual o fluxo externo de dólares ao país cresce. A queda nos juros básicos Selic também deve estimular a migração dos investimentos desses fundos para aplicações mais rentáveis, esperam os bancos, e impulsionar o movimento.

A expectativa da medida já causou um "frisson" no mercado financeiro. Com um patrimônio beirando os R$ 500 bilhões, as fundações têm um potencial de aplicar lá fora até R$ 50 bilhões. Presidente de banco de investimento considera que o foco principal dos investimentos desses fundos no exterior, em um primeiro momento, serão mesmo as ações de empresas brasileiras ou estrangeiras maiores e de maior liquidez. O mercado de renda fixa é pouco atrativo, dados os juros maiores no mercado interno brasileiro e perspectiva de apreciação cambial. Investimentos em infraestrutura, de private equity ou mercado imobiliário são considerados pouco prováveis, pois exigem análise mais detalhada.

Instituições financeiras como o Credit Suisse já começam a se mobilizar para convencer executivos dos fundos a serem seus clientes. O CS, segundo informações do mercado, já estaria convidando diretores destas entidades para participar de um seminário em Nova York no início de outubro. A Eletros, que reúne os empregados da Eletrobrás, confirmou ao Valor o recebimento do convite.

Antonio Cruz, diretor da Associação Brasileira das entidades fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), disse que o CS "não está saindo na frente". Segundo Cruz, movimento semelhante de bancos atrás de mandados de fundações ocorreu há três anos, quando foi instituído o limite de 3% para as aplicações indiretas desses gestores no mercado internacional. Na ocasião, o Société Générale e outras instituições financeiras também se mexeram para assessorar os fundos. Até então eles só podiam aplicar recursos no mercado doméstico.

O InfraPrevi, fundação dos funcionários da Infraero, foi procurado há duas semanas pelo Société Générale que lhe ofereceu um fundo de investimento com aplicação de 70% no Brasil e 30% no exterior, mas não disse ainda qual seria a carteira. O banco francês está pesquisando com as fundações seus interesses em aplicações para formatar a carteira do fundo.

Ao contrário dos bancos, os gestores de fundações ouvidos pelo Valor consideram a iniciativa da SPC positiva, mas não demonstraram muita empolgação em colocar dinheiro de seus beneficiários nas praças globais. Eles estão focando mais a possibilidade de aumentar o percentual de aplicações em renda variável de 50% para 60% e de imóveis, de 8% para 12%.

Wagner Pinheiro, presidente do segundo maior fundo de pensão do país, dos empregados da Petrobras, diz que é a favor de que os fundos possam aplicar seus recursos onde desejarem, principalmente em investimentos de maior liquidez. No entanto, Pinheiro afirma não ter interesse em colocar os recursos da Fundação Petros no exterior. "O Brasil tem uma carência muito grande de investimentos, principalmente em infraestrutura, e está repleto de oportunidades", afirma o presidente da Petros. Para Pinheiro, a Copa do Mundo, as Participações Público Privadas e as concessões devem trazer boa rentabilidade para quem quer investir. "Não há necessidade de deslocar, neste momento, recursos para o exterior", declarou.

A Previ - Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, maior fundo de pensão do país, com um patrimônio de R$ 127 bilhões, não tem nenhum investimento no exterior. A atual política de investimento da Previ não permite que ela invista no exterior. A política de investimento da entidade é revista e definida anualmente pelo Conselho Deliberativo, instância máxima da entidade. Segundo o Valor apurou, a fundação pretende aguardar a definição das novas normas de investimento pelo CMN para avaliá-las e colocar a questão dos investimentos externos em discussão no processo de definição de seu plano de investimento para 2010, a acontecer no final de 2009. O maior investimento da Previ atualmente é em renda variável, que responde por 60% de todas as suas aplicações.

Eustáquio Lott, presidente da Valia, a terceira maior entidade de previdência fechada, que reúne os funcionários da poderosa Vale do Rio Doce, tem uma postura mais flexível em relação aos investimentos externos. Apesar da Valia não ter nenhuma aplicação lá fora, Lott vê com interesse o assunto. "No ambiente atual do país de redução da Selic, com o juro real batendo na faixa de 5%, é saudável buscar rentabilidade em outros meios para diversificar o risco. Mas precisamos analisar melhor a questão", diz Lott. Hoje, segundo informou, a renda fixa em títulos do Tesouro, que sofreram um processo recente de alongamento, ainda é a maior aplicação na carteira dos fundos, que podem aplicar até 100% de seu dinheiro nestes títulos. "Acredito que vamos viver um processo de migração da renda fixa para outros investimentos alternativos, que ocorrerá ao longo do tempo", previu. No caso da Valia, por exemplo, está havendo uma corrida por aplicações em imóveis e fundos de infraestrutura.

Outros fundos, como a Fundação Real Grandeza, dos empregados de Furnas, veem com bons olhos a possibilidade de as fundações aplicarem em países que criem oportunidades. "Nós vimos uma janela no Brasil e aproveitamos, no momento em que o Brasil alongou a dívida. Se isto acontecer lá fora, porque não aproveitar?", questiona Sérgio Wilson, presidente da Real Grandeza. A fundação não tem nenhuma aplicação externa. A Eletros admite que até agora não investiu no exterior porque considera o percentual de 3% aplicado através de fundo multimercado insignificante. Se ampliar para 10% pode examinar esta nova opção de aplicação de recursos, num ambiente de juro mais baixo no Brasil.

Os fundos também não escondem uma certa desconfiança com o mercado internacional. Carlos Frederico Duque, diretor superintendente da Infraprev, diz que, lá fora, o controle não é tão exigente como no Brasil. Não há uma câmara de compensação independente, são os próprios bancos que fazem as compensações. Com isso, o risco é muito maior. "É necessário muita cautela e muito estudo para se aventurar no mercado internacional", alertou o gestor.

(Colaborou Cristiane Perini Lucchesi, de São Paulo)