Título: De volta a Honduras, Zelaya se refugia na Embaixada do Brasil
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2009, Interrnacional, p. A13
O presidente de Honduras, Manuel Zelaya, deposto por militares em junho, voltou ontem ao país e se refugiou na Embaixada do Brasil na capital, Tegucigalpa. O governo não dá sinais de que aceita o retorno e decretou toque de recolher entre as 16 horas de ontem e as 6 horas de hoje, após manifestantes saíram às ruas em apoio a Zelaya. Não está claro quais serão os próximos passos do presidente, mas sua volta após quase três meses de exílio eleva a tensão no país.
Organizações que reúnem simpatizantes de Zelaya anunciaram que estão organizando uma marcha do norte do país até Tegucigalpa, onde pretendem chegar entre hoje e amanhã.
O Brasil assumiu um papel central na crise de Honduras ao dar abrigo a Zelaya, horas depois de ele ter voltado ao país. A decisão abre uma nova etapa na crise hondurenha. A presença de Zelaya na capital tende a ampliar as pressões que o governo do presidente interino Roberto Micheletti tem recebido da comunidade internacional para negociar uma saída para a crise e devolver o cargo a Zelaya.
O governo interino disse que o Brasil viola o direito internacional ao permitir que Zelaya faça "chamados à insurreição" a partir da embaixada. Micheletti pediu que o Brasil entregue Zelaya, o que o governo brasileiro deve recusar.
Em entrevista em Nova York, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que a volta de Zelaya ao país "facilitará o diálogo" com o governo interino. Mas ele não quis especular sobre o papel que o Brasil exercerá agora, limitando-se a dizer que não deseja se "interpor a nenhuma outra ação" em andamento.
O Brasil e os outros países da América Latina não reconhecem o atual governo de Honduras e defendem a restauração de Zelaya ao poder desde o início da crise, deflagrada por um golpe de Estado após tentativas do presidente deposto de mudar a Constituição e instituir a reeleição. Essa intenção do presidente foi duramente criticada por parte do Congresso, pela Suprema Corte e até por alguns colegas de partido, que diziam que o objetivo de Zelaya era tentar se manter no cargo, a exemplo do que fez o venezuelano Hugo Chávez, seu aliado. Foi essa a alegação para o golpe de 28 de junho.
Amorim disse que o governo brasileiro foi surpreendido pela decisão de Zelaya de voltar a Honduras. Segundo seu relato, representantes do presidente deposto teriam feito contato com a embaixada brasileira cerca de uma hora antes de sua chegada, pouco depois do meio-dia de ontem.
O contato inicial teria sido feito por uma deputada de Honduras. Ela teria procurado o encarregado de negócios da Embaixada do Brasil, Francisco Catunda, dizendo que a mulher de Zelaya queria conversar e que o presidente estava por perto. Catunda administra a embaixada desde o início da crise, quando o Brasil retirou seu embaixador, Brian Neele. Ele entrou em contato com Brasília antes de receber Zelaya. Segundo Amorim, a entrada do presidente foi autorizada pelo subsecretário-geral do Itamaraty para a América do Sul, Enio Cordeiro, "de acordo com as instruções existentes".
Amorim disse ter sido informado da iniciativa em seguida e comunicou-a ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estava no avião a caminho dos Estados Unidos e "autorizou" a decisão. Lula participa nesta semana da abertura da 64ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) e da reunião de cúpula do Grupo dos 20 (G-20).
Amorim falou por telefone com Zelaya. Disse que lhe deu "boas vindas" e perguntou sobre seu estado de saúde. "Ele disse que estava bem, apesar da caminhada difícil por montanhas." O presidente não está asilado na embaixada, porque o Brasil não reconhece o atual governo de Honduras, disse Amorim.
"Minha presença aqui é para exercer o mandato que o povo me deu nas urnas eleitorais, para reconstruir a democracia", disse Zelaya na embaixada, acrescentando que estava tentando uma negociação com o governo interino.
Manifestantes pró-Zelaya foram à porta da representação brasileira quando souberam de sua presença no país, e cerca de dez pessoas tiveram sua entrada autorizada depois, segundo Amorim. Ele afirmou que qualquer ameaça a Zelaya ou à segurança da embaixada será tratada como uma "violação da lei internacional". O Departamento de Estado dos EUA pediu que os lados evitem a violência.
Pouco antes da confirmação da volta, Micheletti disse que Zelaya seria preso imediatamente. Temos equipes de buscas para prendê-lo". (Com agências internacionais)