Título: Regra de capital afeta comércio, diz OMC
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2009, Finanças, p. C3

A Organização Mundial do Comércio (OMC) vai pedir aos líderes do G-20 para que as exigências de maior capital por parte dos bancos sejam aplicadas de maneira flexível no caso específico de financiamento ao comércio internacional, pelo pouco risco que esse tipo de operação provoca. Pelo acordo de Basileia 2, os bancos têm de manter mais capital em proporção do risco dos ativos. Esse acordo está sendo revisado e a tendência é de endurecer as exigências de capital, para as instituições financeiras correrem menos riscos.

Mas a OMC constata que as regras de Basileia 2 sobre empréstimos de curto prazo "continuam a ser um sério complicador para engajamento em novos negócios" nas trocas globais.

Em relatório que circulou para seus 152 países membros, a entidade reconhece que pouco progresso tem sido feito para "convencer os reguladores" tanto da necessidade de atenuar as exigências que envolvem o financiamento ao comércio global como em encontrar "acomodações" e reconhecer o caráter de curto prazo dos créditos para exportações e importações.

Uma pesquisa da Associação de Bancos para Finanças e Comércio (Baft, em inglês), dos EUA mostra que 43% dos bancos reclamam que Basileia 2 teve um impacto negativo em sua capacidade para financiar exportações e importações. Bancos nos países industrializados reclamaram ainda mais, com 60% respondendo que as exigências do acordo têm sido um "impedimento" para elevar o crédito.

Pascal Lamy, diretor-geral da OMC, disse ao Valor que já levou o problema ao presidente do Fórum de Estabilidade Financeira, o italiano Mario Draghi. E está claro que vai tratar do tema na sua participação na cúpula do G-20 em Pittisburgh na sexta e no sábado.

O mercado global de financiamento ao comércio (trade finance) é estimado em US$ 10 trilhões e descrito como a "graxa" para facilitar exportações e importações, normalmente com maturação de até 180 dias.

Com a crise financeira e econômica global, o mercado quase secou. O Brasil foi o primeiro país a levar o problema à OMC, reclamando de uma situação paradoxal, já que o financiamento ao comércio é um dos modos mais seguros de crédito devido à sua curta maturidade e existência de garantia física (os produtos), por exemplo.

Mas os bancos se retiraram do financiamento de curto prazo, preferindo emprestar, quando o fazem, para o longo prazo, com rendimento aparentemente mais garantido. "Basileia 2 agudizou a crise no comércio internacional", diz o embaixador brasileiro junto a OMC, Roberto Azevedo.

O Brasil reclamou que exportadores de países em desenvolvimento que buscam financiamento para exportação, apesar de terem melhor capacidade creditícia, e portanto menos riscos, em muitos casos não conseguiram acesso a crédito num cenário com percepção de alto risco.

Esta semana, o problema volta a ser tratado pelos países membros, num encontro em Genebra. Reunião na semana passada entre bancos internacionais com Lamy mostrou que houve uma ligeira melhora no mercado, mais por causa da queda na demanda por crédito. A Organização Mundial do Comércio quer elaborar uma abordagem "mais científica" para demonstrar o baixo risco relacionado ao financiamento à exportação. Segundo a OMC, as taxas mais spreads cobrados no financiamento ao comércio variam entre 200 e 400 pontos-base acima da Libor. Estima que a China teve papel importante no aumento da concorrência e redução dos spreads, com suas importações significativas de commodities. Bancos no Brasil e da Índia também foram emprestadores líquidos. Já na Europa e EUA ainda não há completa recuperação do crédito.