Título: G-20 busca coordenação, mas racha trava reforma do FMI
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2009, Internacional, p. A11

Os líderes do Grupo dos 20 chegaram ontem perto de um acordo para criar um novo mecanismo de coordenação global que evite descompassos entre suas políticas econômicas, mas divergências entre os Estados Unidos e a Europa ampliaram as dificuldades para fazer avançar a reforma do Fundo Monetário Internacional (FMI), outra prioridade da agenda da reunião de cúpula do grupo hoje.

O Brasil e outros países em desenvolvimento que têm cobrado mudanças em instituições como o FMI temem que as dificuldades dos países ricos para superar suas diferenças acabem freando o impulso que a crise financeira parecia ter dado para acelerar essas reformas.

Os líderes do G-20 tiveram um jantar ontem à noite e se reunirão novamente hoje em Pittsburgh, nos EUA. O grupo é formado pelos países mais ricos do mundo e potências emergentes como o Brasil, a China e a Índia. Este é o terceiro encontro de cúpula do G-20 desde o início da crise, quando o grupo assumiu um papel central nas discussões sobre a economia mundial.

Os EUA propuseram aos demais membros do G-20 um pacto em que cada país se comprometeria com uma série de políticas domésticas necessárias para assegurar que o mundo volte a crescer sem alimentar desequilíbrios macroeconômicos como os que contribuíram para fomentar a crise financeira.

Mas a China e outros países emergentes resistiram à proposta, por temer que ela leve a uma maior intromissão de instituições como o Fundo, que os americanos gostariam de ver assumindo um papel central no monitoramento dos compromissos assumidos pelos participantes do pacto.

Os europeus também torceram o nariz. A chanceler alemã, Angela Merkel, expressou sua insatisfação ontem mesmo, numa entrevista antes de embarcar para Pittsburgh. "Não devemos procurar novos assuntos e esquecer a questão da regulação dos mercados financeiros", afirmou Merkel.

Uma versão mais suave da proposta americana, apresentada pelo primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, parecia ter ganho terreno nas negociações ontem. Brown sugere que o próprio G-20 se encarregue de monitorar as políticas domésticas de seus membros, restringindo o FMI a funções de assessoria nesse processo.

Os EUA defendem a transferência de 5% dos votos do FMI para os países emergentes, o que tornaria a divisão de forças na instituição mais equilibrada. Os americanos propuseram também a redução do número de cadeiras na diretoria-executiva da organização. França e Reino Unido são contra, porque perderiam espaço com essas mudanças.

Todos os países que fazem parte do G-20 concordam com a necessidade de dar mais poder para as nações em desenvolvimento no FMI e se comprometeram com a ideia nas reuniões anteriores do grupo. Mas não há consenso sobre a melhor maneira de tirar esse princípio do papel.

Os europeus gostariam que os votos no Fundo fossem redistribuídos de acordo com o peso relativo dos países na economia mundial e não com o seu estágio de desenvolvimento, um esquema que prejudicaria a Arábia Saudita e poderia beneficiar países ricos como a Espanha.

Os países emergentes pedem a transferência de 7% dos votos do Fundo e querem incluir um número no comunicado final que os líderes do grupo divulgarão hoje à tarde, mas as chances de que isso ocorrerá pareciam remotas ontem, por causa das divergências entre os países ricos.

Em entrevista a jornalistas ontem, o assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, disse que houve nos últimos dias "um certo retraimento" dos negociadores dos países ricos nessa discussão e que qualquer avanço dependeria das conversas que os líderes do grupo terão.

Os países ricos também pareciam longe de um consenso sobre as reformas necessárias para impor disciplina ao sistema financeiro e torná-lo mais seguro. Os americanos querem que os bancos sejam obrigados a reforçar suas reservas de capital, mas novas exigências nessa área criariam dificuldades para vários bancos europeus agora.

O Conselho de Estabilidade Financeira (FSB), organização que reúne reguladores de vários países e ganhou influência com a crise, apresentará aos líderes do G-20 sugestões para reforçar o capital dos bancos e evitar que as políticas de remuneração dos bancos estimulem a tomada de riscos excessivos como os que levaram à crise.

O secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, disse a jornalistas ontem à noite que o grupo estava perto de fechar um acordo sobre as restrições que poderão ser impostas às políticas de remuneração dos bancos, incluindo padrões diferenciados para cada país que seriam detalhados até o fim do ano e monitorados pelo FSB.