Título: Tasso apresenta parecer contrário à entrada da Venezuela no Mercosul
Autor: Agostine , Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 01/10/2009, Política, p. A8

O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentará hoje à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional relatório com voto contrário à adesão da Venezuela ao Mercosul. Em seu parecer, Tasso faz duras críticas ao processo institucional na Venezuela e justifica sua proposta de veto à "estratégia de destruição da democracia e implantação de regime autoritário" do presidente venezuelano Hugo Chávez.

O parecer será lido hoje na comissão, mas a votação deve ser adiada para a próxima semana. Os governistas devem pedir vista coletiva para tentar articular a derrubada do parecer. O projeto que trata do protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul tem de ser votado em plenário.

Responsável no Senado pela relatoria do projeto de decreto legislativo 430/08, Tasso analisa que o debate político sobre a entrada da Venezuela no bloco é mais importante do que o aspecto econômico. Em todo o texto do parecer de 31 páginas, o senador ressalta que a parceria com a Venezuela é uma decisão política e, por isso, mostra-se contrário. "É um grave erro priorizar os aspectos econômicos em detrimento dos políticos, quando se negocia com estados onde os princípios democráticos foram subordinados ao império da vontade de seus governantes", escreveu Tasso.

Sob pressão de empresários, Tasso cogitou apresentar um parecer favorável, mas com restrições. O relatório apresentado, no entanto, não só defende o veto ao país no Mercosul como traz duras críticas à parceria. "Foram se acumulando ações do presidente Chávez que me assustaram, como a articulação dele em Honduras e o fechamento de canal de televisão. Há um projeto anti-democrático na Venezuela", disse. "Corremos o risco de o Mercosul transformar-se em um barril de pólvora."

As críticas à entrada da Venezuela no bloco somam-se a ataques feitos pelo relator ao Mercosul. Na análise do senador, "o Mercosul não avança em termos de livre comércio e em termos de tarifa externa comum". Ele citou retrocessos na relação comercial, como na parceria com a Argentina, e alega a "falta de segurança jurídica no bloco".

No Congresso, o PSDB, como partido, é o principal opositor à entrada da Venezuela no Mercosul, mas há governistas importantes também contra a permissão, como o presidente do Senado, José Sarney, e o presidente da Comissão de Infraestrutura, Fernando Collor, ambos ex-presidentes da República. Na Câmara, o PSDB foi o único partido que votou em bloco pela rejeição da adesão. O partido comanda no Senado a Comissão de Relações Exteriores, com Eduardo Azeredo (MG), e deu a relatoria a Tasso, suplente na comissão. "O partido sempre foi crítico a esse tema", explicou Azeredo. "Não é um debate só partidário", considerou Azeredo. "Mas não pode ser observado só do ponto de vista econômico", disse.

Na comissão o governo poderá ter dificuldade para rejeitar o relatório: dos 19 integrantes, cinco são do PT. Os sete do PSDB e DEM devem votar com Tasso. O senador Fernando Collor (PTB-AL) já se mostrou contrário à adesão da Venezuela. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem desavenças antigas com Chávez e poderá orientar os cinco integrantes do bloco PMDB/PP na comissão a resistirem - e, posteriormente, na votação em plenário. A bancada do PMDB é a maior da Casa. O DEM também tem restrições.

Tasso escolheu um momento estratégico para apresentar o relatório, quando o Brasil negocia com Honduras a permanência do ex-presidente Manuel Zelaya na embaixada brasileira em Tegicigalpa - ação política comandada pelo presidente venezuelano e alvo de críticas. O episódio citado, segundo o relator, é "mais um exemplo dos problemas criados por Chávez".

O parecer de Tasso gerou críticas do governo e o PT vai associar a decisão a perdas econômicas ao país. Para a líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC), o "PSDB se desgastará". "Economicamente a adesão da Venezuela é uma proposta irrecusável", disse Ideli. "Queremos ver o PSDB defender que não vale a pena o acordo comercial. Vendemos muito para a Venezuela e compramos pouco deles. É superávit comercial. Se eles ideologizarem, vão se prejudicar."

O comércio Brasil-Venezuela cresceu 885% nos últimos dez anos e o comércio com o país foi o que mais contribuiu para o superávit primário em 2008: 18% do saldo brasileiro vêm das exportações para o país vizinho. O PIB da Venezuela é de US$ 300 bilhões e seu "potencial econômico atrai um conjunto expressivo de empresas brasileiras, em especial na área de construção pesada". Os dados foram citados pelo relator, mas ele ressalta que as divergências com Chávez impedem o estreitamento das relações comerciais. "(Chávez) tem demonstrado pouca consideração a acordos e contratos, e costuma pautar suas relações internacionais entre amigos e inimigos, as empresas, investidores e o próprio governo brasileiro poderão encontrar, no futuro, situações difíceis e complicadas", assinalou.

O protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul foi firmado em 2006, em Caracas, e precisa ser aprovado pelos Parlamentos dos países integrantes do Mercosul. Argentina e Uruguai já aprovaram a adesão da Venezuela ao bloco. No Paraguai a resistência foi grande e o governo retirou de pauta o projeto, com receio de que fosse rejeitado.