Título: Europa deve elevar exigência ambiental
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Fonte: Valor Econômico, 29/09/2009, Especial Mineração, p. F4

A pressão da sociedade e dos agentes econômicos por mais responsabilidade socioambiental da atividade mineradora está prestes a iniciar uma nova fase. Guy Thiran, secretário-geral da European Association of Metals (EuroMetausx), relata que a Comunidade Europeia planeja estabelecer em um prazo de três a cinco anos novas diretrizes em relação ao uso de matérias-primas, entre elas os minerais. As ações em estudo deverão reduzir o consumo de recursos naturais, estipular um controle maior sobre a toxidade de insumos e impor regras rígidas para garantir a sustentabilidade na obtenção dos mesmos. "Caminhamos para a adoção de um selo verde na mineração", diz Thiran.

Segundo o executivo, as novas diretrizes buscam o consumo consciente. Entre as ações a serem implantadas estão previstas medidas para reduzir a quantidade de material utilizado na produção, com a promoção do ecodesign, incentivos para a reutilização de produtos e, quando isso for impossível, à reciclagem. Em relação aos insumos, o que se prevê é a adoção de um mecanismo de rastreamento e controle de compras como o que já existe para produtos químicos, o REACH (Registration, Evaluation, Authorisation and Restriction of Chemicals). "A Europa vai ficar mais rigorosa com relação ao padrão de sustentabilidade dos insumos que compra, e acreditamos que esse comportamento será seguido por outras regiões do mundo", afirma Thiran.

Representantes da indústria de mineração receberam a notícia com duas reações distintas. Para alguns, está sendo preparada por parte da Europa mais uma medida protecionista. O colombiano Aurelio Martinez Canabal, presidente do Organismo Latinoamericano de Minería (OLAMI) não tem dúvida de que se trata de mais uma barreira não tarifária com o objetivo de proteger as empresas europeias da concorrência estrangeira. Ele promete reação. "É uma inibição ao livre comércio e vamos recorrer na OMC", afirma.

Outra visão sobre o tema é a apresentada por Rinaldo César Mancin, diretor de assuntos ambientais do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). Ele concorda que há um viés protecionista na ação europeia. Mas acha que a busca por sustentabilidade é uma tendência que vai se intensificar em todo o mundo, portanto, o caminho para as mineradoras é se adaptar às novas exigências. No curto prazo, Mancin admite que as mineradoras menos sustentáveis poderão buscar mercados menos exigentes para seus produtos.

Essa decisão, contudo, representa abrir mão de um mercado, a Europa, que em 2008 respondeu pela compra de aproximadamente 30% das exportações brasileiras de minérios.

As novas demandas europeias, se vierem a ser confirmadas, formam mais um capítulo na busca de sustentabilidade pelo setor de mineração. Como relata Anthony Hodge, presidente do Conselho Internacional de Mineração e Metais (ICMM), ao longo da história, a mineração construiu uma imagem negativa junto à sociedade, sendo vista como uma atividade que gera um grande passivo socioambiental. Não sem razão, admite o executivo. "A mineração nem sempre foi feita de forma que se pode orgulhar", admite Hodge. "Mas as coisas estão mudando de forma rápida."

Os passivos socioambientais da mineração no mundo são conhecidos. Grandes volumes de terras são removidos e nem sempre o solo é adequadamente recuperado após o esgotamento das minas. O uso de água é intensivo. A aplicação inadequada, em algumas minerações, de reagentes ácidos contamina solo e água. A possibilidade de rompimento de barragens de rejeitos é um risco constante. Cidades próximas às áreas de mineração crescem de forma desordenada e ficam ociosas após o fechamento das minas, sem um saldo social positivo para suas populações.

Nos últimos anos, relata Hodge, a indústria de mineração está se esforçando para reverter essa história. "Hoje a sustentabilidade já está no cerne do planejamento das empresas minerais", afirma o executivo.

Esse novo comportamento, relata Hodge, é decorrente da conscientização dos dirigentes do setor, que, a exemplo do resto da sociedade, estão cada vez mais preocupados com o tema ambiental; da adoção de legislações mais rigorosas por parte do poder público e principalmente por motivação econômica. Nos anos 90, lembra Hodge, a opinião pública passou a manifestar de forma mais incisiva seu descontentamento com o setor, cobrando uma maior responsabilidade socioambiental. Na sequência veio a pressão dos agentes econômicos que passaram a precificar o risco da atividade, exigindo a adoção de práticas ecoeficientes como forma de mitigação.

"A questão ambiental tornou-se determinante para os órgãos financeiros e investidores bancarem ou não um projeto", afirma Eleazar de Carvalho Filho, chairman da BHP Billiton Brasil. "Hoje um projeto mineral nasce sustentável, ou não existe", confirma Juvenil Tibúrcio Félix, presidente da IMS Engenharia Mineral. "Para as mineradoras, a sustentabilidade tornou-se parte do negócio aqui e em todos os países. Portanto não impacta na competitividade. A avaliação econômica de uma nova jazida leva em consideração o custo socioambiental de sua exploração e o projeto só é aprovado se for economicamente viável", afirma João Bosco Silva, diretor-superintendente da Votorantim Metais.

Mas a mineração não é feita só de projetos de classe mundial e por grandes mineradoras. Como em qualquer mudança de paradigma, os avanços são mais rápidos em algumas empresas com perfil mais inovador, e introduzidos mais lentamente por outras. Anthony Hodge relata que o ICMM foi criado em 2001 tendo como uma de suas principais metas a elaboração e difusão de boas práticas de sustentabilidade entre as mineradoras de todos os portes. "O resultado de uma atividade de mineração pode conduzir a um passivo socioambiental que será arcado pelos governos e pela sociedade. Ou a mineração pode ser planejada para gerar riquezas para os acionistas, para os empregados, governos e para a comunidade. No mundo atual só há espaço para o segundo procedimento", diz o executivo.