Título: AL contraria pessimismo de analistas
Autor: Moura , Marcos
Fonte: Valor Econômico, 15/10/2009, Internacional, p. A13

A América Latina vai se recuperar muito mais rapidamente da crise mundial puxada pelo mercado interno e pela conjunção de planos de incentivo bem orquestrados por todo o planeta, dos EUA à China. É o que dizem os analistas consultados pelo Valor, meio que em tom de mea-culpa, meio que ressabiados em admitir que fizeram previsões pessimistas demais, que subestimavam a capacidade de recuperação da região.

O pessimismo que dominou as previsões feitas no início do ano não resistiu muito tempo. Projeções deste mês apontam que alguns países da região chegarão ao fim do ano com um ritmo de crescimento mais forte do que se imaginava e que 2010 será muito melhor do que o previsto para quase todas as maiores economias latino-americanas.

Em 2009, segundo cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI), a maior revisão para cima diz respeito à economia brasileira. Em abril, o fundo previa que o país teria uma retração de 1,3% este ano. A previsão de outubro é de um recuo de 0,7%. Para a Goldman Sachs, a diferença é ainda maior: de -1% para +0,4%. Colômbia também foi alvo de revisão: de -1% para 0% a 0,5% este ano, segundo a Goldman Sachs. A perspectivas para a Venezuela, diz o FMI, também melhoraram, mas muito levemente: de -2,2% para -2%.

Em 2010, os campeões do crescimento - na previsão do FMI e da Goldman Sachs - serão, nesta ordem, Peru, Chile e Brasil. Todos com taxas acima dos 4,8%.

Segundo Alberto Ramos, economista da Goldman para a América Latina, ao menos outros três fatores contribuíram para a revisão para cima das projeções da região: a aversão muito menor ao risco do que a que se viu no pico da crise internacional e a solidez do sistema financeiro latino-americano, associado às reservas que os banco centrais haviam constituído.

O terceiro fator foi a China. "A revisão das projeções para a América Latina se deveu também à robustez do crescimento da China, cuja economia é muito complementar à da região. Há muita exportação para o mercado chinês e também muita importação."

Ramos concorda com outros analistas que admitem que subestimaram a capacidade de reação da economia e os efeitos dos pacotes. Segundo Bráulio Borges, econiomista-chefe da consultoria LCA, a maioria dos erros de avaliação ocorreu entre o fim de fevereiro e o fim de março, quando os países começaram a divulgar os dados do quarto trimestre de 2008. "E como os resultados foram muito piores do que se imaginavam, as previsões feitas naquele momento foram bem negativas. À medida que os dados foram se mostrando mais melhores começaram a melhorar as perspectivas."

Francisco Ferreira, vice-economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina explica dessa forma a melhora nas previsões: "Essa foi uma crise nova. Um colapso de natureza inédita. Um colapso de um tipo de ativos - derivativos, subprimes - que não se tinha vivido antes. E por isso os analistas tinham muitas dúvidas em relação à sua duração", disse ele. "O último trimestre de 2008 e o primeiro de 2009 foi o ponto mais agudo da crise", lembra. "Mas a partir de então, pacotes de estímulo muito grandes nos EUA, na China e também na Alemanha começaram a mudar a situação. A reação foi melhor do que se imaginava." O Brasil, avalia Bráulio Borges, puxou as previsões ruins do começo do ano. E agora - junto com Colômbia e Equador - vai no sentido inverso, isto é, puxa a recuperação, diz.

No caso do Brasil, a maior economia da América Latina, lembra Ferreira, medidas anticíclicas foram chave para ajudar o manter o pulso do consumo e aquecer o enorme mercado interno. Ao contrário da economia mexicana - hiperdependente do mercado americano e a que mais encolherá este ano (-7,3%) entre as maiores economia da América Latina - o Brasil conseguiu absorver melhor o impacto da crise justamente por que o mercado internacional não tem um peso tão grande.

No início do mês, o jornalista americano Fareed Zakaria, fez uma espécie de ode às economias emergentes - entre elas o Brasil e outros latinos - durante um evento organizado pela IBM em Nova York sobre o uso de tecnologia na gestão de cidades. O colunista da "Newsweek" disse que esses países mostraram durante a crise que seus mercados internos são mais fortes do que muitos imaginavam e que os padrões de governança e a habilidade dos governantes para lidar com a turbulência marcou o ano de 2009 como o primeiro da história em que as nações de fora do clube dos ricos puxam o crescimento mundial. Na época do pessimismo generalizado do início da crise quem apostaria nisso?

Ontem, a consultoria RGE do economista Nouriel Roubini, apresentou um estudo com perspectivas para a região, que diz que em no ano que vem o crescimento da América Latina será de 3,3% (ante os 3% previstos anteriormente) e que neste ano o tropeço será menor do que eles previam: retração de 2,6% (e não mais de 3%).