Título: Sucesso do programa exige sintonia com outras ações
Autor: Santos , Chico
Fonte: Valor Econômico, 14/10/2009, Especial, p. A16
A Secretária Nacional de Renda da Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social , Lucia Modesto, disse ao Valor ter consciência de que "o Bolsa Família é uma das políticas de um rol de ações" que o Estado brasileiro vem desenvolvendo para combater a pobreza e a desigualdade. O dinheiro, segundo ela "dá um alívio imediato, uma segurança, sem resolver o problema como um todo".
Alívio financeiro, acompanhamento das condicionalidades (educação e saúde das crianças) e do desenvolvimento das famílias são os três pilares do Bolsa Família, segundo a secretária. Mas para alcançar a superação da pobreza, ela entende que o programa precisa ser visto em sintonia com outras iniciativas, como o programa da agricultura familiar, o microcrédito, o microempreendedorismo, os esforços para adensar as cadeias produtivas e outros.
No caso das famílias de Maria José e de Joselma, Lucia disse que elas estão no nível da pobreza extrema, no "núcleo duro" da pobreza no país. Segundo ela, os chilenos já descobriram "e vale também para nós" que naquele nível de pobreza, "por mais esforço que se faça, o núcleo duro não diminui". A secretária ressalvou que, paralelamente a casos de resistência da pobreza, as equipes do ministério têm colhido muitos exemplos de avanços.
"O Bolsa Família não vai fazer as pessoas progredirem. Ele dá um tempo para as crianças crescerem, mas só vai possibilitar um pulo para fora da pobreza se os serviços realmente chegarem, educação em especial", destaca a socióloga Sonia Rocha, da Fundação Getulio Vargas (FGV). Ela diz que já foi crítica do programa como um todo, mas que hoje é cada vez menos.
"O valor maior do Bolsa Família é [o beneficiário] poder contar com aquele valor todo mês, ainda que seja pouco. Dá uma segurança enorme para quem só dependia da chuva (no caso da família rural)", afirma. Ela ressalta que no meio rural os avanços chegam lentamente se comparados com o que ocorre na periferia urbana, até por falta de densidade.
Além disso, Sônia vê obstáculos extras à superação da pobreza no Nordeste rural. Além da elevada taxa de natalidade (em Alagoas, por exemplo, segundo o IBGE, a taxa bruta de natalidade em 2007 era de 24,24 por mil habitantes, diante de 16,70 no Brasil), ela avalia que a agricultura de subsistência que prevalece na região não gera renda suficiente, porque está cada vez mais fora do mercado por falta de qualidade. Ainda assim, ela enxerga avanços, como as cisternas, a chegada da energia elétrica e a melhora na saúde. Na educação, ela observa declínio.
A economista Lena Lavinas, que em 2005 disse, a propósito do Bolsa Família, que os pobres estavam "comendo um pouco melhor", mas que não se estava "indo além disso", é outra que passou a ver mais aspectos positivos no programa e no esforço geral de combate à pobreza. "Se uma pessoa pode fazer uma ligadura [de trompas] no setor público onde mora é porque esse serviço está disponível lá", disse. "Benefício social não tira ninguém da pobreza. O que o Bolsa fez foi reduzir o grau de indigência", disse ela, para quem o programa deu ao pobre "autonomia para fazer escolhas".
Para Lena, hoje secretária de Ciência e Tecnologia de Nova Iguaçu (Baixada Fluminense), a recente redução da pobreza no país decorreu de outros aspectos, especialmente do crescimento do mercado de trabalho e do aumento real do salário mínimo. Ela defende que o Bolsa Família tenha caráter mais universal, ao menos para famílias com crianças, sem condicionalidades. "Onde há criança, há vulnerabilidade", diz. (CS)