Título: Mercado vê avanço de 8%
Autor: Gonçalves, Marcone
Fonte: Correio Braziliense, 09/06/2010, Economia, p. 13

Forte crescimento do PIB leva analistas a refazerem as contas e projetarem para o ano o maior desempenho em três décadas

A confirmação do forte aumento da atividade econômica no primeiro trimestre do ano obrigou o mercado a rever, para cima, as projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil ao final deste ano. As estimativas para a atividade econômica, que até a semana passada estavam em torno de 6,6%, estão agora próximas de 8%, resultado que, se confirmado, fará com que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva entregue ao seu sucessor uma economia com o melhor desempenho anual em três décadas. Em 1980, a economia do Brasil subiu mais (9,23%) e nunca mais cresceu tanto.

O otimismo dos analistas de mercado com o resultado obtido no primeiro trimestre está relacionado, principalmente, com o forte aumento dos investimentos, um indicador considerado fundamental para sustentar a expansão da economia. Ao gastarem mais dinheiro na compra de máquinas, equipamentos e material de construção, os empresários deram uma demonstração clara de que apostam no aumento das vendas e não no dos preços dos produtos.

Para o ex-presidente do Banco Central Carlos Langoni, o resultado do primeiro trimestre faz com que o desempenho brasileiro se aproxime dos outros grandes países emergentes que, com o Brasil, formam o grupo dos Brics: Rússia, Índia e China. ¿O resultado é expressivo porque está sendo liderado pelos investimentos e pelo consumo privado, numa conjuntura em que as nossas exportações se recuperam de maneira lenta¿, afirmou. Langoni acrescentou ainda que a melhor notícia do PIB foi o ¿crescimento sustentável do consumo privado, sem bolhas¿.

BC em campo Entretanto, os próprios especialistas alertam que o boom da economia é passageiro, atípico e sofre de um efeito estatístico: cresceu muito porque a base de comparação com os trimestres anteriores ainda estava bastante deprimida por conta dos efeitos da crise internacional iniciada em 2008, com a quebra do banco Lehman Brothers. Para o economista-chefe do banco Itaú-Unibanco, Ilan Goldfajn, o Brasil não tem como sustentar o atual ritmo do PIB, daí porque o Banco Central entrou em campo para frear a atividade econômica. ¿A economia já está desacelerando sob os efeitos da subida de juros, já está indo lá para baixo¿, afirmou Goldfajn, para quem o resultado no final de 2010 ficará elevado, em 7,5%. ¿É no terceiro e quatro trimestres que veremos se a redução da atividade foi tanto quanto a necessária.¿

E é justamente o ritmo da queda a principal variável que os economistas discutem para projetarem o resultado do PIB de 2010. O anúncio do PIB do trimestre levou o banco Santander a refazer as projeções para o resultado anual de 6,3% para 7,8%. ¿A gente revisou em parte, porque o crescimento veio mais forte do que se projetava e, embora esteja ocorrendo a desaceleração neste segundo semestre, ela vem bem menos forte do que se esperava¿, explicou Luiza Rodrigues, economista do banco Santander. A seu ver, o fato saudável é que o PIB foi puxado pela indústria, do lado da oferta, e pelos investimentos, ¿o que é positivo para a expansão da capacidade instalada¿ e ¿vai diminuir, marginalmente, as pressões inflacionárias¿.

Gasto criticado Para Gustavo Loyola, outro ex-presidente do BC, os resultados do primeiro trimestre não surpreenderam e nem trazem nenhuma projeção relevante para a definição da política monetária no futuro. ¿O Banco Central continuará aumentando os juros para frear o crescimento da economia¿, assinalou. Para Loyola, sócio da consultoria Tendências, o ideal seria que a política fiscal do governo ajudasse o governo na mesma direção, por meio da contenção dos gastos públicos, o que não se verifica no momento.

As críticas de Loyola são uma unanimidade no mercado, assim como a defesa de reformas tributária e da Previdência, a independência do Banco Central e o aumento de investimentos em educação como formas de aumentar a capacidade de a economia crescer sem gerar pressão sobre os preços. Mas o otimismo com o futuro também tem lugar entre os analistas. ¿Hoje, vivemos uma unanimidade inteligente, com os três candidatos com a mesma visão macroeconômica¿, avaliou Langoni.

A gente revisou em parte, porque o crescimento veio mais forte do que se projetava e, embora esteja ocorrendo a desaceleração neste segundo semestre, ela vem bem menos forte do que se esperava¿ Luiza Rodrigues, economista do banco Santander

Mantega eleva projeção para até 6,5%

A confirmação da expansão de 9% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre finalmente levou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a reconsiderar a projeção de crescimento da economia neste ano para um nível entre 6% e 6,5%. Até a divulgação do crescimento, feita ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), o ministro sustentava que a expansão do produto brasileiro deveria ficar entre 5,5% e 6%. Mantega comemorou o resultado do trimestre, avanço de 2,7%, que ficou um pouco acima do intervalo entre 2% e 2,5% por ele estimado, mas tentou minimizar o impacto dos números, ao dizer que o crescimento se deu sobre uma base de comparação deprimida pela crise.

O chefe da equipe econômica afirmou, por meio de uma nota, que ficou muito satisfeito com o resultado do PIB, o qual mostrou ¿uma das melhores recuperações do mundo¿ para a economia brasileira. ¿Temos que lembrar ainda que isso se deu em relação a um ano muito fraco¿ destacou Mantega. De acordo com a economista-chefe da Icap Brasil, Inês Filipa, o ministro apenas cumpre o seu papel ao manter um discurso mais conservador. Ela não descarta uma expansão mais forte do que a sugerida pelo ministro. ¿Tem um efeito estatístico forte e um crescimento (de 6,5%) que, por si só, vai gerar uma inflação de pelo menos um ponto percentual acima da meta (5,5% no ano). Se não houver uma estabilização nos próximos trimestres, é possível, sim, esperar uma expansão maior¿, avaliou.

Percentual mínimo O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, também estimou um crescimento maior do que o que consta na última revisão do orçamento da União (5,5%), assinada por ele e enviada ao Congresso Nacional. ¿O governo almeja que tenhamos um crescimento na casa dos 5%, mas, para este ano, teremos que refazer as contas para 6%. Está difícil dar hoje menos que 6%¿, admitiu, também em nota. Pelos cálculos do economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, 6% é o mínimo que a economia brasileira cresceria se, a partir de abril, ficasse estagnada até o resto do ano. ¿Seria impossível menos que isso, porque para crescer só 5,5% no ano, o PIB teria que cair nos próximos trimestres¿, disse.

Desaquecimento O ¿pibão¿, conforme apelido dado por Bernardo, caminha para uma trajetória moderada e sustentável, segundo Mantega. Em sua manifestação, o ministro Mantega destacou que o segundo trimestre já mostra sinais de desaquecimento da economia. ¿Temos a volta dos impostos, que vai fazer a demanda cair, a volta do compulsório e a taxa de juros, que já subiu 0,75 ponto percentual. Além disso, tivemos o corte de R$ 10 bilhões nos gastos do governo¿, destacou. O ministro não destacou, contudo, o aumento do nível das despesas públicas desde de 2009.

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, viu nos números do PIB do primeiro trimestre uma ¿expansão vigorosa¿ da economia. Segundo ele, os dados demonstraram, de forma cabal, ¿o acerto da estratégia adotada de combate à crise¿.

Mais contundente que os colegas de governo, o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, não escondeu a decepção com o cenário de forte expansão econômica. ¿O crescimento é alto, de 2,7% [no primeiro trimestre de 2010 sobre o último de 2009). Não deveria ser tão alto. É surpreendente e exagerado. (O ritmo forçado) não só é capaz de gerar inflação, como de criar outros problemas na área de logística. Temos de resolver uma série de questões em logística que ainda não resolvemos¿, reconheceu.

SERRA MINIMIZA PIB O pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB, José Serra, disse ontem que a base de comparação favoreceu a alta na taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre de 2010, conforme dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). ¿No ano passado, a economia ficou parada e declinou, mas é bom que o PIB esteja crescendo. Evidentemente a base de comparação no ano passado favorece¿, declarou Serra. A economia cresceu 2,7% no primeiro trimestre ante os três meses anteriores, maior expansão desde o primeiro trimestre de 2004, segundo o IBGE. ¿É bom que tenha tido essa recuperação. Eu estou feliz¿, disse o tucano, que não poupou críticas ao desequilíbrio das contas externas provocado pela aceleração das importações e pelo comportamento moderado das exportações.