Título: Crise amplia espaço dos bancos oficiais
Autor: Guimarães, Andréa
Fonte: Valor Econômico, 29/10/2009, Especial, p. G2

O crescimento na atuação dos bancos públicos desde o início da crise financeira é indiscutível e só foi possível porque as instituições já estavam preparadas para isso. A avaliação é das próprias companhias, que destacam a agilidade no momento em que a liquidez na área de crédito encolheu no final de 2008. "Não foi nada por acaso ou resultado de uma visão puramente oportunista do momento. Já estávamos em crescimento e prontos para atender o mercado com um portfólio de produtos competitivo e adequado", diz Allan Simões Toledo, vice-presidente de negócios internacionais e atacado do Banco do Brasil.

Dados do Banco Central mostram que a participação dos bancos públicos na área de crédito, como proporção do PIB, cresce de forma consistente desde o início da crise. A taxa crédito/PIB dessas companhias saiu de 13,2% em setembro de 2008 para 18,3% em agosto deste ano. Instituições como Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil registraram uma evolução contínua desse indicador. A parcela dos bancos públicos brasileiros no crédito pulou de 7% para 9,7% nesse período. No caso do BNDES, a participação saltou de 6,2% para 8,6% entre setembro do ano passado e agosto de 2009. "O interessante é que os bancos públicos conseguiram puxar a expansão do mercado crescendo em segmentos de baixo risco e alto retorno. Se expandiram sem abrir mão da qualidade das carteiras", diz Gilberto Borça, economista da área de pesquisa e acompanhamento econômico do BNDES.

Em relação às instituições privadas, a expansão foi mais discreta. O índice passou de 25,5% em setembro de 2008 para 26,6% em março de 2009. No último quadrimestre do ano passado, a parcela dessas empresas no crédito registrou uma magra evolução de 0,8 ponto - de 25,5% em setembro para 26,3% em dezembro. Seguindo esse mesmo ritmo de leve crescimento, entre março e agosto, a taxa de participação aumentou apenas 0,3 ponto percentual - para 26,9%. Executivos do setor acreditam, porém, que os bancos privados ganhem parcelas maiores do crédito daqui para frente, e os ganhos dos bancos públicos se acomodem.

"Na Caixa Econômica, a expectativa é que continuemos a ganhar mercado, mas provavelmente não na mesma velocidade que verificamos de setembro a junho", diz Marcos Vasconcelos, vice-presidente de controle e risco da Caixa Econômica Federal. Na CEF, a relação entre carteira de crédito e PIB passou de 2,3% em setembro de 2008 para 3,7% em agosto. Segundo Vasconcelos, quando a crise ganhou proporções maiores, a empresa já tinha consolidado a sua área de crédito, após investimento feito no setor em 2007. Foi realizada uma forte reestruturação na área e foram criadas vice-presidências para acompanhar a área de crédito para a pessoa física e jurídica. Em 2008, essa iniciativa começou a gerar frutos.

"A crise acabou sendo para nós um feliz acaso, porque entramos definitivamente no jogo do crédito", diz ele. "O difícil no setor financeiro é ganhar clientes de outros bancos. Isso aconteceu e agora nos tornamos uma opção real", completa. Em junho de 2008, a carteira de crédito da Caixa somava R$ 63,5 bilhões e, em agosto deste ano, superou os R$ 108 bilhões.

As informações do Banco Central mostram que os bancos públicos foram responsáveis pela maior parte de todo o incremento do crédito entre setembro de 2008 e outubro de 2009. Pelos dados, essas companhias responderam até hoje por cerca de 82% desse aumento no bolo. O BNDES contribuiu com 39% desse valor, enquanto que os bancos públicos foram responsáveis por 43%. Na lanterna desse ranking, os bancos privados contribuíram com 18% do aumento acumulado do crédito no país desde o início das turbulências lá fora. Desse percentual, os bancos privados nacionais foram responsáveis por 15,9%, enquanto os estrangeiros tiveram uma contribuição de apenas 2,6%.

No caso do Banco do Brasil, a sua tradicional área de crédito operava de forma mais consolidada no setor havia anos. Por isso, houve um grande esforço do banco no sentido de analisar essa base de dados e, com isso, criar formas de crescer na crise. "Nós temos uma rede de informações enorme e conseguíamos perceber, pela atividade econômica elevada, que se a crise piorasse, o país não pararia", conta Allan Simões, do Banco do Brasil. "Por isso, mantivemos planos em áreas que poderiam crescer. Para ser honesto, a demanda até superou nossas expectativas", completa. O banco, por exemplo, intensificou suas ações junto às empresas para entrar em segmentos em que não estava tão atuante, como no apoio aos processos de abertura de capital. Além disso, conseguiu ganhar participação de mercado na área de crédito para exportação. "Nosso share nessa área pulou de 28%, uma taxa histórica, para 40% neste ano", diz o executivo.

De acordo com balanço financeiro do banco estatal, a carteira de crédito para empresas do BB somou R$ 103,4 bilhões ao final do segundo trimestre do ano, com uma expansão de 32,1% em relação ao mesmo período de 2008. O destaque foi a linha de capital de giro, que cresceu 54,7% em 12 meses.

O BNDES também levou em conta a necessidade de atender demanda de áreas estratégicas para o país. "Quando a crise de liquidez se instalou, houve um grande esforço conjunto no sentido de atender rapidamente essa demanda por recursos, porque há projetos que simplesmente não pode parar ou se perde todo um trabalho anterior nas empresas", conta André Sant´anna, economista do BNDES. Nesse caso, estão planos na área de energia, mineração e siderurgia, por exemplo.