Título: Barreira ao capital externo reduz déficit e freia ritmo de crescimento
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2009, Finanças, p. C2

Barreiras à entrada de capitais estrangeiros e outras medidas para desvalorizar a taxa de câmbio vão colocar um teto para o aumento do déficit em conta corrente num período em que o Brasil começa a crescer com mais vigor com ajuda de financiamento externo. "Se existe menos capital estrangeiro disponível, a economia terá que crescer um pouco menos", afirma uma fonte do governo, que vê de forma crítica a taxação com Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre investimentos em carteira.

A contraface do déficit em conta corrente, lembra essa fonte, é o capital que entra no país para financiá-lo. Quanto mais barreiras aos investimentos estrangeiros, menor é o déficit em conta corrente que o país pode ter. O déficit em conta corrente, por sua vez, mede o quanto o país importa em bens e serviços para atender à demanda interna. Menor déficit em conta corrente, portanto, significa, em última instância, menos espaço expandir a demanda doméstica.

Mesmo com a taxação pelo IOF, o cenário para o setor externo continua de forte ingressos de capitais estrangeiros, sobretudo investimentos diretos e em carteira, que financiam um déficit crescente em conta corrente. Mas o Ministério da Fazenda vem estudando medidas adicionais para desvalorizar a moeda, como o uso do fundo soberano para comprar dólares.

Em setembro, o déficit em conta corrente voltou surpreender o Banco Central, com um resultado negativo de US$ 2,311 bilhões, bem acima dos US$ 800 milhões esperados, de acordo com dados do balanço de pagamentos divulgados na sexta. Em parte, o resultado se deve à aceleração das importações de combustíveis, mas há influencia do maior aquecimento da economia e maior valorização do câmbio, sobretudo em despesas como o turismo internacional e o aluguel de equipamentos.

As projeções oficiais do BC indicam uma trajetória de crescimento do déficit em conta corrente, que passaria dos 1,23% do Produto Interno Bruto (PIB) registrados nos 12 meses encerrados em setembro para 1,76% do PIB em 2010.

O déficit em turismo, por exemplo, chegou a US$ 652 milhões em setembro, bem acima dos US$ 460 milhões observados em agosto e da média de US$ 165 milhões observada no primeiro trimestre. As despesas com alugueis de equipamentos chegaram a US$ 783 milhões em setembro, dentro dos patamares observados há um ano, quando o país foi atingido pela crise financeira. "A conta de serviços mostra aceleração, sobretudo em itens mais vinculados à renda doméstica e câmbio, como viagens internacionais e aluguel de equipamentos", afirma o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes.

Em suas projeções oficiais para o déficit em conta corrente, o BC trabalha com um superávit de US$ 19 bilhões em comércio exterior em 2010, frente aos US$ 27 bilhões esperados para este ano. Em setembro, foi registrado superávit de US$ 1,329 bilhão, 51% menor que o mesmo mês de 2008. Outra premissa das projeções do BC é que as remessas de lucros e dividendos fiquem em US$ 26 bilhões em 2010, portanto bem abaixo dos US$ 33,875 bilhões observados em 2008, quando a economia estava operando em pleno vapor. Para este ano, a projeção é de US$ 26 bilhões. Em setembro, as remessas somaram US$ 1,508 bilhão, 56% menores do que as observadas no mesmo mês do ano passado.

Todas as projeções se baseiam num cenário econômico de crescimento de 0,8% do PIB em 2009, com expansão mais robusta em 2010 (o BC ainda não divulgou o percentual exato), mas ainda assim compatível com a capacidade de oferta interna e externa.

A história recente mostra que o país, para bancar ciclos de crescimento mais robustos, precisa se valer de importações de bens e serviços. No terceiro trimestre de 2008, o consumo das famílias crescia 7,3%, e os investimentos, 19,7%, ambos acima da capacidade interna de oferta da economia. Para atender a essa demanda, houve um ajuste de cerca de dois pontos percentuais nas contas correntes, que passaram de superávit de 0,55% do PIB nos 12 meses acumulados até setembro de 2007 para déficit de 1,63% do PIB em igual período até setembro de 2008, quando a economia foi contaminada pela crise financeira mundial.

Os dados do balanço de pagamentos divulgados pelo BC na sexta mostram que os investimentos em carteira, que foram taxados com alíquota de 2% de IOF, são hoje a principal fonte de financiamento, superando investimentos estrangeiros diretos. Investimentos em ações somam US$ 30,292 bilhões neste ano, nos dados acumulados até sexta, acima dos investimentos diretos, que somam US$ 24,150 bilhões. Os investimentos estrangeiros na compra de ações no país, que foram taxados com IOF, somam US$ 25,765 bilhões. O resto são investimentos em ações brasileiras no exterior, como ADRs Os ingressos para renda fixa, também taxados, somam US$ 7,006 bilhões no período.