Título: Alta de serviços é maior risco para inflação de 2010
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 23/10/2009, Brasil, p. A4

A inflação de serviços continua em níveis ainda elevados, tendência que deve prosseguir em 2010 principalmente devido aos chamados serviços cíclicos, os mais influenciados pelo comportamento do emprego e da renda. Nesse grupo estão os serviços pessoais (como cabeleireiro), os automotivos (como conserto de automóveis) e os médicos e dentários. Pressionados pelo mercado de trabalho aquecido, eles podem manter a inflação total de serviços no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) na casa de 6% ou mais no ano que vem, num patamar próximo aos cerca de 6,5% esperados para 2009.

Uma boa notícia é que se espera algum alívio dos serviços inerciais, como condomínio e mensalidades escolares, corrigidos pela inflação passada. Como os Índices Gerais de Preços (IGPs) podem até registrar deflação neste ano, os preços desses itens podem ter algum refresco em 2010. Isso explica por que alguns analistas ainda estão otimistas quanto à inflação de serviços daqui para frente, projetando números na casa de 5% ou até menos.

O economista-chefe do JP Morgan, Fábio Akira, vê um quadro de aceleração razoável dos serviços cíclicos em 2010. Ele acredita que esses preços podem subir 7,1% no ano que vem, mais que os já salgados 6,3% projetados para este ano. Com o desemprego baixo e a renda em alta, a demanda forte tende a facilitar os reajustes de cotações desse grupo, diz Akira. Para o grupo total de serviços, ele projeta 6,3% em 2009 e 6% em 2010.

No acumulado em 12 meses, os preços dos cíclicos têm mostrado alguma desaceleração - de 8,31% em abril para 7,26% em setembro -, mas tendem a voltar a subir à medida que a melhora do mercado de trabalho se intensificar. Akira ressalta que o efeito da crise sobre o emprego e a renda foi limitado. A taxa de desocupação já começou a cair e a renda continua a avançar acima da inflação, ainda que a um ritmo um pouco inferior ao de 2008. Com a pressão esperada sobre esses serviços, ele acredita que o IPCA ficará em 4,7% neste ano, superando o centro da meta de inflação, de 4,5%.

O economista Gian Barbosa, da Tendências Consultoria Integrada, não faz projeções separadas para os cíclicos e os inerciais, mas também acredita que os primeiros vão subir com mais força em 2010. Ele acredita que os serviços totais vão aumentar 6,8% no ano que vem, um número próximo aos 6,7% projetados para este ano. Como Akira, Barbosa diz que a força do mercado de trabalho abrirá espaço para reajuste de preços mais elevados nesse grupo de serviços.

"Essa será a principal fonte de pressão para a inflação em 2010", diz ele, que projeta um IPCA de 4,2% no ano que vem. Para Barbosa, haverá um alívio por parte dos preços administrados (como tarifas públicas), que terão um comportamento favorável por levarem em conta total ou parcialmente a variação dos IGPs. Ele estima alta de 3,5% dos administrados em 2010, uma variação menor que os 4,1% projetados para este ano.

Os serviços inerciais têm um comportamento parecido ao dos preços administrados, como lembra Akira. Como tarifas públicas, levam em conta a inflação passada, em geral acumulada em 12 meses. "É o caso típico do condomínio e das mensalidades escolares", diz ele, que aposta em alta dos inerciais de 6,2% neste ano e de 4,7% no ano que vem.

Akira prefere não incluir o aluguel como serviço inercial por considerar que, embora corrigido quase sempre pelo IGP-M, o valor final é decidido em negociação pelas partes. Segundo ele, quando o IGP-M sobe muito, não costuma haver o repasse integral e, quando ele tem variação pequena ou negativa, também não se leva a correção ao pé da letra.

O economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu de Freitas Gomes Filho, tem uma visão diferente da de Akira, considerando o aluguel um serviço inercial por ser corrigido com base num índice de preços acumulado em 12 meses.

Para o analista Francis Kinder, da Rosenberg & Associados, a adoção dos IGPs nos contratos de aluguel predomina por uma questão "cultural". "Há alguns regidos pelo IPCA, mas são minoria". Segundo ele, o aquecimento do mercado imobiliário pode fazer com que os novos acertos a serem pactuados daqui para frente - que só serão corrigidos pela inflação em 12 meses - tenham valores mais altos.

O item empregado doméstico é outra possível fonte de pressão para a inflação de serviços em 2010. Os analistas lembram que é um serviço bastante influenciado pelo reajuste do salário mínimo, que deve subir quase 10% no ano que vem. Além disso, o emprego e a renda em alta também tendem a ajudar os empregados domésticos a receber um percentual elevado - provavelmente próximo do aumento do piso salarial no país. Para Akira, trata-se de um serviço cíclico, pois a negociação tem peso importante. Gomes Filho o classifica como inercial, devido à forte correlação com o salário mínimo.

O economista-chefe da SLW tem uma visão mais favorável sobre a inflação de serviços do que Akira e Barbosa. Segundo ele, esses preços reagem com uma defasagem de vários meses à atividade econômica. Nos meses que se seguiram à crise, eles continuaram a mostrar aceleração. Agora que a turbulência arrefeceu e a recuperação da economia já está em curso, os serviços perdem força no acumulado em 12 meses, diz ele, que projeta tanto os serviços cíclicos como os inerciais em 4,5% no ano que vem. Não por acaso, Gomes Filho aposta em IPCA de 3,9% no ano que vem, o que o faz estimar que os juros só vão subir em 2011. Já Akira acredita em alta da taxa Selic em janeiro do ano que vem.

Kinder tem uma posição intermediária entre Akira e Gomes Filho. Ele acredita que os serviços vão se desacelerar, mas não tanto quanto supõe o segundo. Para Kinder, os serviços vão subir 6,4% neste ano, e 5,1% em 2010, com os cíclicos mais pressionados pelo mercado de trabalho e os inerciais um pouco mais comportados, devido à inflação passada mais baixa.