Título: Falta financiamento para térmicas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 27/10/2009, Empresas, p. B1

Dezenove usinas termelétricas que venderam energia nos leilões do governo federal para ser entregue em 2010 e 2011 estão com seus cronogramas atrasados, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica. Juntas elas tem um potencial de gerar 2,8 mil megawatts (MW) e vão precisar de R$ 10 bilhões em investimentos - números comparados a usina hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira. Entre os donos dos projetos estão desde grupos como Bertin e Equipav, donos da Cibe Participações, até companhias formadas por especialistas do setor.

Em um momento em que se discute tanto a questão ambiental das hidrelétricas e apesar de 17 dessas térmicas com atraso serem movidas a óleo combustível, o licenciamento não é o problema delas. Falta é financiamento, principalmente em função de muitos empreendedores não terem contratos firmes de fornecimento de combustível ou com fornecedores de equipamentos.

O caso mais emblemático é o da Cibe Participações, que detém participação em oito das dezenove usinas atrasadas. Só no leilão A menos três (A-3, nomenclatura que pressupõe o prazo de entrega da energia para três anos à frente) realizado em 2008, a Cibe comprometeu-se a construir seis usinas com capacidade de 611 MW, e vendeu cada megawatt hora por um valor de aproximadamente R$ 130. Todas elas estão sob a Sociedade de Propósito Específico (SPE) MC2 e a entrada em operação prevista em edital é a partir de janeiro de 2011.

Mas nenhuma dessas usinas da MC2 tem sequer a autorização da Aneel para operar, segundo consta do balanço de fiscalização de usinas termelétricas da agência do mês de outubro. Sem isso, a empresa não pode negociar qualquer financiamento. E só nessas seis usinas os investimentos chegam a R$ 4 bilhões. Valor expressivo para ser aplicado em apenas um ano por grupos que passaram por dificuldades em função da crise financeira. Em nota, a empresa disse apenas que está trabalhando para cumprir o cronograma da Aneel.

Na semana passada, durante intervalo de um seminário sobre bioeletricidade, o presidente da Equipav, José Carlos de Toledo, travou um pequeno debate com o diretor-geral da Aneel, Nelson Hubner, defendendo que o prazo que deveria ser de 36 meses (os três anos do A-3) para construção das usinas transformou-se em apenas 18 meses e que assim fica difícil estruturar qualquer financiamento para os projetos. Hubner fez Toledo lembrar, entretanto, que não só a empresa entrou no leilão em agosto do ano passado já sabendo que seu prazo final seria janeiro de 2011 como ainda foi responsável por boa parte do atraso. Hubner se referia ao fato de a Cibe ter atrasado em quatro meses a entrega de garantias no valor de R$ 200 milhões que foram exigidas para garantir a empresa o direito de executar seus projetos.

Os problemas da Cibe não se restringem a essas usinas. Para 2010 ela tem de terminar outras duas usinas, a de Maracanau I e de Campina Grande, de cerca de 170 MW cada uma. As duas usinas estão sob o guarda-chuva da Nova Cibe Participações. Os dados da Aneel mostram que o projeto de Campina Grande ainda precisa ter o contrato de combustível equacionado e o de Maracanau está em análise no BNDES. Outras nove usinas termelétricas, também debaixo da MC2, terão de ser construídas até 2013. Mais R$ 7 bilhões em investimentos.

Na parte dos financiamentos, um dos grandes entraves para as usinas da Cibe é o contrato de fornecimento de óleo. Nenhum deles foi fechado com a Petrobras e algumas fontes do mercado têm dúvidas se existe garantia firme de fornecimento de no mínimo 15 anos, como é exigido pelo BNDES. Discutia-se no mercado se o governo federal iria em socorro das usinas, já que Cibe comprometeu-se a gerar 63% da energia vendida nos leilões do ano passado e a não entrada em operação poderia comprometer a oferta do insumo nos próximos anos.

Mas a crise financeira reduziu drasticamente o consumo. As chuvas fora de época não param, fazendo com que as hidrelétricas tenham que verter água de seus reservatórios. O resultado é que o cenário aponta para sobra de energia até 2013. O sócio a PSR Consultoria, Mário Veiga, explica que já havia uma sobra estrutural de energia em 2013 com ou sem crise financeira. Com a queda da atividade econômica, essa sobra passou também a existir para os anos de 2010 a 2012. São mais de dois mil megawatts médios por ano que estão sobrando. Pelas contas da PSR, levando em conta um crescimento do PIB para o próximo ano de 4% e se acontecer um período de seca, mesmo que as térmicas atrasem seu cronograma, o abastecimento está garantido.

De qualquer forma, os empreendedores que não entregarem seus projetos no prazo do edital pagam multa ou terão de comprar energia no mercado à vista.