Título: EUA voltam a crescer, mas há dúvida se retomada é sustentável
Autor: Di Leo , Luca
Fonte: Valor Econômico, 30/10/2009, Internacional, p. A13

A economia americana cresceu no terceiro trimestre depois de encolher por quatro trimestres consecutivos, num possível marco do fim da pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial. Mas a recuperação deve ser lenta, à medida que a economia continua a lutar contra o desemprego crescente e o persistente aperto do crédito.

O Produto Interno Bruto dos EUA subiu 3,5% (ritmo anualizado e dessazonalizado) nos três meses até 30 de setembro, disse ontem o Departamento do Comércio na sua estimativa inicial do PIB, a medida mais ampla de atividade econômica. Economistas consultados pela agência Dow Jones Newswires previam alta de 3,2%. Os EUA não divulgam números não anualizados, que seriam mais comparáveis aos calculados no Brasil pelo IBGE. Mas os dados mostram que, em relação a igual trimestre de 2008, ainda houve contração, de 2,3%.

O presidente Barack Obama disse que os novos dados são "uma afirmação de que esta recessão está diminuindo e que os passos que tomamos fizeram a diferença". "Obviamente que essa notícia é bem-vinda", disse Obama na Casa Branca. "Mas eu também sei que ainda vai demorar para recuperarmos totalmente nossa economia."

As bolsas americanas subiram ontem, pois investidores consideraram a expansão maior que a esperada como um sinal para voltar aos investimentos mais arriscados.

A alta do PIB foi a primeira desde o segundo trimestre de 2008. E é uma confirmação não oficial do fim da recessão mais longa e profunda desde a Grande Depressão nos anos 30. O responsável oficial por declarar o começo e o fim das recessões nos EUA, o Birô Nacional de Pesquisa Econômica, já disse que a recessão começou em dezembro de 2007. Mas o birô, um centro de estudos sem fins lucrativos, ainda não anunciou o fim.

O crescimento foi impulsionado pelo consumo das famílias, que subiu 3,4% no terceiro trimestre, ante declínio de 0,9% no trimestre de abril a junho. Esse consumo contribuiu com 2,4 pontos percentuais para a alta do PIB.

Economistas dizem que o estímulo fiscal injetado pelo governo americano, como o programa de incentivo para a troca de carros velhos por modelos com consumo menor de combustível, ajudou a impulsionar o consumo. Como os efeitos do estímulo governamental chegaram ao auge no terceiro trimestre e o desemprego continua alto, há incerteza sobre quanto desse crescimento é sustentável.

Os dados de preço mostram que o núcleo da inflação (que exclui os preços voláteis de alimentos e energia e é acompanhado de perto pelo Federal Reserve, o banco central americano) caiu de 2%, no segundo trimestre, para 1,4%, indicando que os preços estão estáveis.

O vice-presidente do Fed Donald Kohn já tinha alertado no dia 13 que esperava que a recuperação fosse fraca, com o crescimento lento mantendo a inflação contida.

Os economistas estão debatendo quando a economia será forte o suficiente para o Fed começar a aumentar os juros do atual nível próximo do zero, um recorde. O comitê de política monetária do Fed se reúne semana que vem e deve deixar os juros inalterados, mas alguns analistas esperam que o comitê sinalize um futuro aumento.

"Com o desemprego perto de 10% e o risco de uma reação adversa do mercado, agora não é o momento" de mudar a linguagem do Fed de que os juros continuarão perto do zero por um período prolongado, disse Michael Ferolli, economista do J.P. Morgan Chase, antes da divulgação do PIB.

Embora a economia tenha voltado a crescer, o desemprego segue alto. Semana que vem o governo divulgará dados que podem mostrar o desemprego superou os 10% em outubro. Ontem, o Departamento do Trabalho dos EUA informou que caiu em mil o número de pedidos de seguro-desemprego na semana passada, para 530 mil, queda menor que a esperada.

Diante da falta de perspectivas de emprego, os consumidores americanos estão cada vez mais desanimados. O grupo privado de pesquisa Conference Board informou esta semana que o índice de confiança do consumidor caiu, de 53,4 em setembro para 47,7 este mês. O percentual dos americanos que acham que os empregos estão escassos subiu. O pessimismo em relação à renda futura pode inibir o consumo neste fim de ano.

Os estoques das empresas nos EUA contribuíram com 0,94 ponto porcentual ao PIB. Os estoques caíram para US$ 130,8 bilhões, ante queda de US$ 160,2 bilhões no segundo trimestre.

Outro componente do PIB, o mercado imobiliário, teve a primeira expansão desde o último trimestre de 2005. O investimento fixo em imóveis subiu 23,4%, maior alta desde 1986. Um incentivo fiscal para compradores da primeira casa própria ajudou a impulsionar as vendas; mas ele deve ser encerrado em 1º de dezembro, embora ontem a Casa Branca tenha pedido ao Congresso que o prorrogue.

Os gastos do governo federal aumentaram 7,9%, depois de uma alta de 11,4% no segundo trimestre. As despesas estaduais e locais caíram 1,1%, depois de subirem 3,9% no segundo trimestre.

O comércio exterior pesou um pouco sobre o PIB. As exportações subiram 14,7%, enquanto as importações subiram 16,4%.

Os gastos das empresas reduziram o PIB em 0,24 ponto porcentual, devido a uma queda de 2,5% no terceiro trimestre, ainda assim o melhor desempenho desde uma leve alta no segundo trimestre de 2008.