Título: Causas do apagão ainda não foram esclarecidas
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 13/11/2009, Opiniao, p. A14
As causas do apagão que atingiu 18 Estados na terça-feira continuam obscuras. A questão relevante para o futuro é saber se o blecaute que tirou 45% da carga de energia do país dos fios foi uma pane acidental - e acidentes realmente acontecem - ou uma falha estrutural do sistema elétrico brasileiro. A maior parte dos especialistas aponta que o sistema é seguro, mas não infalível. A partir dessa constatação, outra discussão relevante e complexa é como melhorar o sistema, mas respostas compatíveis e realistas só poderão ser dadas quando se souber o que deixou mais de 50 milhões de brasileiros no escuro por algumas horas.
Qualquer questão polêmica, mesmo trivial, adquire hoje as tonalidades indiscutíveis de bate-boca de campanha eleitoral, algo inevitável, mas não muito esclarecedor. Com muito mais razão ainda, o apagão, que poderia ter provocado tragédias nas grandes metrópoles do país, fez com que razões políticas por vezes tomassem a dianteira dos intricados argumentos técnicos, que podem ser aborrecidos e não rendem dividendos políticos imediatos.
Aceitando-se as premissas de uma discussão política a respeito do apagão, é preciso ressaltar as dessemelhanças do episódio atual e o de 2001, ocorrido durante o governo do presidente Fernando Henrique. Hoje os reservatórios estão cheios e em 2001 não estavam. Há abundância de energia agora e escassez há 8 anos. A possibilidade de racionamento de energia foi cantada aos quatro ventos naquela época, mas o governo não quis ouvi-las. E até mesmo críticos do governo petista reconhecem que não houve falta de investimentos em transmissão e distribuição. A crise de 2001 foi longa e o apagão desta semana durou algumas horas, apesar dos enormes transtornos.
Há semelhanças também. O fisiologismo domina, como dominou em 2001, as áreas responsáveis pela energia. Sob Fernando Henrique, comandava o ministério das Minas e Energia Rodolpho Tourinho Neto, o pefelista da Bahia, em indicação patrocinada pelo senador Antônio Carlos Magalhães. Sob Lula, manda neste terreno a ala do senador pemedebista José Sarney, na figura do ministro Edison Lobão. O loteamento político em uma área vital é nefasto, e já vem de longe.
Por outro lado, ao consumir 20 horas para apresentar uma explicação ainda insatisfatória, o governo petista procurou claramente, e antes de tudo, cobrir seu flanco político-eleitoral, o que é lamentável. Os esquemas de emergência em todo o país dependiam, para sua eficácia, de um diagnóstico rápido, ainda que provisório, do que havia ocorrido, do grau de comprometimento do sistema e da possível duração da interrupção de energia. Houve um apagão de informações e, felizmente, a falta de energia não ocorreu em horários piores e não foi longa, apesar de sua extensão.
Restam as dúvidas. Por que três linhas de Itaipu caíram ao mesmo tempo, se as alegadas descargas elétricas não atingiram as linhas de transmissão, segundo o monitoramento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)? Por que o sistema, apesar de estar apto a isso, não conseguiu isolar os efeitos do desligamento de três linhas de Itaipu e mais de 15 delas caíram sucessivamente, como um dominó? Ou tudo não passou de uma corriqueira falha de "um disjuntor, um conector, um transformador", como aponta o presidente da Itaipu Binacional, Jorge Simek? Ou tudo foi causado por uma prosaica, ainda que desastrosa, falha humana? Faltam respostas.
O sistema interligado é uma necessidade em um país continental, mas o transporte de energia por milhares de quilômetros amplia as possibilidades de falhas e acidentes. Por isso é importante o aperfeiçoamento constante, com choques tecnológicos, para que o sistema se modernize e possa preservar o funcionamento de suas partes constituintes em casos de desligamentos de linhas de transmissão vitais. Depender menos da geração de Itaipu, que fornece 19% da energia nacional, pode reduzir a possibilidade de apagões, enquanto a criação de mais linhas de transmissão alternativas e mais polos supridores de energia também ajudariam a cumprir esse objetivo.