Título: Convergência do G-20 enfrenta teste da realidade
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 12/11/2009, Opinião, p. A18
Passado o ápice da crise internacional, parece ter se reduzido a capacidade das nações de atuar conjuntamente para debelar problemas. Isso ficou claro na última reunião do G-20, realizada no fim de semana em Saint Andrews, Escócia. O clima idílico da cidade medieval às margens do Mar do Norte, considerada berço do golfe, não inspirou o consenso dos membros do G-20.
A proposta do primeiro ministro britânico Gordon Brown de criar uma taxa sobre as transações financeiras para cobrir as perdas dos bancos foi rejeitada de cara pelos Estados Unidos, Canadá, Rússia, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Central Europeu e teve pouco apoio dos outros delegados. Brasil e Espanha afirmaram ter mecanismos próprios para enfrentar esse tipo de problema.
O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Timothy Geithner, disse que não estava preparado para apoiar a proposta, classificada de ultrapassada pelo diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. De fato, a ideia de se criar uma pequena taxa sobre as transações financeiras internacionais foi levantada pela primeira vez pelo economista americano James Tobin, em 1971, com o objetivo de reduzir a especulação. Trinta anos depois, em 2001, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, defendeu sua utilização. Mas a taxa Tobin nunca foi adotada dada a complexidade de aplicação.
Diante da resistência, a delegação britânica passou a ressaltar que a taxa era apenas uma das quatro sugestões de Brown para evitar perdas aos contribuintes com a salvação de bancos, além da criação de um seguro bancário, de provisões especiais nos bancos e da taxação de aumentos de capital.
O financiamento para as adaptações às mudanças climáticas também ficou sem solução. Os membros do G-20 não concordaram se os países desenvolvidos devem pagar aos países em desenvolvimento para reduzir a emissão de carbono muito menos definiram os recursos necessários para essa finalidade se houver um acordo.
Não prosperou até a proposta de discutir a volatilidade cambial, defendida pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, provavelmente pela crença de que a China não cederá às pressões para mudar sua política para o renmimbi.
Aparentemente, o único consenso foi que a melhora das condições econômicas ainda é desigual, o desemprego preocupa e que a recuperação depende de políticas de apoio.
Essa foi a terceira e última reunião deste ano do G-20, que reune as 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia, representando 85% da economia global. Os ministros das Finanças presentes tinham a tarefa delegada pela reunião de cúpula realizada em Pittsburgh, Estados Unidos, em setembro, de elaborar estratégicas conjuntas de políticas de estímulo.
Mas o encontro resultou apenas em uma agenda para a elaboração do que o G-20 chamou de "marco para um crescimento equilibrado, sólido e sustentável". Até janeiro, cada país deverá apresentar dados sobre suas políticas econômicas, projeções e sugestões. O FMI emitirá, em abril, um relatório com avaliações e recomendações de medidas para fomentar o crescimento sustentável, antes da próxima reunião de cúpula, em junho de 2010.
Por trás da dificuldade de se fechar alguns acordos está o lobby dos grandes bancos internacionais, que resistem em assumir seu quinhão de responsabilidade na crise. Os bancos, especialmente os europeus, estão pressionando para adiar a entrada em vigor de novas exigências de capital, com o argumento de que podem esfriar o crédito. Só os bancos europeus terão que triplicar o capital para cobrir os riscos de mercado após a aprovação de novas exigências que deverão entrar em vigor no fim de 2010, sob a inspiração do comitê da Basileia. Nos EUA, os parlamentares resolveram tomar à frente do Executivo nas propostas de mudar a regulamentação do setor financeiro.
O maior teste à disposição dos países de discutir um caminho comum para o crescimento sustentável, deixando de lado seus problemas individuais de curto prazo, deverá acontecer no próximo ano, à medida que a economia for saindo da recessão. À medida que a economia se recupera, a capacidade de ação coordenada exibida na reunião de Pittsburgh parece estar se dissipando.