Título: Minas, ao contrário de São Paulo, não tem a volúpia do antagonismo"
Autor: Augusto , junho Anastasia Antonio
Fonte: Valor Econômico, 06/11/2009, Poítica, p. A8

Governador de Minas Gerais a partir de abril do próximo ano e provável candidato do atual titular, Aécio Neves (PSDB), à sua sucessão, Antonio Augusto Junho Anastasia afirma que a boa avaliação da gestão atual deverá fechar o espaço para a ascensão da oposição, independentemente de quem venha a ser o candidato em 2010.

Sem experiência como titular de chapa eleitoral, Anastasia é frequentemente comparado com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, virtual candidata do PT à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no próximo ano. O vice-governador resiste à comparação, argumentando que, ao contrário de Dilma, sua participação na eleição do próximo ano está ainda longe de uma definição.

A possibilidade de Aécio concorrer à presidência da República e as divisões dentro do PT e PMDB frearam as definições em Minas para a disputa do governo estadual em 2010. Mas Anastasia é o único possível postulante no amplo espectro de partidos que gravitam em torno de Aécio. A única alternativa ao seu nome citada entre os aliados do Palácio da Liberdade é uma improvável composição com o PMDB, tendo o atual ministro das Comunicações, Hélio Costa, como candidato.

Na quinta-feira, o governador reuniu sua base de apoio na Assembleia em um coquetel no Palácio das Mangabeiras, com a presença de Anastasia. No encontro, Aécio afirmou que irá trabalhar para formar uma coligação unindo PSDB, DEM, PP, PTB, PDT, PR, PSB e PV em torno de seu candidato, mas não mencionou o nome do vice, que, ainda não lançado, ocupa o último lugar nas pesquisas de intenção de voto, com cerca de 5%.

Um ano mais novo que Aécio, Anastasia cultiva imagem oposta de seu mentor político. Na recepção de seu gabinete e em discursos em eventos públicos, sempre é tratado como "o professor". Mestre em Direito, Anastasia é um tecnocrata que tornou-se assessor do então governador Hélio Garcia, em 1991.

No fim da gestão, chegou a ocupar a Secretaria da Cultura. No governo Fernando Henrique, foi o principal auxiliar do então ministro do Trabalho, Paulo Paiva e dos ministros da Justiça José Gregori e José Carlos Dias. Coordenador de programa de governo de Aécio em 2002, Anastasia coordenou a política de controle gerencial do governo que ganhou o nome propagandístico de "choque de gestão". A base do sistema foi a criação de um regime de metas para o funcionalismo.

Solteiro e sem filhos, Anastasia será o quarto governador mineiro, entre os últimos cinco, a não ter uma primeira-dama a acompanhá-lo no exercício do cargo. Desde o governo Garcia, o único casado que governou Minas foi Eduardo Azeredo, entre 1995 e 1998.

Logo que Aécio renunciar para disputar o Senado ou a Presidência, Anastasia será o primeiro governador mineiro a ser empossado na Cidade Administrativa, o conjunto de escritórios que o governo estadual está construindo na periferia de Belo Horizonte. Mas ainda despacha do gabinete de vice-governador instalado na sede do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), onde deu a seguinte entrevista:

Valor: O senhor é muito elogiado por empresários em virtude do chamado "choque de gestão" que marcou o primeiro mandato do governador Aécio Neves. Mas em uma campanha eleitoral, esta não é uma marca muito distante do eleitor comum?

Antonio Anastasia: Algumas pessoas ainda não percebem que a gestão pública está em tudo na vida. Durante uma campanha, será possível argumentar que o choque de gestão levou asfalto para mais de 200 municípios em Minas, e isto é um tema que interfere muito no cotidiano das pessoas. "Choque de gestão" não é um tema de investidores, está próximo da vida cotidiana. Envolve prestação de serviços. A gente subestima muito a capacidade, o conhecimento das pessoas. O eleitor sabe o que é um bom governo.

Valor: Isso tem mais peso em uma eleição do que o carisma do candidato?

Anastasia: Há eleições em que as pessoas votam mais em função de personalidades. E há eleições em que se vota, por ideologia, por projetos. Depende da forma como a eleição se desenvolve.

Valor: O senhor pode citar um exemplo de um candidato eleito em função de um projeto, e não de sua personalidade?

Anastasia: Não apenas um, mas vários. O Márcio Lacerda, aqui em Belo Horizonte, é um exemplo. Ele ganhou no ano passado pela harmonia que representava entre as administrações do Estado e do município. A eleição de Fernando Henrique Cardoso em 1994 foi a eleição de um projeto. Ele não tinha à época uma grande popularidade. E ganhou no primeiro turno. No Brasil, nós subestimamos o eleitorado, achamos que são só aspectos pessoais que decidem.

Valor: E o senhor pode citar uma eleição que se deu em função da personalidade?

Anastasia: A de Getúlio em 1950 é um exemplo histórico...

Valor: Para falar de situações mais recentes, a eleição de Lula em 2002 se enquadra nesse caso?

Anastasia: Lula é um caso em que se misturou seu patrimônio pessoal com os projetos e aspirações que o PT encarnava. Foi uma combinação desses dois vetores.

Valor: A candidatura presidencial de Dilma Rousseff se assemelha mais a qual perfil?

Anastasia: A Dilma concilia a boa avaliação do governo federal e a figura pessoal do presidente. É evidente que o presidente Lula faz uma administração discutível, mas de fato é bem avaliada por grande parte do eleitorado.

Valor: A polarização nacional entre PT e PSDB tende a repetir-se em Minas no próximo ano?

Anastasia: Quem disse que a eleição do próximo ano será polarizada? No cenário federal surgiu a Marina Silva (PV) e poderemos ter o Ciro Gomes (PSB). Aqui teremos o candidato do governo, que poderá ser do PSDB ou de um partido aliado; o ministro das Comunicações Hélio Costa (PMDB) e um candidato do PT. Não há polarização, o que há são pessoas tentando colocar uma moldura prévia em um cenário indefinido.

Valor: Não é perigoso para um candidato governista enfrentar a oposição com dois ou mais candidatos, em uma eleição de dois turnos?

Anastasia: Aqui é diferente de São Paulo. Não há a volúpia do antagonismo. Até porque a vida não é só isso. O choque de gestão na Assembleia Legislativa em 2003 com o voto do PT. O próprio PMDB tem vinculações conosco. Os prefeitos têm um relacionamento bastante próximo. Os possíveis candidatos a governador, como os ministros Patrus Ananias (Desenvolvimento Social, PT) e Hélio Costa e o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel (PT) não têm perfil raivoso, muito pelo contrário.

Valor: Integrantes da cúpula do governo apostam na sua candidatura em 2010, colocando um acordo com Hélio Costa como alternativa. A aproximação do PT e o PMDB no governo consolidou seu nome?

Anastasia: As articulações eleitorais para 2010 começaram com muita antecedência e muitas peças ainda podem ser jogadas. Tem dois quadros: um com Aécio candidato a presidente da República, como esperamos, e outro sem ele ser. Como em São Paulo, também há dois cenários: um com Serra candidato, o outro sem. Um acordo com o PMDB é perfeitamente possível. É muito cedo para traçar qualquer cenário.

Valor: Aécio disse que o seu candidato à sucessão será definido em dezembro, quando ele define qual cargo disputará em 2010. Então não é muito cedo.

Anastasia: Sobre esse tema só o governador pode falar.

Valor: Se a opção for pelo seu nome, o senhor não precisaria ser preparado com antecedência, como está acontecendo no plano federal com a ministra Dilma Rousseff?

Anastasia: São situações diferentes. Aqui em Minas realmente não há uma definição. E sobre essa necessidade de preparação, minha vida sempre foi inteiramente no ambiente político. Assessoro governos desde a eleição de Hélio Garcia, em 1990. O hoje senador Eduardo Azeredo foi vice-prefeito de Belo Horizonte, assumiu a prefeitura, depois elegeu-se governador e senador. Antes nunca havia sido candidato a nada. Não ter disputado eleição não é mácula. E o conhecimento dos candidatos por parte do eleitor só se dá depois do início da campanha na televisão. Do ponto de vista eleitoral, só existe campanha e cenário armado a partir de agosto.

Valor: Esta disputa entre Serra e Aécio no PSDB não pode produzir sequelas que afetem a eleição dos candidatos tucanos no país todo?

Anastasia: Veja, quem apostou na divisão democrata entre Barack Obama e Hillary Clinton não assistiu a sequelas. O PSDB, para ser inteligente e ganhar o governo, vai ter que superar o pós-escolha. A interdependência limita o nível de competição. Não haverá guerra entre os dois. Mas para ganhar, o PSDB também vai ter que coligar. Aqui em Minas há uma situação de tranquilidade. O candidato ao governo terá o apoio do PTB, PDT, PSB e PP. No plano federal, Aécio tem manifestações de apoio nesses partidos e também provocaria dificuldades para o PMDB se coligar ao PT.