Título: Corte de tarifas entre emergentes pode ser de apenas 20%
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 25/11/2009, Brasil, p. A3

Um compromisso para fixar em apenas 20% o corte das tarifas de importação no acordo de comércio entre emergentes, a chamada Sul-Sul, foi proposto ontem para evitar um racha e manter todos os 22 membros da negociação, que deverá ter um impulso ministerial na semana que vem, em Genebra.

Havia também a proposta de redução tarifária de 30% e o Mercosul chegara antes a defender baixa de 40%. A ambição reduzida acomoda interesses dos mais arredios nessa negociação que já dura cinco anos. O presidente da negociação, o embaixador da Argentina Alberto Dumont, diz esperar que hoje cedo, em nova reunião, todos os participantes confirmem sua participação no plano de "modalidades" que deve ser anunciado na semana que vem em Genebra, à margem da conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Esta semana, alguns países reagiram à proposta de fechar "modalidades", ou seja, definir como fazer a liberalização. Foi quando o Brasil e a Argentina deixaram claro que iriam à frente com outros asiáticos interessados em negociar. Com a proposta conciliadora, cresceu a expectativa de que todos permaneçam a bordo até 2010.

Sobretudo Egito e Sri Lanka, grandes exportadores de produtos têxteis, tinham se mostrado "desconfortáveis" por causa da falta de definição de questões sobre regras de origem, que determinam qual produto pode obter a preferência, ou seja, a redução tarifária, no mercado do parceiro. Outros pareciam se acomodar na nova situação, incluindo o Irã, que não é sequer membro do Sistema Geral de Preferências Comerciais (SGPC), mecanismo da Agência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), que prevê a troca de concessões tarifárias entre países em desenvolvimento.

A redução tarifária deve ser aplicada sobre 70% do comércio entre os participantes, que inclui mercados em forte expansão, como Mercosul, Índia, Coreia do Sul, Indonésia, Filipinas, Tailândia e Malásia, entre outros. Segundo estudo da Unctad, 90% do comércio entre os participantes do SGPC é de máquinas e produtos manufaturados e só 8% de produtos agrícolas.

O corte de alíquota de apenas 20% não significa que o acordo Sul-Sul fechará no ano que vem com os 22 participantes, provavelmente em setembro. Significa apenas que eles vão continuar negociando. No fim é que cada um decidirá se entra no pacote de liberalização, para cortar a tarifa realmente aplicada e não a consolidada, como na OMC.

Para se ter uma ideia da dificuldade, nessa negociação entre países que dizem querer impulsionar o comércio Sul-Sul, basta ver que o SGPC da Unctad tem 43 membros - e só metade negocia. A África do Sul não quis participar. A China foi estimulada a não entrar, pois os parceiros temem concorrer com seus produtos baratos.

Enquanto lutam para fechar um acordo Sul-Sul modesto e limitado a alguns, pelo mecanismos da Unctad, os países em em desenvolvimento se afrontam na OMC sobre um texto de declaração comum para a conferência ministerial da semana que vem. E a razão é basicamente uma: os Estados Unidos, que estão completamente isolados na Rodada Doha.

O afrontamento é sobre como apontar o dedo para o maior culpado pelo bloqueio da negociação global. A administração de Barack Obama se comprometeu a concluir a Rodada Doha em 2010. Mas na prática, Washington passou não a barganhar e sim a exigir mais do Brasil, China e Índia sobretudo na área industrial, de um lado, e de outro a diminuir suas próprias concessões em agricultura.

Ontem, o chamado "grupo informal de países em desenvolvimento", com cerca de 90 integrantes que representam grande parte da população mundial, começou a redigir uma declaração com base num documento pedido ao Brasil. Nesse documento fica entendida uma crítica à ausência dos americanos na mesa de negociações. A mensagem básica é de que os países em desenvolvimento não aceitam jogar fora oito anos de negociação da Rodada Doha.

Cuba, Venezuela e Equador passaram, porém, a liderar um movimento para os países em desenvolvimento baterem forte nos EUA e mostrarem que o país provoca ainda mais vulnerabilidade nas economias afetadas pela crise global.