Título: Hora errada para investir em moeda
Autor: Marta Vieira
Fonte: Correio Braziliense, 20/06/2010, Economia, p. 16

Diante da instabilidade causada pela crise internacional, especialistas asseguram que é um péssimo negócio aplicar dinheiro no mercado cambial, que concentra altos riscos

A dança das principais moedas no tabuleiro financeiro mundial ¿ além do dólar e do euro, os próprios emergentes real e yuan, da China ¿ cobriu de névoa as análises futurologistas para o câmbio. O vaivém das cotações levanta poeira, de novo, sobre a velha prática dos pequenos investidores de comprar as verdinhas para se proteger. É hora de enfrentar os riscos do segmento monetário, com o euro enfraquecido pela crise vivida na Europa? Qual será a sobrevida do real valorizado em relação à divisa norte-americana, realidade que leva à mingua as suadas vendas externas, especialmente dos exportadores de menor porte, com consequências perversas sobre a produção industrial e o emprego dos brasileiros?

O recado dos analistas que se lançam sem resistência a esses cenários é muito claro. Neste momento, não se deve pensar em dólar ou euro como investimento em hipótese alguma. A volatilidade dos mercados financeiros no mundo e a crise nos Estados Unidos e na Zona do Euro só aumentam o perigo de o cidadão comum ou de o empreendedor perderem rentabilidade nessas moedas, alerta o economista Alex Agostini, da agência de análise de risco Austing Rating. ¿Comprar moeda estrangeira só vale como investimento para um curso de mestrado ou doutorado no exterior, numa viagem programada ou em produtos que se quer adquirir lá fora¿, afirma.

O economista e professor de finanças Paulo Vieira inclui, entre as exceções eventuais, dívidas contraídas em dólar, mas ainda assim recomenda muito cuidado. ¿Se for o caso, é melhor comprar aos poucos. O dólar deve baratear com a enxurrada de dinheiro estrangeiro que a economia brasileira espera nos próximos meses¿, prevê. O presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec) de Minas Gerais, José Domingos Vieira Furtado, indica mais uma ameaça. ¿Em períodos de eleição, geralmente, a volatilidade das moedas é maior. Quem se arriscar a fazer previsões pratica futurologia¿, critica.

Oferta e procura A expectativa de queda da taxa cambial a R$ 1,70 por dólar ¿ na sexta-feira, a moeda norte-americana foi cotada a R$ 1,77 no fechamento do mercado financeiro ¿ está ancorada no poder de atração de investidores para as ofertas públicas de ações anunciadas pelo Banco do Brasil e pela Petrobras, lembra Paulo Vieira. Mais dinheiro estrangeiro é aguardado com os investimentos programados para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Se entrar no país, de fato, a enxurrada de dólares que essas operações prometem atrair, a tendência é de queda nas cotações da moeda, como ocorre com qualquer outro preço ou ativo da economia.

Na semana passada, o presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, saiu em defesa da China, pregando a substituição parcial do dólar como moeda de reserva cambial no mundo pelo yuan, a rupia indiana e até mesmo o rublo russo. Deslocado das manchetes, o iene, a moeda japonesa, tem se valorizado, mas essa corrida não está ganha, na visão do economista Paulo Vieira. ¿A valorização se deve muito mais à deficiência das outras moedas do que a mérito próprio do iene¿, pondera. O iene, que tem se mantido com cotação de US$ 90 a US$ 95, reflete uma economia em crescimento moderado, com problemas causados por uma longa deflação. A população prefere destinar seus recursos à poupança, em detrimento do consumo.