Título: Cresce participação de Norte e Nordeste na receita da Previdência
Autor: Watanabe , Marta
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2009, Brasil, p. A3

Menos afetadas pela crise, sob o efeito do aumento real do salário mínimo e da grande representatividade do setor de construção civil no estoque de trabalhadores, as regiões Norte e Nordeste avançam na participação da arrecadação da contribuição previdenciária. Embora ainda sejam as regiões mais importantes, Sul e Sudeste estão reduzindo sua fatia na arrecadação do tributo. De janeiro a outubro do ano passado, as duas regiões representavam 77,7% do recolhimento total. No acumulado até outubro deste ano, a participação caiu para 76,9%. Há cinco anos, de janeiro a setembro de 2004, a participação das duas regiões era de 78,9%.

A diferença desses dois pontos percentuais corresponde anualmente a cerca de R$ 3,4 bilhões, que passaram a ser recolhidos nas regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste. Nos dez primeiros meses do ano, a arrecadação da contribuição previdenciária no Nordeste cresceu 13,18%, em termos nominais, na comparação com mesmo período do ano passado. No Centro-Oeste, a elevação foi de 11,41%. A média nacional foi de 9,8%.

No Norte e Nordeste, a arrecadação da contribuição previdenciária recolhida pelas empresas chegou a crescer mais do que o estoque de trabalhadores formais. Em outubro de 2009, o estoque de profissionais com carteira assinada no Nordeste aumentou 0,37% em relação ao mesmo mês de 2008. Na mesma base de comparação, a contribuição paga pelas empresas cresceu 8,8% em termos nominais em relação a outubro do ano passado . No Nordeste, o estoque de empregados teve elevação de 2,15%, enquanto a contribuição previdenciária saltou 13,3%.

Para Amir Khair, especialista em contas públicas, esse crescimento da arrecadação previdenciária, bem acima da inflação e do estoque de trabalhadores, está ligado à evolução da massa salarial. Isso porque a contribuição previdenciária é calculada sobre salários e folha de pagamentos e não sobre o número de empregados.

"As regiões Norte e Nordeste sofrem muita influência do reajuste do salário mínimo, que tem obtido elevações reais." Como os salários são mais baixos, ficam mais próximos do mínimo ou são mais atrelados a ele.

O economista Jair do Amaral Filho, professor da Universidade Federal do Ceará, explica que a redução dos investimentos privados e do consumo das famílias, em função da crise, foi mais severa na economia do Sudeste em comparação com o Nordeste. Nesta região, os rendimentos são bastante dependentes das aposentadorias e pensões e do Bolsa Família, fontes de renda que não oscilaram com a crise econômica.

O aumento real do salário mínimo também é considerado importante. "A maior parte dos assalariados que recebem salário mínimo no Brasil concentra-se no Nordeste. Essa massa de renda tem alavancado uma grande demanda reprimida, que encontra ajuda na expansão do crédito para consumo de bens duráveis", diz. A principal fonte de crescimento, diz, está nas famílias de baixa renda, que apresentam alta propensão para consumir e mantêm a economia aquecida.

Fábio Romão, da LCA Consultores, lembra que todas as regiões do país geraram, de janeiro a outubro de 2009, um número menor de vagas na comparação com o mesmo período do ano passado. A redução nas regiões Norte e Nordeste, porém, foi menor. Enquanto os Estados dessas duas regiões tiveram queda de 28,45% e 23,31%, respectivamente, Sul e Sudeste caíram 46,62% e 52,87%.

Nas projeções que a LCA faz para o fim do ano, lembra Romão, Norte e Nordeste são as únicas regiões que devem terminar o ano com número de vagas geradas maior do que em 2008. No Norte, o melhor desempenho deve ficar por conta do setor de construção, o que também deve ocorrer no Nordeste. Nesta região, deve-se destacar também a indústria (ver quadro).

Romão lembra que a alta representatividade do setor de construção civil ajudou a manter no Norte e Nordeste um ritmo de criação de empregos melhor que nas demais regiões. Levantamento da LCA com base nos dados do Ministério do Trabalho mostra que, de janeiro a outubro, a geração de novas vagas da construção no Sul e Sudeste representou, respectivamente, 12,21% e 16,76% do total de novos postos formais. No Norte e Nordeste, a participação da construção é de 42,35% e de 25,03%.

Para Romão, o Norte e o Nordeste devem ter vivido, assim como o resto do país, uma freada nos lançamentos imobiliários. Mas a geração de empregos teve continuidade em função do ciclo relativamente longo da construção civil. "Mesmo com a crise, as obras já iniciadas continuaram contratando e fizeram diferença no saldo total de novas vagas nas regiões em que a construção ocupa fatia maior." Além disso, diz, os empreendimentos de grandes empreiteiras, que se alastram pelo país, fazem com que as novas vagas no setor sejam formais, o que tem impacto na contribuição previdenciária.

No Nordeste, Romão destaca a indústria, que, pelas projeções da LCA, promete fechar 2009 com saldo positivo de novas vagas criadas em relação ao ano passado. Isso se explica, segundo o economista, em razão do perfil das fábricas nordestinas, que contam com participação alta das áreas alimentícia e têxtil. São indústrias de produtos não duráveis e semiduráveis, menos afetadas pela crise e rapidamente alavancadas com a retomada de um maior consumo interno.

Khair acredita também que a a maior formalização do emprego se deve à fiscalização, que ficou mais rígida nos últimos dois anos, porque a arrecadação da contribuição previdenciária passou a ser feita pela Receita Federal. Além disso, diz Khair, houve o efeito crise. "Sempre que a arrecadação cai em função da economia, há reforço na fiscalização."