Título: IBGE desiste de usar netbooks em censo demográfico de 2010
Autor: Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2009, Empresas, p. B3

Depois de três meses de testes, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) decidiu abandonar o uso de netbooks na realização do próximo censo demográfico, a maior coleta de dados do país, marcada para agosto do ano que vem. A decisão foi tomada após a ocorrência de uma série de problemas identificados durante o censo experimental, um teste realizado pelo IBGE na cidade de Rio Claro (SP). O desempenho dos netbooks, computadores portáteis de tamanho reduzido, foi um fiasco.

Durante a coleta de dados, os equipamentos apresentaram uma sucessão de problemas, como perda de informações, aquecimento fora do comum e incompatibilidade para rodar sistemas desenvolvidos pelo IBGE. As informações foram confirmadas pelo presidente do IBGE, Eduardo Pereira Nunes.

Os problemas com os netbooks levaram o IBGE a cancelar a licitação que a instituição havia preparado no início do ano. O plano original era adquirir, até o começo do ano que vem, 150 mil computadores portáteis. Em entrevista ao Valor, Nunes afirmou que uma equipe técnica do instituto já foi montada para elaborar um novo edital para a compra de outro tipo de equipamento. A divulgação desse edital, que manterá o mesmo volume de aquisição de 150 dispositivos de coleta de dados, deverá ser feita no prazo de uma a duas semanas. O plano original do IBGE era investir algo em torno de R$ 140 milhões com os netbooks, sem incluir os custos com serviços de logística, manutenção, suporte e garantia das máquinas. Além de problemas operacionais, disse Nunes, os netbooks apresentaram dificuldades de manuseio. "O que percebemos é que a maioria dos recenseadores entrevista as pessoas à porta de suas casas", comentou. "Como eles fazem esse trabalho em pé, fica difícil segurar o equipamento em uma das mãos e digitar as informações com a outra. Isso causava desconforto devido ao tamanho e peso do equipamento."

A insatisfação é reforçada pelo coordenador da agência do IBGE em Rio Claro, Ivan Donizetti Marafon. "O netbook realmente não atendeu ao que precisávamos, não funcionou direito e apresentou problemas", disse.

A empresa que forneceu os 600 netbooks para o IBGE foi a taiwanesa Mitac, representada no Brasil pela empresa SightGPS, sediada no Rio de Janeiro. Questionado sobre os problemas apresentados pelos equipamentos, Abelardo Júnior, gerente comercial da SightGPS e um dos fundadores da empresa, reconheceu as falhas, mas afirmou que o produto foi fabricado conforme especificações técnicas apresentadas pelo IBGE. "Esse não é um produto de prateleira como outros; nós seguimos as definições técnicas do projeto", disse. "Uma coisa que atrapalhou o teste é que o pessoal de campo que usou o equipamento também não estava bem treinado. Eles tiveram dificuldades em operar o netbook."

Não foi a primeira vez que a Mitac vendeu equipamentos para o IBGE. Em 2007, a empresa de Taiwan, já representada pela SightGPS, foi a vencedora da licitação para fornecimento dos milhares de PDAs (micros de mão) usados na contagem da população e no censo agropecuário. Em fevereiro, quando o IBGE realizou a concorrência para compra dos 600 netbooks, nove fabricantes chegaram a participar da disputa. A Mitac ganhou a licitação novamente.

Segundo Nunes, do IBGE, o PDA mostrou-se "um equipamento muito mais adequado" para esse tipo de operação. "Vamos buscar um novo coletor de dados com as mesmas características para 2010", disse. A compra dos equipamentos deverá ocorrer em dois ou três lotes. Para o primeiro lote está prevista a aquisição de algo entre 30 mil e 50 mil equipamentos.

O censo demográfico, que chegará à sua 12ª edição em agosto, é realizado para traçar uma radiografia das características socioeconômicas do país. Os dados, uma vez compilados, são usados para orientar ações e orçamentos de planejamento público e privado. Durante quatro meses, mais de 230 mil pessoas vão percorrer os 5.564 municípios do país para entrevistar a população.

Hoje, o IBGE já conta com 82 mil PDAs para coleta de dados. Os equipamentos, comprados em 2007, substituíram as fichas de papel e aceleraram o trabalho. Antes de adotar os micros de mão, o IBGE precisava de até quatro meses para reunir milhares de formulários, digitalizar o material e transformá-lo em imagens. Com a coleta digital, muitos cenários são criados praticamente de forma instantânea.

Para o ano que vem, o IBGE decidiu aumentar o volume de dados coletados, instalando nos equipamentos um sistema de georreferenciamento (GPS). A ideia é fazer com que cada residência do país tenha sua coordenada geográfica referenciada, a exemplo do que foi feito em 2007, quando foram captadas as coordenadas de todas as fazendas do país. O IBGE pretende montar uma base territorial única, capaz de integrar dados urbanos e rurais.