Título: Financiamento vira atrito entre EUA e UE
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Fonte: Valor Econômico, 07/12/2009, Especial, p. A13

O principal negociador dos EUA para o clima disse sexta-feira ao "Wall Street Journal" que os países em desenvolvimento terão que tornar seus compromissos quanto às emissões de dióxido de carbono "transparentes" para as pessoas de fora e que o governo americano não está disposto a seguir a liderança da Europa e especificar quais quantias os países ricos deveriam contribuir, ao longo da próxima década, para ajudar os países pobres a reagir às mudanças climáticas.

Os comentários feitos por Todd Stern, representante americano para o clima, indicam potenciais áreas de atrito na conferência da Organização das Nações Unidas sobre mudança climática, que começa hoje em Copenhague e durante duas semanas reunirá representantes de mais de 190 países. Grandes países em desenvolvimento, como a China e a Índia, vêm resistindo a tornar seus compromissos relativos à redução de emissões sujeitos à verificação internacional, a menos que essas reduções sejam financiadas ou apoiadas por países desenvolvidos.

Em paralelo, autoridades europeias estão calculando as quantias específicas que o mundo desenvolvido terá que contribuir, ao longo da próxima década, para ajudar os países pobres a enfrentar as mudanças climáticas. A Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia, já informou que algo entre ¿ 22 bilhões (US$ 33 bilhões) e ¿ 50 bilhões terão que vir diretamente do orçamento nacional dos países ricos.

Em entrevista ao "Wall Street Journal" na sexta-feira, Stern disse que o governo Barack Obama "não está se focando em um número para 2020", mas sim tentando definir "qual deveria ser um número agregado vindo dos países desenvolvidos" ao longo dos próximos dois ou três anos. Dirigentes da ONU disseram esperar que os negociadores internacionais em Copenhague concordem com um pacote de financiamento de curto prazo de US$ 10 bilhões por ano, nível que alguns países localizados em pequenas ilhas dizem que é menor, por uma ordem de magnitude, do que eles precisam para enfrentar o impacto da elevação das temperaturas.

Stern não quis comentar as recentes propostas feitas pela China e pela Índia de reduzir a intensidade de suas emissões, nem a quantidade de emissões de dióxido de carbono por unidade do produto interno bruto. Mas sugeriu que os Estados Unidos insistirão na verificação independente de quaisquer compromissos de redução das emissões, tanto dos países desenvolvidos como em desenvolvimento.

"É preciso haver transparência em relação ao que os principais países estão fazendo, sejam eles desenvolvidos ou em desenvolvimento", disse Stern. "Isso é muito importante."

A relutância de Stern de oferecer detalhes específicos sobre a posição de negociação dos EUA em Copenhague ressalta o dilema político em que se encontra o governo Obama ao tentar conseguir um acordo mundial para reduzir as emissões do efeito estufa. O Senado americano, preocupado com os debates sobre a reforma da saúde e o Afeganistão, adiou para o primeiro trimestre do próximo ano a votação sobre a legislação destinada a limitar as emissões dos EUA. Essa decisão reduziu a capacidade de Obama de prever qual a quantia que os EUA podem contribuir para um pacote financeiro de longo prazo para o mundo em desenvolvimento. A legislação aprovada pela Câmara dos Deputados este ano captaria recursos para essa assistência exigindo que as empresas americanas pagassem pelo direito de emitir gases de efeito estufa.

O governo Obama ofereceu-se para reduzir as emissões americanas até 2020 em 17% em relação aos níveis de 2005 - nível consistente com a legislação aprovada pela Câmara. Mas essa oferta, a qual autoridades do governo dizem que depende da decisão final do Congresso quanto a uma lei referente ao clima, está levantando objeções de parlamentares, em especial republicanos, de oposição. Em uma carta dirigida a Obama na sexta-feira, os principais republicanos da Câmara, liderados por John Boehner, pediram ao presidente um "esclarecimento de que os negociadores americanos não vão comprometer nosso governo com um protocolo de redução das emissões", dizendo que tal iniciativa custaria empregos nos EUA.

Um porta-voz da Casa Branca não respondeu de imediato a um pedido de comentário sobre a carta dos republicanos. Contudo, falando com repórteres da semana passada, o presidente do Comitê de Relações Estrangeiras do Senado, o democrata John Kerry, disse que é "inteiramente normal para um presidente dos Estados Unidos negociar acordos com outros países com base na política desse presidente".

"Fazemos isso com o controle de armas nucleares, já fizemos isso com os acordos mundiais para o meio ambiente, com acordos de comércio exterior, e depois eles os trazem de volta para o Congresso", disse Kerry.

Autoridades do governo Obama e diplomatas europeus disseram que a cúpula deste mês não vai gerar um acordo global legal, impondo limites rígidos às emissões de gases do efeito estufa dos vários países, mas sim um acordo "com valor político", com compromissos específicos feitos pelos diversos países para reduzir as emissões e ajudar os países pobres a combater as mudanças climáticas. Os líderes procurariam chegar a um acordo formal e legal em uma segunda conferência, cuja data de realização continua incerta.