Título: Pão de Açúcar dobra de tamanho em seis meses
Autor: Valenti , Graziella
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2009, Empresas, p. B1

As conversas entre Abílio Diniz, sócio controlador do Grupo Pão de Açúcar, e os analistas de investimento estão longe de ser as mais cordiais. No entanto, se há um empresário que em 2009 se beneficiou das vantagens de ser uma companhia aberta certamente é ele.

Em seis meses, desembolsando apenas R$ 500 milhões, o Pão de Açúcar dobrou de tamanho com as aquisições do Ponto Frio e da Casas Bahia. De uma companhia com faturamento pouco menor que R$ 20 bilhões, transformou-se num negócio com receita bruta anual de R$ 40 bilhões.

O segredo da economia de caixa do Pão de Açúcar é o uso de uma moeda cada vez mais comum nas transações brasileiras: ações. Ambas as aquisições foram pagas, parte ou integralmente, com papéis de companhias abertas. No caso do Ponto Frio, apenas 45% foi pago em dinheiro, o restante foi em ações.

Já a operação em que a Casas Bahia, no fim do dia, acaba como controlada indireta do Pão de Açúcar, foi paga totalmente com ações do Ponto Frio, adquirido em junho. Os dois negócios foram desenhados por Pércio de Souza, sócio da assessoria financeira Estáter.

Por enquanto, a família Klein não receberá nada em dinheiro pela associação - a não ser os aluguéis das propriedades onde estão as lojas (ver na página B4). Mas receberá algo cada dia mais valioso com o desenvolvimento do mercado de capitais: a perspectiva de liquidez. Ou seja, de transformar patrimônio em dinheiro. A Casas Bahia é uma sociedade limitada, sem ações em bolsa.

A família Klein ficará com 49% do Ponto Frio. Por enquanto, esses papéis não terão liquidez. Mas o fato de a empresa ser aberta facilitará a vida dos criadores da Casas Bahia quando chegar a hora de transformar isso dinheiro. Bastará uma oferta pública para a venda dos papéis. E só depois, e se os Klein venderem seus papéis na bolsa, será possível saber quanto, afinal de contas, eles levaram para casa.

O Ponto Frio encerrou a sexta-feira avaliado em R$ 2,3 bilhões na Bovespa, antes de incorporar a Casas Bahia. Já que os ativos da empresa - mais R$ 120 milhões em bens que serão aportados pelo Pão de Açúcar do Extra Eletro - serão equivalentes a 51% do negócio, é possível depreender que a nova companhia teria um valor na bolsa da ordem de R$ 4,7 bilhões, após a absorção dos bens que serão depositados pelos Klein.

O Ponto Frio, batizado de Globex na Bovespa, é pouco negociado. Essa liquidez deve ficar ainda menor após a oferta pública de compra dos minoritários - para extensão do prêmio de controle pela venda ao Pão de Açúcar. Atualmente, só 4,5% do capital está na bolsa, sendo que 3,5% são dos empregados.

No entanto, a ideia é que mesmo assim o registro de companhia aberta do Ponto Frio seja mantido, para facilitar a saída dos Klein quando assim quiserem.

Mas nenhuma oferta é esperada antes de um ano. As ações do Ponto Frio detidas pelos Klein ficarão bloqueadas para a venda por um tempo. Elas serão liberadas para venda gradualmente.

Dentro de 12 a 48 meses, os Klein poderão vender 29% das ações de Ponto Frio que possuem. Entre 49 e 72 meses, a fatia livre para negociação sobe para 49% e somente a partir do 73º mês é que todos os papéis ficam desbloqueados. Já o Pão de Açúcar precisa manter os papéis por, no mínimo, três anos.

Enquanto os Klein não decidirem vender, o Ponto Frio será uma companhia aberta praticamente sem negociações. O resultado final dependerá da oferta pública para os minoritários.

Segundo fontes do Pão de Açúcar, a permanência da Globex como empresa de capital aberto havia sido discutida no conselho de administração justamente para que o grupo tivesse uma moeda de negociação forte na aquisição na área de não-alimentos.

Um conselheiro disse que, apesar de ficar pouco entendido no mercado por que a subsidiária permaneceria com o capital aberto apesar da aquisição pelo Pão de Açúcar, a manutenção da companhia, ainda que com baixa liquidez em mercado, foi estratégica. A ideia era justamente preservar a capacidade de endividamento do grupo e manter duas moedas com as quais pudesse fazer aquisições sem desembolso de caixa.

Não é esperado nenhum movimento de integração societária de Ponto Frio e Pão de Açúcar no curto prazo. E há pelo menos dois bons motivos para isso. A razão operacional é que, dessa forma, os sócios mantêm os segmentos de bens não duráveis e duráveis separados. Mas, além disso, o equilíbrio de poder entre Abilio Diniz e o grupo francês Casino não permite ao Pão de Açúcar muitas peripécias societárias.

A rede varejista tem 61% do capital em ações preferenciais - muito perto do limite legal de 67%. Assim, qualquer emissão grande em ações, seja para uma aquisição ou para captação, demandaria a emissão também de ordinárias. Na prática, significa que Diniz e Casino teriam que colocar dinheiro para evitar uma diluição.

Depois de usar as ações da Globex para a compra das Casas Bahia, o Pão de Açúcar insiste em manter a companhia com o capital aberto e fez questão de incluir essa observação no texto do comunicado ao mercado. O grupo continua vendo as ações como moeda de aquisição - sua direção já sinalizou que continua de olho nos setores de postos de gasolina, lojas de conveninência e drogarias. E poderia fazer no futuro um novo lançamento de papéis. Algo parecido com o que fez o Santander, que tinha algumas entidades com capital aberto no Brasil e baixíssima liquidez até a oferta gigantesca de ações concluída neste ano.