Título: Ensino de baixa qualidade pode limitar crescimento, diz ganhador de Nobel
Autor: Góes , Francisco
Fonte: Valor Econômico, 18/12/2009, Brasil, p. A2

A falta de qualidade no sistema educacional brasileiro pode comprometer as perspectivas de crescimento do país nos próximos anos, avalia o professor James Heckman, da Universidade de Chicago (EUA), ganhador do Nobel de Economia em 2000. Ele reconhece que o Brasil conseguiu avanços na educação nos últimos 20 anos, embora ainda haja um longo caminho a trilhar. "O Brasil precisa de uma força de trabalho mais preparada. Não há dúvida que uma mão de obra mais educada é chave para uma economia mais produtiva."

Heckman está no Rio para participar de encontro promovido pela Fundação Getulio Vargas (FGV), que discute a educação na primeira infância, tema de estudos do economista. Ele defende maiores investimentos na educação das crianças nos primeiros anos de vida.

Na visão do economista, a falta de mão de obra capacitada não é exclusividade do Brasil. "Isso é verdade também para outros países, como a China, que sofreu uma rápida industrialização. Um dos grandes problemas da força de trabalho chinesa é o treinamento de trabalhadores. Isso é uma verdade em quase todos os lugares onde você pensa em tecnologias modernas. Mesmo no Brasil, que tem muitas oportunidades de investimento e onde há muitas companhias interessadas em se instalar."

Heckman acredita que o Brasil poderia se industrializar mais e ter uma força de trabalho melhor. Embora a educação tenha melhorado, menos da metade dos alunos consegue a graduação no secundário. "Agora ficam seis, sete anos na escola, isso é bom, melhor que antes, mas ainda não cria uma força de trabalho para uma economia moderna que tem estar apta a se adaptar, a ser flexível. Há uma necessidade muito grande em termos de flexibilização", afirmou.

Em relação à educação na primeira infância, Heckman é categórico: "Dar prioridade à educação básica, secundária e terciária, é garantir boa educação desde o início. Assim, haverá menos demandas futuras. Crianças mais motivadas tornam a performance de qualquer sistema escolar mais eficiente." O economista afirma que crianças que crescem em favelas, por exemplo, têm desvantagens difíceis para a escola remediar. Ele defende um enfoque integrado, que considere não só a educação, mas outros aspectos, como condições de saúde e criminalidade.

O tema foi discutido a partir do trabalho "As Origens do Desenvolvimento Desigual - Um Guia para Políticas", apresentado por Heckman. O estudo foi elaborado em conjunto com Flavio Cunha, da Universidade da Pennsylvania. Segundo Heckman, é possível suplementar os programas voltados à educação de crianças nos primeiros anos de vida e enriquecê-los.

"Cuidar das crianças não é suficiente. É preciso desenvolver um programa que cuide das crianças e dos pais. Também tem que ter um currículo focado no desenvolvimento de todas as habilidades. É preciso olhar a questão de saúde, as capacidades cognitivas , os problemas pessoais e outras questões. É um portfólio de intervenções que são requeridas conjuntamente", diz o economista.

Além das habilidades cognitivas, o estudo considera as capacidades não cognitivas, relacionadas a traços de caráter (autocontrole, temperamento, persistência), que também podem determinar o sucesso da criança no futuro.