Título: Cúpula do clima deve deixar principais decisões para 2010
Autor: Chiaretti, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 18/12/2009, Especial, p. A10

Se não houver nenhuma reviravolta de última hora, a conferência climática de Copenhague deve se encerrar neste final de semana com um acordo fraco, que adia para 2010 a definição da estratégia de combate ao aquecimento global para 2010. Em meio a divergências, principalmente entre EUA e China, as principais medidas devem ficar para ser resolvidas em outra reunião, possivelmente no meio do ano que vem.

Uma reviravolta pode acontecer hoje de manhã, quando o presidente Barack Obama chegar a Copenhague. Há grande expectativa de que ele possa se comprometer com metas maiores de redução de emissão. "Eu realmente espero que eles anunciem alguma coisa a mais", disse o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso. "O presidente Obama não está vindo só para reiterar o que consta do seu projeto de lei", acrescentou, referindo-se à proposta de corte de emissões de 17% em 2020, em relação a 2005, que é considerada insuficiente pelos europeus.

Arestas importantes podiam ainda ser aparadas numa reunião prevista para a noite de ontem entre o presidente Luis Inácio Lula da Silva, líderes europeus e de outras regiões, incluindo, possivelmente, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton.

Ontem havia dois cenários possíveis de acordo sendo desenhados e ambos deixavam para 2010 toda a definição e a implementação das medidas.

Em um deles, os diplomatas enxugariam os dois textos principais dos últimos dois anos de negociação: um é o segundo período do Protocolo de Kyoto (com metas dos países desenvolvidos para depois de 2013); e o outro, com os países que assinaram a Convenção do Clima, é onde entram os países em desenvolvimento e os Estados Unidos (que não aderiram a Kyoto). Ontem à noite ainda não havia metas dos ricos definidas, mas estavam sendo negociadas. Os diplomatas trabalhavam intensamente no enxugamento dos textos.

Ontem à noite ainda não havia metas definidas de cortes de emissões para os países ricos definidas, mas estavam sendo negociadas. Vários tópicos fundamentais - financiamento, Redd, transferência de tecnologia, adaptação, mitigação e capacitação - continuavam sendo negociados. Já se sabia que muitos pontos continuariam sem definição porque são itens onde há conflito, e as decisões da ONU têm que ser tomadas por consenso, mas esperava-se que houvesse acordo em temas mais simples.

Por este caminho, Copenhague terminaria com dois textos. Um deles com metas de cortes dos ricos, o outro com vários acordos pendurados. É o que sempre quiseram as nações em desenvolvimento, como o Brasil. O Protocolo de Kyoto é um acordo internacional, obrigatório, o que no jargão dos diplomatas é conhecido por "legally binding". Embora isto ainda não aconteça nas negociações do clima, tratados "legally binding" garantem que sanções a quem não cumprir os compromissos acertados. O Protocolo de Kyoto, que amarra todos os países ricos menos os EUA, é "legally binding". Os compromissos assumidos pelos países em desenvolvimento, não.

Os EUA não se opõem a que dois textos principais saiam de Copenhague, mas querem que esta solução seja temporária. Isso abriria caminho ao segundo cenário, no qual estes dois acordos se transformariam em um só. Na prática, isso deixaria os americanos com as mesmas obrigações da China, nem mais, nem menos. Isso, acreditam os negociadores, seria algo que o Congresso e a sociedade americanos poderiam aceitar.

"O esforço que está sendo conduzido agora pelo primeiro-ministro Lars Rasmunssen é para se alcançar um acerto político-operacional, que nos leve, esperamos, no ano que vem, a um acordo politicamente vinculante", disse Todd Stern, o chefe dos negociadores americanos no último minuto da entrevista de Hillary Clinton, a secretária de Estado dos EUA.

Esta fórmula, que faz com que os países ricos e pobres tenham os mesmos compromissos (metas de emissões e contribuição financeira) é apoiada por Japão, Austrália, Canadá e Nova Zelândia. Isso coloca em risco a existência do Protocolo de Kyoto. "Se esta porta for aberta, libera toda a boiada", diz um negociador brasileiro. China, Índia, Brasil e o bloco do G-77 não aceitam esta solução.

Um dos momentos mais surpreendentes de ontem foi quando Hillary Clinton anunciou que os EUA pretendem participar do fundo climático de US$ 100 bilhões, ao ano, até 2020, ideia lançada por Gordon Brown há alguns meses. "Isto é muito positivo", dizia o cientista americano Aldem Meyer. Hillary, porém, não definiu qual a parcela dos EUA neste bolo, nem disse se o dinheiro viria dos cofres públicos ou do mercado. E ainda impôs condicionantes aos recursos de longo prazo. "Quero sublinhar que, na ausência de um acordo operacional que contemple os requisitos que descrevi, não haverá este tipo de compromisso financeiro, ao menos para os EUA".

Hillary mencionou a importância da transparência no processo. É um dos pontos mais cruciais da tensão entre China e EUA. Os EUA querem que os compromissos chineses possam ser medidos e auditados. Pequim não aceita, a não ser no caso de usar dinheiro do exterior para seus projetos. Até ontem a noite, esta questão ainda opunha os dois gigantes. "Será uma longa noite", previa Paulo Adario, coordenador da campanha da Amazônia Greenpeace.

A jornalista viaja com bolsa da Climate Change Media Partnership

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