Título: Bloco BIC negocia unido, mas tem interesses diferentes
Autor: Chiaretti , Daniela
Fonte: Valor Econômico, 16/12/2009, Especial, p. A15

Embora as grandes economias emergentes falem no mesmo tom quando o assunto é pressionar os países ricos a colocar mais metas de redução de gases-estufa sobre a mesa e recursos financeiros de longo prazo, Brasil, Índia e China têm divergências importantes de postura na defesa de seus interesses no acordo climático.

Na arena da negociação, o Brasil costuma procurar consenso e ser mais gregário. Com a China, ninguém discute (a não ser os Estados Unidos); e a Índia é a mais radical.

"Os indianos querem dinheiro; os chineses, tecnologia; e o Brasil, o que quer o Brasil?", questiona um delegado do G-77, o grupo heterogêneo dos países em desenvolvimento.

O Brasil não radicaliza nesses eixos. A ministra Dilma Rousseff tem lembrado que o Brasil está tocando seus projetos de energia limpa com dinheiro próprio. "Do BNDES", cita a ministra. "Mas faremos mais e mais rápido com mais recursos", diz ela.

Não é assim para a Índia. O país insiste em que os ricos têm que colocar recursos de longo prazo sobre a mesa e que têm problemas estruturais de pobreza para resolver. "Sem fazer nenhum juízo de valor, a Índia tem muita consciência do que quer nesse debate, a opinião pública tem um projeto de país na questão do clima", diz o delegado. No caso do Brasil, o tema é mais difuso e pouco consensual.

Os critérios de cobrar a conta também são diferentes nesse trio. O Brasil fala em responsabilidades históricas. Índia e China gostam de lembrar que suas emissões per capita são muito menores do que as do mundo rico. Ninguém veste a carapuça de estar no mesmo campo do mundo industrializado. Nesse raciocínio, ganharam ontem um aliado de peso. Yvo de Boer, o secretário-executivo da Convenção do Clima, disse a jornalistas: "Na Índia há 400 milhões de pessoas que não têm acesso a eletricidade. Como você chega para eles e diz para desligarem algo que simplesmente não têm?"

Os chineses costumam dançar junto a Índia e Brasil, às vezes se aproximam dos EUA e, outras, protagonizam grandes embates com os americanos. A questão de florestas não é um grande tema para os chineses, mas para o Brasil, a discussão de Redd é fundamental.

Recursos financeiros são importantes para os chineses, mas os negociadores disseram que sabem que não estão no primeiro lugar da fila. Tecnologia, sim, é crucial para Pequim. No mês passado, no encontro de Barack Obama e Hu Jintao, foi assinado um acordo que cria um centro de desenvolvimento de tecnologias limpas entre os dois países. A iniciativa parece ser só o início da parceria entre o maior poluidor do passado e o maior do presente. Os dois países respondem por 50% das emissões do mundo.

As negociações entre EUA e China estão passando por um estresse em Copenhague. Os EUA exigem que os países em desenvolvimento tornem suas ações de mitigação MRV, uma sigla para mensuráveis, reportáveis e verificáveis. A China não quer. Para o Brasil, esse não era um ponto fundamental, mas a ministra Dilma parece ter se comovido com os chineses.

Nada, nas negociações do clima, é muito simples. Yvo de Boer, ontem, resumiu o motivo. "Trata-se de conseguir consenso em interesses como o das pequenas ilhas, que lutam para não desaparecer. Ou a preocupação legítima dos países produtores de petróleo, que temem por suas economias. E o medo dos ricos de perderem competitividade ou dos emergentes que ainda têm de lidar com quadros de pobreza", listou. "Esse processo só terá sucesso se resolver este conjunto de equações." O prazo termina no sábado.

A jornalista viaja com bolsa da Climate Change Media Partnership