Título: O desafio de aumentar o saldo da balança comercial
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/01/2010, Opinião, p. A8

A estratégia do governo brasileiro de centrar bateria na expansão dos negócios com os Estados Unidos para melhorar os resultados da balança comercial deste ano tem poucas chances de sucesso no curto prazo. Mais eficiente seria combater os gargalos de infraestrutura, aliviar a carga tributária das exportações e redobrar os esforços para dar mais competitividade à venda externa de manufaturados.

O Brasil fechou 2009 com o saldo de US$ 24,6 bilhões na balança comercial, 1,4% inferior aos US$ 25 bilhões de 2008. O desempenho não é ruim se comparado com a queda de 13% do comércio mundial de mercadorias estimada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para 2009.

Mas os números brasileiros vão encolher neste ano. O saldo comercial brasileiro deve cair para US$ 11,3 bilhões, de acordo com projeções do mercado financeiro, registradas no boletim Focus do Banco Central, desta semana. Há quem projete números ainda menores. O Bradesco, por exemplo, acredita que o saldo cairá a US$ 3,9 bilhões neste ano.

A explicação é simples: com a expansão das atividades domésticas, as importações crescerão em ritmo superior ao das exportações. Isso já aconteceu entre 2007 e 2008, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 5,1%, puxando o aumento de 43,4% das importações, enquanto as exportações cresciam 23,2%. Com a freada global de 2009, o PIB brasileiro ficou perto de zero. Em consequência, encolheram as exportações (23%) e as importações (26,2%).

Neste ano, porém, o PIB brasileiro deve crescer entre 5% e 6,5%. O próprio BC projeta 5,8%. Qualquer que seja o número, ficará acima do esperado para o resto do mundo. O FMI estima que o PIB mundial cresça perto de 3% em 2010. Haverá enorme diferença entre o comportamento dos países emergentes, que reagem melhor à crise internacional e devem registrar expansão de mais de 5%, e o das economias avançadas, cuja produção provavelmente aumentará 1,25%. Os Estados Unidos podem crescer 1,5% e a zona do euro, 0,3%. A força compradora dessas regiões continuará, portanto, debilitada, tornando praticamente infrutífero o esforço para aumentar as vendas nesses mercados.

A crise teve forte impacto no mapa das exportações brasileiras em 2009. Os países mais afetados pela turbulência reduziram as compras de produtos brasileiros. As vendas para os Estados Unidos caíram 42,4% e para a União Europeia, 25,8%. Diminuíram também as vendas para América Latina e Caribe (33,7%), Mercosul (29,9%) e África (13,5%).

Só houve crescimento nos negócios com a Ásia (5,9%), puxado pelo aumento de 23,1% nas exportações para a China, cujo PIB deve crescer 8% em 2009 e perto de 9% neste ano. Com esse ritmo, a China tem sido ávida compradora de minério de ferro, produtos siderúrgicos e soja brasileiros. A China tornou-se o maior mercado comprador do Brasil em 2009 com US$ 19,9 bilhões, ultrapassando os Estados Unidos, com US$ 15,7 bilhões. Os Estados Unidos continuam os maiores parceiros comerciais do Brasil, mas por pouca diferença. As importações brasileiras dos Estados Unidos somaram US$ 20,2 bilhões; e da China, US$ 15,7 bilhões. Assim, em fluxo comercial, os Estados Unidos continuam mais importantes com US$ 35,9 bilhões, com a China chegando perto, com US$ 35,8 bilhões.

O interesse do governo brasileiro em ampliar as vendas para os Estados Unidos deve-se ao fato de o mercado americano absorver mais produtos industrializados do Brasil do que a China, que compra principalmente matérias-primas e produtos básicos.

Essa é uma preocupação legítima, uma vez que a participação dos produtos básicos na pauta brasileira de exportações cresceu de 36,9% a 40,7% entre 2008 e 2009. A fatia dos semimanufaturados ficou praticamente estável em 13,5%, e a dos manufaturados encolheu de 46,8% para 43,7%. A mudança no perfil da pauta de exportações acentua o temor de que o Brasil caminharia para o modelo chileno e australiano.

A competição internacional aumentou em um mercado deprimido, o que tende a expulsar os produtores menos competitivos. A valorização do real joga contra o exportador brasileiro de bens de maior valor agregado. Para equilibrar o jogo, é preciso maior desoneração de impostos, melhoria constante da infraestrutura e menos burocracia.