Título: Modelo de rodovias atingidas é ultrapassado
Autor: Maia , Samantha
Fonte: Valor Econômico, 11/01/2010, Brasil, p. A5

Rodovias que sofreram estragos com as chuvas neste verão, como a Mogi-Bertioga (SP) e a Rio-Santos, são antigas e seguem um modelo de construção nas encostas dos morros que hoje é considerado ultrapassado por especialistas. A partir dos anos 90, foram desenvolvidos modelos como o da rodovia Imigrantes (SP), com túneis e pontes, que evitam o corte dos morros em pontos instáveis.

"Não é sempre que é preciso evitar a encosta. O estudo prévio do local é que vai indicar onde é possível contornar o morro ou onde é mais indicado fazer pontes e túneis", diz João Alberto Viol, engenheiro civil e presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco).

A decisão se dá considerando uma equação também financeira, já que as obras mais modernas são mais caras. O custo menor de manutenção, porém, compensaria parte desse gasto maior. "Manter viadutos e túneis é mais barato do que manter aterros", diz João Antonio del Nero, conselheiro do Sinaenco e presidente da empresa que ganhou o projeto da Imigrantes. "Ganhamos o trabalho ao dar um novo conceito de construção para não destruir o equilíbrio das encostas", diz.

No caso da Serra do Mar, os engenheiros afirmam que o mais indicado é cortar o menos possível a encosta. "O miolo da Serra do Mar é rochoso, o que faz que a chuva penetre na terra e ao chegar nas rochas, escorra, causando deslizamentos", explica o presidente do Sinaenco.

Segundo Viol, é muito difícil detectar previamente a ocorrência de um deslizamento, pois em tese todos os pontos são de risco. "O ideal é que essa análise de risco seja feita antes da construção para justamente evitar a encosta, que o modelo mais moderno de construção hoje."

Os governos confirmam essa dificuldade de prever deslizamentos. Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), o número de rodovias federais é extenso demais para permitir essa previsão. Os trabalhos de precaução são realizados em pontos mais vulneráveis. Secretaria de Transportes do Estado de São Paulo, , por sua vez, diz que, apesar de ser feito um trabalho de manutenção e prevenção de acidentes, com o volume de chuvas nesse começo de ano "fica impossível não haver registros de quedas de encostas".

Diante dos perigos trazidos pelas chuvas mais fortes, Nero considera que seria o caso de se reestudar as estradas antigas para identificar possíveis melhorias. "Deveriam começar um programa sério de exame dessas obras mais antigas, fazer um novo cálculo de vazão da drenagem, por exemplo", diz.

Uma das formas de tornar essas estradas mais seguras seria construir muros de arrimo onde for detectada possibilidade de deslizamentos, ou construir túneis em locais de maiores riscos. Modernizar as estradas, utilizando a tecnologia atual de construção, exige pesados investimentos, segundo a Secretaria de Transportes paulista.

Os engenheiros chamam atenção que um grande problema no país é os governos valorizarem mais a construção de novas obras do que a manutenção das antigas. "No Brasil, de maneira geral na construção civil há uma cultura de construir e não manter", diz Viol. A entidade realiza desde 2005 um levantamento em capitais mostrando o descaso das autoridades com a manutenção das obras públicas.

Para Nero, a prevenção mais efetiva de acidentes nas estradas é um problema de existência de recursos, e não de ausência de tecnologia. "A natureza está avisando que as condições das obras precisam ser melhoradas e os governos precisam pensar nisso", diz o engenheiro.

Descontados os investimentos realizados pelas concessionárias privadas, o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) de São Paulo investiu R$ 1,6 bilhão em manutenção das estradas, segundo a Secretaria de Transportes paulista. Os valores eram crescentes até 2008, quando foram investidos R$ 419 milhões, mas a soma caiu para R$ 368 milhões, em 2009, por conta das novas concessões realizadas.