Título: Mudança em PIS e Cofins eleva peso do saneamento na arrecadação federal
Autor: Maia , Samantha
Fonte: Valor Econômico, 30/12/2009, Brasil, p. A2

A arrecadação de impostos federais no setor de saneamento cresceu com força nos últimos anos, acumulando alta de 188% de 2002 a 2008, já descontada a inflação. Em valores, foram recolhidos R$ 3,3 bilhões em 2008, enquanto em 2002 foi R$ 1,2 bilhão. De janeiro a junho deste ano, a arrecadação chegou a R$ 1,9 bilhão.

A evolução dos valores pagos pelas companhias de água e esgoto está bem acima do crescimento do total arrecadado pela União no mesmo período, de 45%. Dessa forma, o setor ganhou importância na arrecadação federal, e sua participação no total recolhido passou de 0,37% em 2002, para 0,74% em 2008. Em 2009, ela está em 0,94%, considerando dados de janeiro a junho.

O levantamento, realizado pela Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (Sabesp), considera o pagamento da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), do Programa de Integração Social (PIS/Pasep), do imposto de renda e da contribuição social. Os serviços de saneamento são isentos do Imposto Sobre Serviços (ISS) por legislação nacional e não se enquadram na cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

A ampliação do atendimento do serviço poderia explicar esse maior pagamento de impostos, mas o crescimento da receita das empresas tem sido menos mesma intensidade. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (Snis), o faturamento do setor evoluiu de R$ 18,8 bilhões em 2002 para R$ 25,3 bilhões em 2008, um aumento de 34%, descontada a inflação.

De acordo com tributaristas, esse quadro resulta principalmente da mudança de regime de recolhimento do PIS/Pasep e da Cofins em 2002 e 2003, respectivamente, do cumulativo para o não cumulativo. A alteração aumentou as alíquotas dos impostos de 3% para 7,6%, no caso da Cofins, e de 0,65% para 1,65%, no caso do PIS/Pasep.

Esse aumento dos tributos seria compensado pelo direito a tomar crédito com as mesmas alíquotas sobre determinados gastos das empresas. Porém a estrutura de gastos do setor de saneamento faz com que as empresas não consigam obter muitos créditos. Sem trabalhar com matérias primas, o maior gasto das companhias é com mão de obra, onde não é permitido tomar créditos para deduzir no pagamento dos impostos. "As maiores possibilidades de obtenção de crédito são sobre insumos para a produção, e as empresas de saneamento não conseguem se beneficiar disso", diz Luís Gustavo Mariano, advogado tributarista da Sabesp.

A companhia de saneamento paulista, por exemplo, consegue obter crédito sobre os gastos com energia, aluguéis e insumos químicos. A dedução desses créditos, porém, fica longe de reduzir o pagamento dos impostos às antigas bases, segundo Gesner Oliveira, presidente da estadual. "Não conseguimos gerar crédito, esse sistema penalizou o setor", diz ele.

Alguns segmentos conseguiram escapar dessa mudança de regime tributário, como o da construção civil e as concessionárias de rodovias. A reivindicação do setor de saneamento hoje, segundo Oliveira, é que os investimentos realizados sejam abatidos no pagamento dos impostos federais. "A alta tributação acaba enfraquecendo a capacidade de investimento das empresas", diz o presidente da Sabesp. De 2002 a 2008, o faturamento da companhia estadual cresceu 22%, enquanto os valores pagos de impostos aumentaram 201%.

Segundo Raul Pinho, presidente do instituto TrataBrasil, o pagamento anual de impostos pelas empresas de água e esgoto tem sido maior que os os investimentos efetivamente pagos pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) desde 2007. Enquanto o valor pago de tributos federais em 2008 foi de R$ 1,6 bilhão, desde 2007, R$ 1,5 bilhão ao ano tem sido pago pelo PAC em obras de saneamento.

"O setor precisa de subsídios para seus investimentos, e sobrecarregar os serviços com impostos vai na contramão disso", diz ele. Uma proposta encaminhada ao governo federal é que os impostos arrecadados pelo setor sejam destinados a um fundo de investimento em universalização do serviço.

Para Rodrigo Chohfi, advogado tributarista da Porto Advogados, o veto do projeto de lei, em 2003, que pedia a retirada da isenção de ISS do setor deveria servir de exemplo para novas desonerações. A justificativa do veto era que a incidência dos impostos sobre saneamento não atendia ao interesse público e que poderia inclusive comprometer o objetivo de universalizar o acesso aos serviços. "Reduzir os impostos é uma forma de fomentar os investimentos, de incentivar o setor", diz. Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), apenas 52,5% das residências no país contavam com coleta de esgoto em 2008.