Título: Chuva com força de um terremoto
Autor: Silveira, Igor; Ana Neiva, Paula
Fonte: Correio Braziliense, 22/06/2010, Brasil, p. 10

Pernambuco e Alagoas são castigados pelo temporal, com algumas cidades vivendo dias de Haiti pós-tremor. Lula anuncia liberação de FGTS e vai reunir um Gabinete de Crise

Quem chegou, na manhã de ontem, à cidade de Barreiros, a 110 quilômetros de Recife, em Pernambuco, teve a impressão de viver um cenário semelhante ao do terremoto em Porto Príncipe, no Haiti. Devastado pela força das águas do Rio Una, que transbordou na sexta-feira passada, o município pernambucano ficou completamente destruído. Pelo menos 30% dos 40 mil habitantes estão desabrigados por conta da enchente ¿ o número de mortos ainda não foi contabilizado. Sem energia elétrica, os moradores sofrem também com a falta de água potável e alimentos. Diante da situação, o governador do estado, Eduardo Campos, que visitou a cidade no fim da manhã, decretou estado de calamidade pública e anunciou ajuda ao munícipio mais castigado da Mata Sul.

¿Estamos disponibilizando R$ 50 milhões em recursos do Tesouro Estadual para as ações emergenciais de limpeza e reconstrução das cidades atingidas pelas chuvas¿, disse o governador, que também mandou buscar o maquinário usado na obra de construção da adutora de Pirapama para ajudar nos trabalhos de recuperação do município de Barreiros. Com mil residências e pontos comerciais destruídos e mais de três mil pessoas desabrigadas, a cidade perdeu quatro das cinco pontes existentes. O que deixou parte da população isolada. Para se salvar da fúria das águas, alguns moradores foram obrigados a permanecer em cima do telhado até chegar o socorro. Alguns foram removidos com a ajuda de lanchas trazidas às pressas pelos veranistas da Praia de São José da Coroa Grande, cidade vizinha. Outros tiveram de ser resgatados de helicóptero da Secretaria de Defesa Social.

Barreiros é um retrato da devastação que atingiu os estados de Pernambuco e Alagoas ¿ em alguns casos em menor grau ou em situação semelhante. O número de mortos nos dois estados já passa de 30. Na noite de ontem, os governadores Eduardo Campos (PE) e Teotônio Vilela Filho (AL), o senador Fernando Collor de Mello e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniram para tratar da tragédia.

Água e remédio Ao fim do encontro, Lula convocou para hoje uma reunião com um Gabinete de Crise, coordenado pela ministra-chefe da Casa Civil, Erenica Guerra, e pelo ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Jorge Armando Félix. Lula ordenou que, nesse encontro, as necessidades mais urgentes, como água, comida e remédio, além de um reforço no efetivo do Exército para ajudar na distribuição de doações e na segurança da população, sejam viabilizadas o mais rápido possível pelos chefes de pastas.

No entanto, o governo federal ainda não anunciou o valor dos recursos que serão destinados aos estados. De acordo com o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que também esteve na reunião de ontem, os governadores não apresentaram projetos consolidados com o montante necessário para restabelecer a ordem nas áreas que sofreram com as tempestades. Muitas prefeituras foram destruídas e, portanto, os governos estaduais estão com dificuldades para obter dados de cada município.

¿Os prejuízos ainda estão sendo contabilizados. A preocupação inicial é com o número de pessoas que estão desabrigadas, precisando de alimentos, roupas e cuidados médicos. O governo editou uma medida provisória, na semana passada, que destina R$ 1,2 bilhão para localidades afetadas por desastres naturais. Parte dos recursos para cuidar de Pernambuco e Alagoas virá daí. O que o presidente Lula garantiu é que não faltará recurso para ajudar os dois estados. Ele pediu, inclusive, que os ministros das áreas econômicas dialogassem com bancos públicos para garantir linhas de crédito¿, afirmou Padilha.

As vítimas das chuvas em Pernambuco e Alagoas, no entanto, já sabem que poderão sacar o dinheiro do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O anúncio foi feito, antes da reunião, pelo presidente Lula durante a 4ª Conferência Nacional das Cidades.

Governador Teotônio Vilela fala em mil desaparecidos

As enchentes que castigam o Nordeste podem ter deixado mais de mil pessoas desaparecidas só em Alagoas, segundo informou ontem à noite o governador do estado, Teotônio Vilela Filho. ¿Até o início da tarde, eram 22 mortes e mais de mil desaparecidos. Estamos rezando para que eles estejam com vida. Mas estamos preocupados porque os corpos já começam a aparecer nas praias e nos rios¿, disse Vilela, após a cerimônia de lançamento da Semana Nacional sobre Drogas.

O governador destacou ainda que a chuva destruiu cerca de 40 mil casa, além de pontes, estradas e ferrovias em 22 municípios. ¿Os rios de Pernambuco vão todos para Alagoas. Com enxurrada, eles devastaram as cidades¿, lamentou Teotônio Vilela Filho.

Vilela fez ainda um apelo para que os veículos de comunicação façam campanha de doação de mantimentos para as vítimas.

Segundo o governador, o emergencial agora é água, comida, colchões e abrigos. ¿O inventário do que é necessário reconstruir, como as estradas, casa e pontes, estará em um levantamento que chegará a Brasília na próxima.¿ Em todo o estado, uma força-tarefa trabalha no atendimento às vítimas. Vinte e um municípios registraram algum tipo de dano e 15 estão em situação de calamidade pública.