Título: Desafio para os EUA em 2010 é tirar a economia da UTI
Autor: Reddy , Sudeep
Fonte: Valor Econômico, 29/12/2009, Internacional, p. A9

Em geral, os economistas que fazem previsões esperam que 2010 seja um ano de crescimento econômico modesto nos EUA, coisa de 3%, bem melhor que nos dois anos anteriores. Mas isso não basta para levar o desemprego, o maior problema que ainda ameaça a economia, ao nível de antes da recessão.

As previsões quase sempre erram em alguns aspectos; a questão é: quais? Muito depende de quantas contratações as empresas farão. Aqui há três grandes variáveis.

O investimento das empresas está para se recuperar. Mas vai?

A fuga de consumidores espantados pela crise econômica levou a uma retração ainda maior por parte de empresas. Os gastos de capital caíram nesta recessão mais que em qualquer outro período desde a Grande Depressão dos anos 30. Isso quer dizer que ainda há muito o que se recuperar, se as empresas ficarem mais confiantes. Os balanços das empresas parecem promissores, de modo geral. Os lucros estão em alta, o custo do capital está baixo e a produtividade está forte.

As empresas têm abundância de fundos para financiar investimentos. O hiato financeiro corporativo, que reflete quanto as empresas precisam levantar, bateu em US$ 189 bilhões negativos no terceiro trimestre, depois de chegar a US$ 153 bilhões no período de abril a junho, segundo o Federal Reserve. Um hiato financeiro negativo significa que as empresas têm caixa para financiar seu gasto de capital.

"Ao contrário do setor familiar, o corporativo está em excelentes condições fiscais", diz Robert Barbera, economista-chefe da corretora Investment Technology Group. As empresas estão "gerando muito mais dinheiro do que elas estão usando para investir".

Uma recuperação sustentada dos gastos de capital não ocorrerá sem uma melhora modesta no consumo. Mas a demanda reprimida por parte das empresas, depois de elas terem cortado gastos profundamente este ano, poderia se provar fundamental para dar à economia americana a velocidade de que precisa para se recuperar.

Economistas estão contando com alguma melhora nos gastos de capital. Nesse campo, podemos ter uma surpresa boa em 2010.

O setor imobiliário vai sarar?

Os problemas no setor imobiliário nos EUA estão claramente diminuindo. Mas consumidores e construtoras têm muito pela frente antes de recuperar a confiança.

A profunda queda no preço dos imóveis levou consumidores a gastar menos, e os bancos, que têm esses mesmos imóveis como garantia dos financiamentos, a emprestar menos. Embora o pior da queda de preços pareça ter passado, espera-se que os preços das residências no país tenham só um pequeno ganho, se tanto, em 2010.

A principal razão para isso é que o preocupante salto das execuções judiciais está longe de acabar. No fim do terceiro trimestre, 4,5% dos empréstimos imobiliários entraram em processos de execução judicial, sendo que um ano antes havia sido 3%. Além disso, 9,6% de todos os empréstimos tinham ao menos uma prestação atrasada. Até que o emprego se recupere, vai ser difícil isso melhorar.

Tudo isso implica que mais casas estão chegando ao mercado, derrubando mais os preços. "Ainda há um excesso enorme de residências", diz Jim O"Sullivan, economista-chefe da MF Global. Como as casas estão mais acessíveis, "esse excesso vai diminuir com o tempo, mais ele ainda é gigantesco".

Muito da recente melhora em vendas se deve aos juros baixos do financiamento, possibilitado pelo fato de o Fed ter comprado esses créditos, e a um benefício fiscal para quem compra a casa própria. Ambos estão para expirar em meados de 2010. Quando isso acontecer, as vendas sofrerão um golpe.

Uma área do setor imobiliário pode ter alguma esperança. O investimento residencial caiu tanto durante a recessão que há pouco espaço para cair ainda mais.

As vendas de novas moradias em novembro foram 74% menores que o pico, em julho de 2005, e é improvável que voltem àquele nível nos próximos anos. Mas o estoque caiu para o menor nível desde 1971, de modo que a construção deve aumentar e contribuir para o crescimento da economia.

Após dois anos de turbulência, a visão mais geral entre especialistas em previsões é de uma pequena melhora no setor imobiliário em 2010. Para os preços de imóveis, o risco claramente é de queda, dadas as execuções judiciais crescentes. Mas a construção residencial, que parte de níveis muito baixos, tem boa chance de ser surpresa positiva para a economia em 2010.

A economia americana vai aguentar o final dos programas de apoio do governo federal?

O governo pôs a economia no respirador artificial na maior parte de 2009. Se a máquina for desligada em 2010, como previsto, há o risco de problemas marcantes.

A mistura de US$ 787 bilhões em gastos e cortes de impostos merece crédito por ter ajudado a estimular a economia - e a melhorar a confiança - no segundo semestre. Economistas do Goldman Sachs esperam que o estímulo fiscal vá continuar a inflar o crescimento, em termos anualizados, em dois pontos percentuais no primeiro semestre de 2010. No segundo, esse respirador vai parar.

Fora do mercado de trabalho, o maior ponto de interrogação é como consumidores e empresas responderão quando o apoio do governo minguar. Muitos consumidores compraram casas e carros a preços baixos em 2009 graças à ajuda do governo. Empresas obtiveram contratos de construções e créditos mais baratos graças ao apoio do contribuinte.

O Congresso e a Casa Branca, num ano eleitoral marcado por alto desemprego, estão planejando programas para estimular as contratações por parte das empresas, apoiar governos locais e aumentar os gastos em infraestrutura.

Mas correm o risco de acabar criando outros problemas, devido à alta do déficit. "Estamos chegando agora ao ponto em que o temor quanto à sustentabilidade fiscal está realmente se intensificando", diz o economista Michael Feroli, do J.P. Morgan Chase. "Reduzir a recessão tem um preço."

A história de 2010 pode bem ser de como a economia se deu quando o governo fechou a torneira. A expectativa generalizada é que o setor privado pegue o bastão, mas os riscos econômicos com o fim do apoio público são substanciais.