Título: Eletrobrás centraliza as decisões
Autor: Schüffner , Cláudia
Fonte: Valor Econômico, 29/12/2009, Empresas, p. B1

As empresas controladas da estatal Eletrobrás não terão mais autonomia para tomar decisões estratégicas, assegura o presidente da companhia, José Antonio Muniz Lopes. Ele afirmou ao Valor que a palavra final caberá ao grupo de gestão da holding, uma gigante elétrica com presença em geração hidráulica, térmica e termonuclear, em transmissão e distribuição. Muniz pontuou, por exemplo, que acabou o tempo em que as empresas do grupo participavam isoladas em consórcios diferentes para disputar leilões de energia e linhas de transmissão. Agora, isso será uma decisão do conselho da Eletrobrás. Nos leilões de porte menor, as controladas - como Furnas e Chesf - até poderão entrar sozinhas, mas não vão competir entre si. "Se não ganhar, não ganhou", declarou Muniz, que está no cargo desde março de 2008.

A nova forma de participação foi posta em prática no último leilão de linhas de transmissão e de energia eólica. No primeiro caso, as empresas se associaram separadamente, mas havia uma cláusula no consórcio que previa a assinatura dos contratos pela Eletrobrás sem que os outros sócios tivessem direito de preferência. A exceção, explica Muniz, será em Belo Monte, uma hidrelétrica de 11 mil MW no rio Xingu que ele estima que vai custar R$ 16 bilhões. Lá, todos os grupos interessados poderão se associar a qualquer empresa da holding, mas quando for constituída a sociedade de propósito específico (SPE), depois do leilão, quem vai assinar o contrato é a holding.

"Neste caso [Belo Monte], o governo permitiu porque se fosse só a Eletrobrás eu só entraria em um consórcio. E quem estivesse com a Eletrobrás ganharia naturalmente a licitação e, assim, não teríamos competição. Vamos estar em tantos consórcios quanto necessário. Todos que quiserem que a Eletrobrás esteja com eles, estaremos", disse o executivo, frisando que foi uma decisão do conselho.

Muniz explica também que a holding é quem vai escolher qual empresa entrará em cada consórcio. "Quem define esse jogo é a Eletrobrás. No caso de Belo Monte, vamos também escolher qual estará com tal ou qual consórcio. Como vamos entrar com até 49%, terão as mesmas condições".

Até o momento, já manifestaram interesse em Belo Monte a GDF Suez, Cemig, Neoenergia, CPFL, Vale e Alcoa, dentre outras. Muniz disse que ninguém conversou ainda com a Eletrobrás.

Sobre a opção de manter participação minoritária na gigantesca usina, que será a terceira maior do mundo, Muniz afirma que é medida de prudência. Além de poder atrair parceiros fortes, ele lembra que, apesar de autorizada pela Lei 11.943/2009 a ter um regime próprio de licitação, a Eletrobrás aguarda um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a Petrobras, que tem protagonizado embates com o Tribunal de Contas da União sobre suas licitações. O TCU justifica sua oposição à liberdade da Petrobras, argumentando que um decreto não pode se sobrepor à Lei das Licitações, a 8.666/93, e a Eletrobrás teme que o mesmo se aplique a ela.

"Nosso decreto está pronto mas não encaminhamos ao ministro Edison Lobão (de Minas e Energia) para que ele encaminhe ao presidente Lula porque vamos esperar clarear isso". Para Muniz, no Senado o TCU fez lobby contra a aprovação dessa lei (11.943) e enquanto isso não tiver implementado, ele prefere ser minoritário. "Sendo privada, a SPE está livre de todas essas amarras. E na hora que eu for majoritário, não consigo acabar a obra. Do jeito que o TCU trabalha hoje, e com toda essa suspeição sobre os homens públicos, é muito difícil terminar uma obra como a de Belo Monte", observou.

O presidente da Eletrobrás garante que as transformações que está introduzindo no sistema, cuja face mais visível até agora foi a capitalização de R$ 11,77 bilhões nas controladas, vão levar a holding para o caminho indicado pelo presidente Lula, que pediu que ela se torne uma megaempresa com respeitabilidade internacional, similar à da Petrobras. A frase foi logo reduzida para a "Petrobras do setor elétrico", e o recado foi bem entendido.

A tarefa de transformar a imensa estatal elétrica, que controla 12 subsidiárias e a metade brasileira de Itaipu, está exigindo enorme esforço para transformar a empresa em uma holding de fato. Muniz lembra que quando assumiu a empresa, ela tinha um patrimônio de R$ 80 bilhões e valor de mercado de R$ 30 bilhões. "Eu tinha uma empresa com patrimônio líquido enorme, um ativo excepcional, com valor de mercado extremamente baixo e regredindo anualmente, mas com fluxo de caixa positivo que caminhava para ficar negativo", explica, dizendo que esse plano começou a ser esboçado dois anos antes da sua gestão.

Muniz reafirmou que todas as decisões estratégicas cabem hoje ao conselho da holding. "Nenhuma decisão de porte é tomada nas controladas, algo que é lógico mas não era a prática. E isso está hoje no estatuto". "Eram as "descontroladas da Eletrobrás"", afirmou, referindo-se às controladas Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf.