Título: Desvalorização na Venezuela gera temor entre empresas
Autor: Moura , Marcos
Fonte: Valor Econômico, 12/01/2010, Internacional, p. A10

A desvalorização da moeda da Venezuela gera dúvidas, temores e também expectativas entre as empresas, inclusive brasileiras com operação no país. Teme-se que, com os importados mais caros, as vendas no mercado venezuelano caiam. Além disso, as novas condições pode prejudicar as remessas de lucro ao exterior. Mas, para algumas empresas, a medida pode facilitar os trâmites de importação, que dificultam os negócios.

Desde 2005, o país mantinha o dólar em 2,15 bolívares. Na sexta, o governo desvalorizou o bolívar em até 50% e criou duas faixas de câmbio: a primeira, a 2,60, para bens classificados como essenciais, entre eles alimentos, medicamentos e maquinários; a segunda, a 4,30, para os não essenciais, como veículos, eletrônicos e celulares. Haverá ainda um câmbio livre. A medida entrou em vigor ontem.

Como a liberação dos dólares ao preço oficial era dificultada, muitas empresas recorriam ao câmbio paralelo para obter moeda para importar. O dólar nesse mercado superava 6 bolívares.

Como boa parte dos produtos importados do Brasil vinha sendo paga com esse dólar paralelo, as novas cotações oficiais estão sendo encaradas como um boa notícia por parte das empresas brasileiras na Venezuela. Há, segundo o Valor apurou, uma expectativa otimista gerada pela desvalorização e pela criação das duas faixas de câmbio - ambas mais vantajosas que o atual mercado paralelo.

Entre as grandes empresas brasileiras que operam na Venezuela e que importam itens do Brasil estão a Petrobras, a TAM e construtoras como a Andrade Gutierrez, Odebrecht e OAS.

Parte importante da pauta das exportações brasileiras para o país, como frango e carne congelada, é classificada como essencial e poderá ser comprada agora com o dólar a 2,60. Mas o otimismo só se concretizará se o governo agilizar a liberação de dólares a esse câmbio, o que ainda não está claro.

"Acredito que o governo deverá agilizar a liberação dos dólares agora porque, se não fizer isso, pressionará ainda mais o dólar paralelo, aumentará a inflação, retrairá a importação de insumos e criará mais problemas para a economia se recuperar", disse o economista Maikel Bello, analista da consultoria Ecoanalítica.

Segundo cálculos da consultoria, 33% das importações venezuelanas no fim de 2009 estavam sendo pagas com dólar paralelo. Em 2008, eram 6%; e em 2007, pouco mais de 15%. Agora, Bello prevê que entre 36% a 40% das importações privadas "essenciais" receberão o dólar a 2,60.

O que parece preocupar mais as empresas brasileiras na Venezuela agora é quais serão as regras para remeter lucro ao Brasil. A pergunta, que até ontem não havia sido respondida, é se elas obterão dólar a 2,60 ou a 4,30 para fazer remessas às matrizes. O governo venezuelano ainda não esclareceu como elas poderão atuar agora.

A Telefonica foi alvo desta preocupação ontem. As ações da empresa espanhola caíram na Bolsa de Madri com o temor de que a remessa de lucro terá de ser feito com o câmbio de 4,60, o que reduziria em mais de metade o lucro a ser remetido em dólares para a matriz na Espanha.