Título: O doce fardo da maternidade ainda pesa
Autor: Belo, Eduardo
Fonte: Valor Econômico, 18/01/2010, Finanças, p. C8

O mesmo fator que alijava a mulher do mercado de trabalho há 30 anos ainda dificulta - embora não impeça - a ascensão de muitas a postos mais elevados: o doce fardo da maternidade. Pesquisa da revista americana "CFO Magazine" indica que equilibrar família e carreira tem sido a mais árdua tarefa de qualquer executiva.

Quase 25% dos entrevistados pela pesquisa - homens e mulheres - responderam que o que emperra o progresso feminino no trabalho são questões relacionadas à vida doméstica, em especial os filhos. Parte considerável do peso está no bolso. Um estudo do Centro de Políticas de Trabalho e Qualidade de Vida da Universidade de Columbia mostra que mulheres americanas que precisam deixar o trabalho temporariamente perdem 28% do poder aquisitivo.

Isso está mudando aos poucos, lá fora e aqui. "Eu cresci na carreira porque nunca me impus nenhum tipo de limitação que normalmente ocorre com as mulheres", comenta Maria José Cury, sócia da PricewaterhouseCoopers. "Nunca deixei de fazer um inventário físico ou uma viagem quando foi preciso".

Mesmo assim ela admite que conciliar vida pessoal e profissional "é um desafio para qualquer mulher que trabalha e também quer cuidar da família". Com um casal de filhos, de 10 e 5 anos, Maria José tenta se equilibrar. Acha difícil, por exemplo, harmonizar o trabalho com a reunião na escola das crianças. Mas procura comparecer, quando elas ocorrem.

Maria José assegura que é possível manter o equilíbrio entre os dois mundos. Basta "ter um bom planejamento e uma boa administração". O problema é que "nem tudo dá para por numa planilha e resolver", brinca.

Já Luciana Medeiros von Adamek, coordenadora do Ibef Mulher, prega a filosofia do "100% de dedicação, em casa e no trabalho". Ela faz questão de levar a filha todos os dias para a escola e tenta por a conversa em dia com o marido, advogado, cumprindo o trajeto de casa para o trabalho no mesmo carro.

Bem-falante e hiperativa, Regina Nunes, presidente da Standard & Poor"s no Brasil diz não ter dificuldade em conciliar a vida pessoal com a profissional, mas reconhece que há sacrifícios. Isso porque, segundo ela, seu "único jeito de fazer bem alguma coisa é fazer três coisas ao mesmo tempo".

Por isso, Regina cumpre longas jornadas na agência classificadora de risco, onde, não raro, fica até tarde da noite escrevendo seus relatórios - "todos muito técnicos" - ao mesmo tempo em que ouve música ou com a TV ligada e o fone em apenas um dos ouvidos. O segredo, diz, é definir muito bem as prioridades. Além das funções na S&P, ainda participa de quatro grupos de mulheres que atuam em projetos sociais.

Afora o velho conflito entre o lar e o escritório, as perspectivas sugerem melhora contínua nas condições de trabalho do sexo feminino. Em pesquisa realizada pela "CFO" 59% das mulheres disseram que as oportunidades para elas em finanças são "excelentes". Para os homens, o total de satisfeitos com o porvir foi de 84%. A diferença, explica a revista, ainda decorre de questões culturais.

Isso também está mudando, dizem as executivas. "Não tive dificuldade por ser mulher nem enfrentei preconceito", conta Maria José. Algumas barreiras surgiram por ser mulher e, muitas vezes, mais jovem que seus interlocutores, mas a dedicação e o conhecimento técnico do trabalho fizeram a situação ser superada depressa, diz.

Para Regina Nunes, a necessidade de ter empresas mais competitivas está eliminando as diferenças entre os sexos. (EB)